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“Nós éramos culpados pela nossa deficiência”, disse João, uma das vozes na manifestação contra a JMJ

Uma hora depois do começo da via-sacra, esta sexta-feira, no Parque Eduardo VII, uma centena de jovens concentrou-se em semicírculo no espaço em frente à Capela de Nossa Senhora da Saúde. Do outro lado da rua, no centro da Praça Martim Moniz, no grande palco, eram projetadas imagens do Papa Francisco. Ali vagueavam diversos peregrinos atraídos pelas várias tendas do Parque Cristonautas, um evento que aliou a tecnologia e a fé.

De microfone em riste, remetidos à sombra dessas atividades integradas na programação oficial Jornadas Mundiais da Juventude, os manifestantes da concentração Sem Papas na Língua partilhavam em tom de revolta as suas inquietações e testemunhos pessoais. Histórias sobre a transsexualidade, o racismo, a violência policial e o machismo uniram os presentes que aparentavam ter entre os 18 e 30 anos. Os cartazes que também refletiam essas mensagens: ‘o amor é mais forte que a tradição’, ‘tratem Portugal como se tivesse cá o Papa o ano todo’ e ‘4815 + 40: Quantos mais precisam que sejam abusados?’.

A vida em instituições católicas

Um jovem com paralisia cerebral, de 26 anos, João Peres, misturado entre a multidão desde o início da concentração, com um cartaz em punho, resolveu ir ao microfone. O que o inquietou ultrapassa os temas ali debatidos, por ser um assunto a que a poucos lembra: as pessoas com deficiência que se encontram em instituições de cariz católico.

Tinha 12 anos quando percebeu, mais por motivos “emocionais” do que “racionais”, que a Santa Casa da Misericórdia, instituição que o acolhia durante o dia enquanto a sua mãe estava a trabalhar, lhe denegria a autoestima, usando-o para criar uma imagem de uma igreja que “aparece ao lado dos pobres e oprimidos”. A sua mãe católica, por tradição, compreendeu e respeitou a vontade do filho em querer sair.

João frequentou a Santa Casa desde os seis meses de idade. Lembra-se de ir todos os domingos à missa, de ficar enfadado, de achar que nada daquilo fazia sentido. E principalmente “de ser o boneco, o deficiente que eles queriam que estivesse lá”. “A Igreja dá-me como uma pessoa doente, pecadora. Havia uma imposição de uma maneira de viver. Da religião, da reza, da culpa. Como se nós fossemos pecadores por sermos assim. Fossemos menos pessoas, menos iguais aos outros. Havia uma ideia de que nós éramos culpados pela nossa deficiência. E essa visão está muito enraizada na forma como a sociedade olha para as pessoas com deficiência”.

Atualmente, com um mestrado em física e empregado, João vive a vida com plena autonomia porque a sua deficiência o permite. O que considera uma “sorte”. Colegas que têm deficiências mais limitativas a nível motor, que estão em cadeiras de rodas, que são cegos, mudos “são menosprezadas e tidas como um trofeu de bondade para a Igreja”. Colocados em instituições católicas contra a sua vontade, são presos a camas, é-lhes retirada a liberdade e o direito a dizer não, conta.

Aos olhos de um protestante

Aos que lá se encontravam a pregar contra a Igreja Católica, chegavam outros, curiosos, que acabavam por permanecer até aos discursos acabarem. Duarte, de 24 anos, um dos organizadores das atividades do Parque dos Cristonautas, superou a perplexidade a que se detinham os participantes das Jornadas que observavam o acontecimento da Praça Martim Moniz e atravessou a rua. “Venho na expectativa de ouvir”, disse. “Eu sinto que estas pessoas sofreram e continuam a sofrer de uma forma que é genuína e com a qual eu tenho compaixão”.

Duarte não faz parte da comunidade católica. Apesar da sua participação nas Jornadas Mundiais da Juventude e da sua participação na organização do evento na Praça, identifica-se como cristão protestante que frequenta a Igreja Evangélica Baptista de Oeiras. Criado como católico em Portugal, encontrou a fé na Dinamarca quando foi acolhido como estudante de intercâmbio numa comunidade protestante. “Lá o Evangelho tornou-se real para mim”. São esses escritos que unem tanto católicos como protestantes na irmandade da fé. No entanto, há diferenças taxadoras. Uma delas é o modo com que os fiéis protestantes e os católicos percecionariam aquela manifestação.

Um dos pilares pelo qual Duarte se rege é “nenhum de nós é bom o suficiente para merecer o amor de Deus”. E esse é um sentimento que ali é prevalente, diz. Um católico ao afirmar que o amor de Deus chega a todos sem contrapartida coloca em desigualdade aqueles manifestantes, pois “o que a igreja diz oficialmente e aquilo que os fiéis fazem é diferente”, explica. “Aqui nas jornadas vê-se isso. Pessoas com comportamentos estúpidos para com a comunidade LGBT, mas também tens quem ouça e sofra com eles”.

Cruz queimada e peregrinos provocadores

Antes do pôr do sol, um rapaz vestido com um hábito iniciou uma recitação teatral de passagens da bíblia alertando para a violência perpetuada pela Igreja ao longo dos séculos. À luz de um flare vermelho, falou da colonização e da perseguição às “bruxas” feita pela Inquisição. Dentro do semicírculo, perto da bancada, via-se uma bandeira LGBT com um símbolo anarquista e algumas referências ao marxismo. Os organizadores do protesto não quiseram ser identificados e recusaram-se a prestar declarações, criando um ambiente hostil aos jornalistas.

Ao cair da noite chegaram mais peregrinos ao Parque dos Cristonautas, que progressivamente foram enchendo toda a Praça. No largo em frente às Escadinhas da Saúde, as vestes pretas dos manifestantes acentuavam o propósito do que estava para vir. Ao som de música ‘techno’, os jovens acenderam uma pequena lareira ao centro do semicírculo e começaram a queimar uma cruz. O cenário fazia lembrar uma caça às bruxas.

Tanto pela música como pelo aparato em si, os vários jovens das JMJ foram se aproximando, tal como se sucedeu durante o dia. Em curtas abordagens de toca e foge, os manifestantes anti Jornadas receberam algumas provocações. Um rapaz com cerveja na mão e bandeira de Espanha às costas aproximou-se, apontou o dedo num movimento impulsivo e gritou: “hijos de puta”. Os companheiros, prevendo o pior, agarraram no amigo e dirigiram-no ao outro lado da rua.

Quando os ânimos pareciam calmos, um rapaz pertencente à comunidade LGBT, mais afastado da concentração, é, alegadamente, atirado ao chão por um peregrino. Segundo os presentes, o agressor fugiu sem dar hipótese a identificação. Questionados acerca do incidente, nenhum dos lesados quis prestar esclarecimentos. Tanto quanto foi possível apurar, ninguém viu o que se passou senão os próprios.

Papa esteve no Parque do Perdão a ouvir jovens em confissão

Papa esteve no Parque do Perdão a ouvir jovens em confissão

Muitos fiéis jovens acorreram bem cedo para Belém, ao Parque do Perdão junto do Mosteiro dos Jerónimos, para serem ouvidos em Confissão, um dos sacramentos da Igreja Católica, a que o Papa Francisco deu mais notoriedade ao fazer-se fotografar enquanto ele próprio se confessava, demonstrando que até aos Papas é necessária a absolvição.

Hoje, em Belém, como tem sido hábito em todas as JMJ, o Papa Francisco recebeu alguns jovens nos pequenos confessionários montados por presidiários dos estabelecimentos prisionais de Coimbra, de Paços de Ferreira e do Porto.

As imagens, divulgadas pela organização, demonstram o Papa Francisco a encaminhar-se para um dos confessionários onde recebeu 3 jovens em confissão, sob o olhar atento da sua segurança pessoal.

Papa Francisco alerta aos jovens para os perigos das redes sociais

Papa Francisco alerta aos jovens para os perigos das redes sociais

O primeiro banho de multidão aconteceu hoje no Parque Eduardo VII, temporariamente baptizado “Colina do Encontro”, onde Francisco encontrou uma multidão de jovens de várias nacionalidades gritando “está é a Juventude do Papa”.

Já no palco, Francisco assistiu a diversos momentos musicais e performances artísticas que culminaram com um desfile de bandeiras das nacionalidades dos peregrinos das JMJ.

Num discurso curto o Papa alertou, como tem feito em diversos momentos do seu Pontificado, para os perigos das redes sociais, das “ilusões do mundo virtual”, dos algoritmos e dos “lobos que se escondem por detrás dos sorrisos de falsa bondade”. Francisco, o Papa das periferias, exortou os jovens, que são “alérgicos a falsidades e a palavras vazias”, a criar espaço para todos na Igreja.

O seu discurso terminou com o apelo do Papa a que todos os jovens se conectem com Cristo e que desfrutem das JMJ.

Movimento pró-palestiniano apoia organizações suspeitas de terrorismo

Criado em 2005 por Omar Barghouti, o movimento Boicote, Desinvestimento e Sanções (BDS) luta pela retirada de Israel dos Territórios Ocupados, pelo desmantelamento do muro na Cisjordânia e pelos direitos fundamentais dos palestinianos a residir em Israel e na Autoridade Palestiniana. No entanto, o governo israelita acusa o grupo de incitar à violência contra o Estado e os seus cidadãos.

De acordo com o Ministério dos Assuntos Estratégicos (MAE), o BDS conta com o apoio de 170 organizações, entre as quais o Conselho das Forças Nacionais e Islâmicas na Palestina, que engloba o Movimento de Resistência Islâmica (Hamas) e a Frente Popular para a Libertação da Palestina (FPLP), ambos considerados terroristas pela União Europeia.

O gabinete ministerial alega que o Comité Nacional do BDS branqueia o passado dos seus apoiantes, retratando-os como estudantes, empresários e activistas. “A ocultação de laços com organizações terroristas levou, muitas vezes, as autoridades ocidentais, especialmente na Europa, a considerar os antigos e actuais operacionais e as ONG de que fazem parte, como actores legítimos da sociedade civil”, sublinha.

Em 2014, surgiu a página de Facebook da sucursal portuguesa. Até então, a campanha de boicote estava a cargo de organizações como o Comité de Solidariedade com a Palestina e o Movimento Pelos Direitos do Povo Palestiniano e pela Paz no Médio Oriente (MPPM). Desde a sua criação, o BDS Portugal já organizou vinte eventos, incluindo manifestações e conferências. Estas duas organizações não responderam às questões da TejoMag até à hora de fecho desta edição.

A lista negra do MAE

Em 2011, o antigo presidente Jorge Sampaio, então Alto Representante para a Aliança das Civilizações das Nações Unidas (UNAOC) e Jorge Lobo de Mesquita, Representante de Portugal junto da Autoridade Palestiniana (AP), visitaram a sede da organização Al-Haq e o seu líder Shawan Jabarin. O objectivo dessa visita era “discutir os obstáculos à cooperação cultural nos Territórios Ocupados”.

O trabalho da Al-Haq consiste em documentar as “violações dos direitos individuais e colectivos dos palestinianos”. Recentemente, alargou a sua esfera de ação para incluir colaborações com entidades locais, regionais e internacionais, bem como para promover iniciativas de boicote contra Israel. Jabarin desempenha a função de Diretor-Geral da Al-Haq desde 2006, tendo cumprido várias penas de prisão por, alegadamente, pertencer à FPLP.

Em 2007, o Supremo Tribunal israelita comparou-o ao Dr Jekyll e Mr. Hyde, uma referência à personagem do famoso romance de Robert Louis Stevenson. “Uma parte do seu tempo é dedicada à liderança de uma organização de direitos humanos, outra é passada como operacional numa organização que não tem absolutamente nenhuma ligação com direitos. Pelo contrário, rejeita o mais fundamental de todos, sem o qual não existem outros. Ou seja, o direito à vida”, assinalou o juiz.

Questionado sobre a pertinência desta visita e se sabia que Jabarin tinha sido condenado, Jorge Lobo Mesquita explicou que não poderia comentar, pois já não ocupava o cargo de Representante de Portugal junto da Autoridade Palestiniana (AP).

101 Movimento pró-palestiniano apoia organizações suspeitas de terrorismoSoldados israelitas apreendem equipamento informático e ficheiros de clientes durante uma rusga aos escritórios da Defense for Children International – Palestina, em Al-Bireh, Cisjordânia, uma das organizações que consta no relatório do MAE 29 de julho de 2021 (Fonte: Al Haq)

A Al-Haq é uma das seis organizações não-governamentais que há dois anos foram alvo de buscas pelas forças israelitas e encerradas por alegadas “razões de segurança”. O mesmo aconteceu com a Addameer Prisioners Support and Human Rights Association, uma instituição civil que oferece assistência jurídica gratuita a presos políticos palestinianos. Segundo a página oficial do BDS, a Addameer subscreveu um apelo para exercer pressão sobre a comunidade internacional, com o intuito de impor embargos e sanções contra Israel. Numa publicação datada do dia 18 de Agosto de 2022, a filial portuguesa da BDS disse apoiar “inequivocamente” estas duas organizações.

Em entrevista à revista +972, Hisham Sharbati, um colaborador da Al-Haq, contestou as acusações, dizendo que a supervisão é “apertada” e que toda a gente sabe para aonde vai cada shekel”. Sahar Francis, dirigente da Addameer, também sublinhou a importância do seu trabalho dentro de um contexto mais abrangente: “há anos que somos visados por uma razão. Estamos a conseguir mudar o paradigma global, ao não só abordar a ocupação, mas também o apartheid, e estamos a disponibilizar informação para Haia”.

Questionado se considera o BDS um movimento pacífico e legítimo de resistência, o Ministério dos Negócios Estrangeiros respondeu que “não se pronuncia sobre instituições ou organizações de cariz privado, nem sobre as actividades que levam a cabo”. “O posicionamento oficial do Governo Português nesta matéria é público e reiterado, alicerçando-se há muito nos princípios de defesa de uma solução de dois Estados soberanos vivendo pacificamente lado a lado e de condenação de actos unilaterais que possam comprometer uma solução para uma paz justa e duradoura”, escreveu.

“Não morras senão no meio de uma chuva de balas”

Em 2015, Khalida Jarrar, ex-directora da Addameer (1993-2006), enfrentou julgamento perante o Tribunal Militar de Israel, acusada de uma série de crimes contra a segurança do Estado. Segundo o tribunal, Jarrar era “membro e activista de alto escalão da Frente Popular para a Libertação da Palestina (FPLP)”, um grupo armado responsável por mais de nove atentados terroristas. 

Jarrar representou a FPLP no Conselho Legislativo Palestino, do qual também era membro. Uma das acusações que enfrentou, e que continua a negar, é a de ter supostamente incentivado o “sequestro de soldados israelitas para negociar a libertação de prisioneiros palestinos”. Naquele ano, Jarrar entregou à mãe de Muataz Washaha, um agente da FPLP morto pelas forças de segurança israelitas, uma placa honorária com uma citação do líder do grupo: “Cuidado com a morte natural; não morras senão no meio de uma chuva de balas.” Desde então, Jarrar cumpriu mais três penas pelos mesmos motivos.

49%20(Fadi%20and%20Muataz) Movimento pró-palestiniano apoia organizações suspeitas de terrorismoFadi e o seu irmão Muataz Washha envolveram-se num tiroteio no dia 25 de fevereiro de 2014. Fadi admitiu o acontecimento e chegou mesmo a entregar a arma utilizada durante o incidente. Para mais informações, consulte o comunicado da Agência de Segurança de Israel. (Fonte: DigFind)56 Movimento pró-palestiniano apoia organizações suspeitas de terrorismo

Após a morte do jovem palestiniano, o Movimento de Solidariedade para a Palestina Livre apelou à comunidade internacional para acabar com a “impunidade contra o terrorismo de Israel” e aderir à “campanha de Boicote, Desinvestimento e Sanções (BDS)”. Fadi Washha, o irmão mais novo, foi morto em 2021 durante um protesto que se dizia pacífico. De acordo com um relatório do Ministério dos Assuntos Estratégicos de Israel, os irmãos “estiveram envolvidos num tiroteio contra as autoridades”.

No dia 8 de Abril de 2015, o Movimento pelos Direitos do Povo Palestino e pela Paz no Médio Oriente (MPPM), uma organização portuguesa que apoia a campanha BDS, emitiu uma declaração pedindo a “libertação imediata” de Khalida Jarrar. Num documento ao qual a TejoMag teve acesso, o MPPM instou o governo português a “retirar todas as consequências do reiterado incumprimento por parte de Israel destas normas jurídicas”, nas suas relações com Israel e em conformidade com as “disposições de direito internacional a que Portugal aderiu”.

Terrorista recebida no Parlamento Europeu

No 41º aniversário do Dia do Preso Palestiniano, o Movimento pelos Direitos do Povo Palestino e pela Paz no Médio Oriente (MPPM) e a União de Resistentes Antifascistas Portugueses (URAP) expressaram solidariedade com a “luta do povo palestiniano e, em particular, com os patriotas palestinianos presos nas prisões” em Israel. De acordo com um comunicado da organização Samidoun, uma das principais promotoras do BDS nos EUA, estas organizações manifestaram disponibilidade para trabalhar “em prol da solidariedade com a luta do povo palestiniano contra a ocupação”.

Entre os afectados pelo sistema judicial estava Bilal Kayed. Detido em 2002, Kayed foi condenado a 14 anos e meio de prisão por pertencer às Brigadas Abu Mustafa, o ramo militar da FPLP, e por “tentativa de homicídio” contra soldados israelitas. Segundo o relatório do Ministério dos Assuntos Estratégicos (MAE), “as suas acções são profundamente militaristas”. O relatório sublinha que “se não fosse pela detenção do arguido, ele estaria livre para completar estes actos de terror”. Um dos seus contactos mais próximos era Mustapha Awad, um libanês treinado pelo Hezbollah. O mesmo relatório revelou que Awad “transferiu fundos para a Bélgica e representou a Samidoun no Campo de Refugiados de Shatila no âmbito da campanha para libertar Bilal Kayed”.

97%20(Leila%20Khaled%20no%20Parlamento%20Europeu) Movimento pró-palestiniano apoia organizações suspeitas de terrorismoLeila Khaled, ícone da resistência palestiniana e líder política, juntou-se a representantes da Rede de Solidariedade com os Prisioneiros Palestinianos Samidoun, à Coordenação Europeia dos Comités e Associações para a Palestina e à Organização da Juventude Palestiniana da Europa para uma série de reuniões no Parlamento Europeu, em Bruxelas, no dia 8 de fevereiro. (Fonte: Samidoun)

Em Fevereiro de 2016, Mustapha Awad acompanhou uma delegação liderada por Leila Khaled ao Parlamento Europeu. Foram recebidos por Ana Gomes, então deputada do Partido Socialista, e Martina Anderson, do Sinn Féin. O objectivo dessa visita era pressionar os deputados europeus a pedir a libertação de Khalida Jarrar e do Secretário-Geral da Frente Popular para a Libertação da Palestina (FPLP), Ahmad Saadat. Saadat foi um dos organizadores do atentado mortal contra o ministro do Turismo israelita Rehavam Ze`evi em 2001.

Nascida em 1944, Leila Khaled é uma figura importante no movimento de resistência palestiniano. Nas décadas de 60 e 70, esteve envolvida no sequestro e desvio de dois aviões para chamar a atenção do público para a causa palestiniana. Segundo o relatório, Khaled “continua a manter laços activos com terroristas”. De acordo com fontes abertas, é uma das principais impulsionadoras do grupo BDS na África do Sul. Apesar dos esforços da TejoMag, não foi possível obter um comentário de Ana Gomes.

Durante uma visita à Alemanha em 2016, Leila Khaled afirmou que “as negociações só serão feitas com facas e armas”. Dois anos depois, o então Ministro dos Negócios Estrangeiros alemão, Heiko Maas, solicitou à Missão Palestiniana na Alemanha que removesse uma publicação de Khaled que dizia: “Resistência não é terrorismo”. Um dos seus apoiantes é Joe Catron, representante do BDS nos EUA. No dia 28 de Janeiro de 2015, Catron publicou um tweet solicitando ao líder do Hezbollah, Hassan Nasrallah, que atacasse Telavive. O jornal tentou obter a posição oficial do representante da Palestina em Portugal, Ahmad Abuznaid, bem como a do embaixador de Israel, Dor Shapira. No entanto, até ao fecho desta edição, não recebeu qualquer resposta.

Nota: A TejoMag reuniu um conjunto de capturas de ecrã das páginas de Facebook de defensores da plataforma BDS, que disponibilizamos. Estas imagens contrariam a alegação de que os apoiantes do BDS não manifestam atitudes antissemitas. Embora os comentários não sejam oficialmente endossados pela página, nem provenham dos próprios organizadores, a sua persistência sugere uma colaboração de natureza questionável. Como se costuma dizer, “quem cala, consente”. As capturas de ecrã podem ser encontradas no Google Drive (link fornecido).

Português preso e torturado na Turquia por “parecer gay”

Miguel Álvaro tem 34 anos, é português e vive no Brasil. No final de junho foi de férias para a Turquia e acabou por ficar preso durante 19 dias por “aparentar ser gay“.

O pesadelo, relatado ao P3, começa no dia 25 de junho, dois dias depois de ter aterrado na capital turca. A parada gay em Istambul, considerada ilegal pelas autoridades turcas, foi palco de vários confrontos entre polícia e manifestantes e Miguel, que apesar de ser homossexual nem tinha conhecimento desta manifestação, foi apanhado na curva e detido quando apenas estava a pedir indicações para visitar um ponto turístico.

“Sítio errado à hora errada”

Acabou cercado e agarrado por vários polícias. Sem perceber o que estava a acontecer, tentou libertar-se e acabou agredido e  empurrado contra uma carrinha da polícia, tendo ficado detido durante cinco horas. Um dos agentes explicou-lhe que a detenção aconteceu por causa da aparência. “Pensaram que participaria numa marcha LGBTQIAP+ não autorizada que ia acontecer ali perto, por parecer gay. Estava no sítio errado à hora errada”.

Miguel Álvaro foi mantido dentro de uma carrinha da polícia durante 13 horas antes de ser levado para uma esquadra da cidade, onde não teve autorização para fazer qualquer chamada. Depois, foi transferido para o centro de detenção de imigrantes de Tuzla, também em Istambul, conhecido por problemas de sobrelotação, violência e condições sanitárias precárias. Mas o pesadelo não termina aqui.

O horror da prisão na Turquia

Horas depois, foi levado para a prisão de Sanliurfa, localizada a poucos quilómetros da fronteira com a Síria, onde permaneceu até 12 de julho. “Chegámos a Sanliurfa ​ao final do dia de terça-feira [dia 27 de junho]. Ainda não tinha dormido, feito uma refeição ou tido acesso ao meu telemóvel desde a detenção. Ninguém sabia onde eu estava”, destaca.

“Ficámos nessa prisão com outros reclusos a ameaçar-nos de morte. Todas as noites um de nós ficava acordado para garantir que ninguém entrava na nossa cela para nos magoar”, acrescenta. Só na semana seguinte conseguiu fazer uma chamada. Foi ao pai quem ligou e explanou a situação em que se tinha visto envolvido. “Só me lembro de decorar o nome do sítio onde estava: ‘Fui detido, estou aqui, preciso de ajuda'”.

Embaixada portuguesa nada fez

Apesar dos contatos da família com a Embaixada de Portugal na Turquia, nenhum representante português o visitou ou ofereceu qualquer tipo de ajuda. A 12 de julho, após 19 dias de detenção, Miguel Álvaro saiu finalmente em liberdade. Foi escoltado pela polícia até à porta de embarque e regressou a Portugal no dia seguinte. “Neste momento, estou num estado psicológico horrível, tenho muito medo das sequelas no futuro. Não consigo acreditar que isto me aconteceu. Rezo para que se faça justiça. Não vou descansar. Espero levar o meu caso ao Tribunal Europeu dos Direitos Humanos”, conclui.

O fim de 70 anos de história. Encerrou a última loja de ferragens de Campolide

A três dias de fechar definitivamente a loja, Krisna Maugi, de 47 anos, encontra-se em cima de um escadote a esvaziar as prateleiras. Do lado direito já se encontram vazias. No corredor, pelo chão, há caixas de papelão com material pronto a sair, que estreitam ainda mais a passagem onde só cabe, por norma, uma pessoa. A filha mais nova, Nikita, também veio ajudar. Apesar de querer seguir o rumo das ciências, a jovem de 17 anos, que desenrosca os puxadores antigos expostos à entrada, não deixou de aprender a arte do negócio familiar. É ela que, nesta última semana de junho, vai atendendo alguns clientes, enquanto a mãe se despede dos fregueses mais antigos e dos curiosos que tentam perceber o que se está ali a passar.

Há uma década que a moçambicana de origem indiana, consolidou a sua segunda casa na Rua de Campolide, número 54B. Uma casa já com 70 anos, cujo ramo e nome originários foram preservados pelos vários proprietários que a mantiveram. Krisna orgulha-se de ter contribuído para a preservação da história da loja, mantendo a decoração, as madeiras antigas, as prateleiras e alguns materiais. E claro, o espírito bairrista e comunitário do espaço.

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Dias antes de fechar o estabelecimento, a proprietária continua a atender os clientes. / MARTA RAÑA

Uma mulher atrás do balcão

O marido detém outra loja de ferragens no Intendente. Foi lá que a última proprietária da Ferragens de Campolide conheceu os vários instrumentos que existem e as suas funções. O negócio em Campolide veio por acréscimo, quando o antigo dono que lhes comprava material, se endividou. “Já tinha uma certa idade e vários problemas de saúde. Nós ficámos com as dívidas do senhor e ele passou-nos a loja, que já estava vazia”, diz Krisna Maugi.

Em Moçambique, a lojista não teve tempo para prosseguir os estudos devido à guerra civil, mas aprendeu vários ofícios. Foi costureira, cameraman e decoradora de palcos. Veio para Portugal há 27 anos, onde casou e constituiu família. Quando adquiriu a loja de ferragens, passou por um duro processo de aceitação. “Havia muita discriminação nos primeiros anos. Uma mulher atrás do balcão… ainda por cima de uma loja de ferragens”, recorda. Os fregueses, sempre habituados a ver homens no atendimento da Ferragens de Campolide, acusavam-na imediatamente de não perceber como funcionava aquele tipo de vendas. “Mas, aos poucos, começaram a respeitar-me, porque viam que eu entendia do assunto”, prossegue. 

kirshnamartaalmeida2023_20 O fim de 70 anos de história. Encerrou a última loja de ferragens de Campolide   kirshnamartaalmeida2023_22 O fim de 70 anos de história. Encerrou a última loja de ferragens de Campolide

O freguês António Lapão é uma das presenças habituais na Ferragens de Campolide. / MARTA RAÑA

A sua simpatia foi sendo acolhida pelos restantes comerciantes da Rua de Campolide e pelos moradores. Amizades que Krisna homenageou ao longo dos anos, através de diversas fotografias colocadas na porta da loja, com uma nota a dizer: “As pessoas deste bairro fazem da minha loja um lugar cada vez mais especial”. Foram eles que acompanharam o seu percurso no bairro.

Os mais próximos – idosos vindos de várias partes da freguesia – que todos os dias passavam a tarde com Krisna na loja, assistiram à chegada da primeira carta com o aviso de término do contrato. António Lapão, de 80 anos, é um dos moradores que faz da Ferragens de Campolide um ponto de encontro e convívio. Conhece o espaço há 50 anos e também os antigos donos, que ensinou a conduzir quando trabalhava como instrutor na escola de condução. Atualmente, vê em Krisna uma amiga com quem desabafa e a quem recorre quando precisa de ajuda. 

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Vários clientes são apanhados desprevenidos ao saber que a loja vai encerrar. / MARTA RAÑA

Sem possibilidade de negociação e contacto direto

Outros clientes pontuais, como é o caso de Isabel Santos, foram apanhados de surpresa. Ao chegar ao balcão da loja, a arquiteta com estúdio em Campolide, pediu a Nikita os materiais que ali costuma comprar para elaborar as maquetes. Ao ser atendida pela filha da proprietária, ver as paredes parcialmente vazias e a agitação geral que se fazia sentir, decidiu perguntar o que se estava a passar. A resposta deixou-a incrédula.

“Pensava que estavam a renovar a loja”, diz à proprietária, que se aproxima, adivinhando uma despedida. “Estou arrepiada”, exclamou, explicando aos presentes: “nesta loja encontro soluções que não existem em mais nenhum lado”. Krisna não hesita em relembrar a relação com Isabel e com outros clientes e o significado que a loja tem para ambos. As lágrimas que Krisna não conseguiu conter e o abraço caloroso da arquiteta, demonstraram que ao longo destes anos, Krisna foi mais do que uma vendedora e Isabel mais do que uma cliente.

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Nikita, filha mais nova de Krisna Maugi, retira o material exposto. / MARTA RAÑA

Inevitavelmente, a conversa vai sempre dar a uma reflexão sobre a evolução do bairro de Campolide. “Tínhamos bancos e Multibanco…”, reflete Isabel Santos. “Tenho a sensação de que as coisas estão a evoluir, mas se está a perder o que é essencial”, conclui. O que causa mais perplexidade a todos é o modo como a proprietária foi tratada pelo atual senhorio. Desde início, não houve possibilidade de negociação, nem de contacto direto.

O espaço era alugado e o antigo senhorio vendeu-o. Krisna foi, num primeiro contacto por carta, informada de que o novo senhorio não iria renovar o contrato e foi-lhe dado um prazo para sair. A carta dizia que “tinha outros planos para a loja”. Desde que recebeu o aviso, tem tentado contactar o senhorio para lhe explicar a importância de a manter a funcionar e o que esta significa para o bairro. Mas os seus esforços foram em vão. Recorreu também à sua advogada, que infelizmente disse que não era possível fazer nada para resolver a questão.

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Na última semana de funcionamento vários moradores e comerciantes ajudam nas arrumações. / MARTA RAÑA

“Obrigado” a fechar

A tendência para o encerramento de lojas de comércio a retalho na freguesia de Campolide tem vindo a intensificar-se, segundo relatos dos moradores e comerciantes. O último negócio a fechar foi a papelaria pertencente a Mário Prata, de 80 anos, em fevereiro deste ano, como nota a Junta de Freguesia de Campolide, no boletim informativo Notícias de Campolide. A papelaria era já tão conhecida pelos fregueses que já ninguém sabia qual era o seu nome originário. Era somente conhecida como a papelaria do senhor Mário Prata. Esta localizava-se perto da loja Ferragens de Campolide, na Rua General Taborda, perpendicular à Rua de Campolide. Também na condição de inquilino, Mário Prata foi “obrigado” a fechar a loja que mantinha desde 1984. Não teve outra opção. O próprio, que acompanhou a evolução do comércio em Campolide, ressalvou ao Notícias de Campolide que quando o pequeno mercado e a feira de rua deixaram de se realizar “foi a morte de tudo”. 

De momento, quando se passa no local onde tinha o seu negócio, vê-se que está fechado para obras com um painel de metal a cobrir a entrada. As remodelações estão integradas no restante edifício destinado à habitação. A Drogaria e Perfumaria Mavi foi outro negócio que encerrou em 2021, embora se desconheça os motivos do fecho. A notícia foi avançada pelo jornal Mensagem de Lisboa. Krisna acredita que o destino do local da loja de ferragens será também para habitação. “Vão renovar e fazer umas obras para depois alugarem para outro fim”, constata.

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Edifício onde se localizava a Papelaria de Mário Prata / MARTA RAÑA

Esperanças não faltam

As arrumações continuam na loja de ferragens. À habitual confusão organizada das paredes preenchidas de pequenos e grandes materiais de construção, parafusos, torneiras, utensílios de limpeza, tinta, bengalas ou pregos, junta-se um maior sentimento de tristeza pelos espaços já vazios. Os clientes não param de entrar, pedir ajuda, esclarecer dúvidas. Krisna tenta esvaziar o máximo de material da loja, transportando as caixas de papelão para a carrinha do marido que, por volta das 17h, estacionou à porta. A Nikita juntam-se os comerciantes da frutaria ao lado, que carregam o que podem, enquanto à porta da funerária o dono, também amigo de longa data, observa o que se passa.

Nesse mesmo dia, a família reuniu-se na loja para uma reunião com o representante do senhorio. Ficou combinada somente a entrega da chave da loja, contrariando as últimas esperanças de Krisna Maugi, que pensava ainda ter alguma chance para negociar. “Até ao último momento não vou perder a esperança. Se for preciso volto a pôr as coisas no sítio”, refere. Vários fregueses sensibilizados com o seu caso têm-na ajudado a procurar outro espaço na freguesia. Apesar de o valor das rendas dos locais que encontrou serem incomportáveis, a lojista diz não desistir de um dia poder voltar a reabrir a loja em Campolide.

 *  À data da redação desta reportagem a loja Ferragens de Campolide, ainda se encontrava em funcionamento.

De viajante a voluntário da JMJ Lisboa 2023

A sede da JMJ, o Comité Organizador Local (COL), fica em Lisboa e conta com cerca de 700 voluntários ao todo, sendo que 48 deles não são portugueses.

Existem voluntários de curta e de longa duração, de mais de 15 nacionalidades, que deixaram o seu país por tempo limitado para ajudar na organização do evento criado pelo Papa São João Paulo II e que acontece desde 1986. 

É a primeira vez que Portugal recebe uma JMJ e o evento já está a ser preparado intensivamente há, pelo menos, um ano. 

Os voluntários que estão em Lisboa escolheram viver durante alguns meses num país novo e desconhecido e, para perceber o que os motiva a participar neste evento em específico, interessa começar a falar do passado.

Mateus Lino é um jovem brasileiro de 23 anos que é voluntário na secção de acreditação de jornalistas e de relações com os media.

Conta que a motivação para se tornar voluntário da JMJ e vir para Portugal foi o facto de ter vivido a Jornada no seu país, no Rio de Janeiro. “Eu tinha 12 anos quando aconteceu a JMJ do Rio, em 2013, e não pude participar. Mas vivi a pré-jornada na minha diocese e foi incrível, porque tivemos a celebração da passagem dos Símbolos da JMJ. Acendeu-se no meu coração uma vontade de participar na JMJ e, quando alcancei a maioridade, em 2019, fui à JMJ do Panamá que acabou por ser uma das melhores viagens da minha vida”.

Mateus fala sobre a oportunidade que teve ao fazer uma leitura na missa de envio e como aquele momento mudou o curso da sua vida.

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Mateus Lino à direita com os seus colegas. / Direitos reservados.

“Li para mais de um milhão de pessoas e para o Papa. Foi um momento muito especial. Naquela altura, havia muita gente de vários países e vi lá um português. Naquele local, às cinco da manhã, descobri que a próxima Jornada seria em Portugal. Ao conversar com ele vi a expectativa que tinham em relação à JMJ de Lisboa e foi nessa altura que pensei que precisava mesmo de viver a próxima Jornada. O idioma não seria uma barreira e ficou logo decidido que viria. Arranjei uma desculpa para vir para Portugal, vim fazer uma pós-graduação e, logo de seguida, comecei a trabalhar no COL como voluntário na secção de relação com os Media e com a Imprensa”.

Para Mateus Lino, a adaptação não foi assim tão difícil pela semelhança das duas culturas, a brasileira e a portuguesa. No entanto, diz que onde sentiu mais diferença foi na gastronomia.

Marisol Garcia tem 27 anos e é mexicana. Tornou-se voluntária do Contact Center há cerca de quatro meses e embarcou no desafio de ser voluntária da JMJ Lisboa 2023 pela experiência positiva que teve na única Jornada a que já foi, a de Cracóvia, em 2016.

“O que me marcou mais foi a experiência de ir sozinha. Não fui com nenhum grupo mas acabei por ser acolhida por pessoas que vinham de Porto Rico. Foi bom experimentar a misericórdia quando me sentia sozinha, um pouco perdida e muito vulnerável e chegar a um grupo daqueles com quem pude compartilhar tanto”.

“Depois da JMJ de 2016, voltei para o México com um compromisso maior para com a igreja e, nisso, descobri como quero ser chamada a participar nela, na vida pessoal e profissional. E a JMJ é o espaço perfeito para abrir horizontes, conhecer outras realidades eclesiais, sentir que faço parte da igreja e que o Senhor me colocou ao serviço. Sinto que todas as peças se encaixaram para que estivesse aqui” e foi com este sentimento que Marisol arrancou em direção a Lisboa, naquilo que disse ser “uma montanha-russa de emoções”. 

Esmeralda Sosa tem 25 anos e a sua primeira viagem a Portugal foi em 2021, quando veio estudar para Lisboa. Ficou até janeiro de 2022 e, depois, regressou a casa, ao Panamá. Mas a vida surpreendeu-a e, nove meses depois, em outubro de 2022, voltou para Lisboa para dar início a uma grande missão: ser voluntária da JMJ, na área da Comunicação.

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Esmeralda Sosa à direita. / Direitos reservados.

Esta jovem já vivenciou os dois lados de uma JMJ, a de peregrino e a de voluntário. Em 2013 foi peregrina na JMJ do Rio de Janeiro e, em 2019, foi voluntária paroquial durante a JMJ no Panamá em 2019. Esmeralda foi Coordenadora do Comité Organizador Paroquial (COP) da igreja a que pertence. E abraça, agora, o desafio de ser voluntária central, na sede da JMJ de Lisboa.

“Esta frase é muito cliché, mas posso dizer que, se me dissessem que isto ia acontecer, eu não acreditaria. Como já tinha feito tanta coisa, não imaginava que pudesse acontecer mais. Eu sabia que queria fazer voluntariado algures, ao longo da vida… Queria oferecer um tempo da minha vida por uma causa! Foi assim que, a 31 de outubro de 2022, regressei a Portugal para viver a JMJ”.

Duas viagens distintas… o mesmo destino, mas duas experiências diferentes. É como Esmeralda compara as duas situações. “Quando vim estudar tinha tudo muito organizado. Desta vez, sabia que ia ficar com uma família de acolhimento mas não sabia com quem. Foi um processo longo, onde fiz entrevistas, trocas de e-mails e perguntas para saber como tudo funcionaria. Tive o apoio dos meus pais! O meu pai apenas teve receio em relação ao local onde ficaria a dormir… é o normal dos pais. Tive também o apoio dos padres da minha Diocese e dos meus amigos. Lembro-me de todos questionarem o facto de ficar tanto tempo, mas tinha de ser!”

“Portugal precisa de um avivamento”

Três jovens, cada um com a sua experiência, mas todos com desejos semelhantes: o de que a JMJ transforme o coração dos portugueses.

“Acho que Portugal precisa de um avivamento… Deus já chamou os portugueses de diversas formas, mas sabemos que muitas igrejas estão vazias e que os jovens não a frequentam tanto e a veem como algo antigo e velho… Acho que esta JMJ vai mudar isto! Não só em Portugal, como na Europa”, afirma Mateus convictamente e com um certo brilho no olhar.

Acrescenta, ainda, que “os jovens portugueses vão ficar muito felizes. E, por mais que muita gente critique e fale mal, no final vão todos ver o que é a JMJ. No Brasil foi assim! Muitos criticaram, mas, quando o evento acabou, as pessoas foram surpreendidas pela positiva.”

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Marisol Garcia. / Direitos reservados.

Estamos a menos de um mês da Jornada Mundial da Juventude e estes jovens começam a perceber que o regresso a casa está mais perto do que achavam. Mas uma coisa é certa, sabem que vão recordar esta JMJ com carinho e com o sentimento de missão cumprida.

“Na semana passada pus-me a escrever o que tenho vivido aqui, o que aconteceu, o que tem corrido bem ou mal e percebi que não podia ser uma experiência mais completa. E acredito que estarei pronta para voltar para casa com a missão cumprida”, conta Marisol com saudade no coração.

Mateus comenta que, quando a JMJ chegar ao fim, vai sentir “um vazio muito grande”. “Desde que cheguei que estou à espera que a Jornada aconteça e construí muitas amizades aqui. Então, acho que a partir do dia 7 de agosto de 2023, vou ficar um pouco triste porque acabou, mas vou estar muito feliz por Portugal ter vivido esta experiência.”

Já Esmeralda Sosa relembra o sentido de missão e entrega, que fez com que decidisse vir para Lisboa: “Definitivamente vou sentir que cumpri a minha missão. Falei com uma amiga no outro dia e disse-lhe que quando chegar e aterrar no Panamá vou sentir que cumpri um objetivo e um propósito de vida.”

“Vai haver sempre um antes e um depois da JMJ”

Após a JMJ ficam recordações de tempos bons. Mas estes jovens avisam que ser voluntário não é um trabalho fácil mas é, sem dúvida, gratificante.

“O maior desafio de ser voluntário é colocar o ego de lado”, confirma Mateus Lino. “Voluntário não tem salário. Tem alimentação, sim… mas acaba por ser um desafio para quem vem do mercado de trabalho entregar-se de coração ao voluntariado. Sabemos que não conseguimos adquirir bens materiais, mas sabemos que o bem que fazemos é muito maior que tudo o resto.”

Marisol Garcia considera que “não faz sentido ter oportunidades tão maravilhosas se depois não as duplicamos e passamos aos outros”. “O evento é tão grande e conforta saber que, os tempos difíceis, não és só tu que os passas… há mais pessoas na mesma situação que tu. E, por um lado, é bonito, porque há empatia.”

“Acredito que vai ser uma experiência marcante, principalmente para a juventude, sejam eles crentes ou não crentes. Vai haver sempre um antes e um depois da JMJ…”.

O preço da Fé: os milhões gastos na Jornada Mundial da Juventude

 A Jornada Mundial da Juventude (JMJ) teve início em 1984, durante o pontificado do Papa João Paulo II. A ideia surgiu como uma resposta ao desejo do Sumo Pontífice de estabelecer um encontro regular com os jovens, onde se pudessem reunir num ambiente de oração, reflexão e partilha da fé. Desde então, a JMJ tornou-se num dos maiores eventos religiosos do mundo, contando com a participação de milhões de jovens de vários países. Acontece a cada dois ou três anos e realiza-se num país à escolha do Papa, sendo que, este ano, terá lugar em Lisboa entre 1 e 6 de agosto. 

Com a expectativa de contar com mais de um milhão de pessoas, naquele que é descrito como um dos maiores eventos alguma vez realizados em Portugal, a organização de uma JMJ envolve despesas consideráveis.

Custos

Estão a ser feitos investimentos significativos na construção, reabilitação, adaptação ou melhoria de infraestruturas, nomeadamente de palcos, e áreas de culto. No que toca à logística, o investimento é feito no plano de mobilidade, na segurança, nos serviços de emergência, na comunicação, na acomodação e na alimentação. Já os recursos humanos pressupõem a contratação de uma grande equipa de profissionais necessários para garantir o bom funcionamento do evento, como polícias, meios de socorro, entre outros. Finalmente, somam-se os custos associados à promoção e divulgação de um evento desta magnitude. Destacam-se as despesas com marketing, publicidade e divulgação para atrair participantes quer a nível nacional, como internacional.

O custo total está previsto rondar os 160 milhões euros, metade dos quais dizem respeito a dinheiros públicos. Se este valor já era conhecido, a verdade é que com o aproximar do evento, começam a ser descortinados, com mais ou menos pormenor, a alocação destes milhões.

Lisboa

A Câmara Municipal de Lisboa orçamentou em 35 milhões o valor que tem previsto gastar no evento, tendo detalhado que 21,5 milhões foram destinados para a área do parque urbano do Tejo-Trancão e os restantes 13,5 milhões serão investidos noutros locais da cidade, como o Parque Eduardo VII e o Terreiro do Paço.

É precisamente a cargo da autarquia liderada por Carlos Moedas que está a obra mais cara: a reabilitação do antigo Aterro Sanitário de Beirolas que será o recinto principal da Jornada Mundial da Juventude. Custou 7 milhões e foi adjudicada à empresa Oliveiras, S.A – Engenharia e Construção em concurso público. 

Segue-se o polémico altar-palco, agora com um custo de 2,98 milhões. Porém, este valor foi significativamente revisto em baixa (4,2 milhões) após muitas críticas, inclusive de Marcelo Rebelo de Sousa. A obra foi adjudicada pela SRU – Sociedade de Reabilitação Urbana à Mota-Engil, a empresa que o autarca de Lisboa garante que “fazia mais barato”.

Além disso, o município gastou 6,6 milhões para reforçar os recursos do Regimento de Sapadores Bombeiros, da Proteção Civil e da Polícia Municipal. Exemplo disso mesmo são os dois contratos de ajuste direto celebrados com a CERTOMA e que ascendem a 1,57 milhões. O primeiro, de 1,15 milhões, prende-se com a “aquisição de seis viaturas do tipo varredoura da marca RAVO Iseries”, qualquer coisa como 191 mil euros por viatura. O segundo, de 427 mil euros, diz respeito a uma “viatura de saneamento modelo TGS 18.4304X2 BL CH Euro 6”.

Soma-se, ainda, um contrato de 1,5 milhões com a MEO para a instalação de pontos multimédia e aluguer de equipamentos técnicos no Parque Eduardo VII. É ainda possível constatar um contrato de 39 mil euros com a Naipe D’Agosto para a “aquisição de serviços de soluções de comunicação e promoção – outdoors – para informação alusiva à Jornada Mundial da Juventude”.

Carlos Moedas reitera que “até 25 milhões de euros ficarão na nossa cidade”, explicando que muitas das infraestruturas terão uso para além deste evento. Feitas as contas, assinala um “investimento líquido no evento de 10 milhões de euros”.

 

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O polémico altar-palco foi adjudicado por ajuste direto à Mota-Engil, no valor de 2,98 milhões de euros. / MARTA RAÑA

 

Chorudo contrato de assessoria com treinador de futebol

O antigo jornalista da TVI, João Maia Abreu, foi contratado em dezembro de 2022 para coordenar as atividades de comunicação e relação com a imprensa. O contrato, de nove meses, ascende aos 37,5 mil euros, o que se traduz num salário mensal superior a quatro mil euros. Também Tiago Abreu, ex-assessor do CDS-PP na Câmara Municipal de Lisboa, assinou um contratoio na mesma altura e com a mesma duração. Neste caso, assumiu funções como membro da Unidade de Missão do Município de Lisboa. O salário fixa-se nos 2,7 mil euros mensais, totalizando 24,7 mil euros. 

O maior contrato de assessoria foi celebrado com um treinador de futebol. Francisco Guimarães foi designado em agosto de 2021 como assessor da vereadora Laurinda Alves. Menos de um ano depois, em julho de 2022, renunciou ao cargo. Auferia 3,8 mil euros por mês. Se cumprisse os dois anos, teria amealhado mais de 91 mil euros.

Loures

A Câmara Municipal de Loures, sob a liderança de Ricardo Leão, prevê desembolsar dez milhões. O encargo mais significativo, no valor de 4,2 milhões de euros, destina-se aos trabalhos de preparação dos terrenos na zona ribeirinha da Bobadela e foi atribuído à empresa Alves Ribeiro

A autarquia celebrou também um contrato de quase 29 mil euros com a Vista Alegre para a aquisição de 94 peças de cerâmica da escultura “Visitação”, do autor José Pedro. Contas feitas, cada peça, que se crê ser para oferta, representa um custo superior a 308 euros.

Governo

Já o Executivo, após uma previsão que apontava para os 36,5 milhões de euros, decidiu rever em baixa e fixar o orçamento nos 30 milhões. 

Uma vez que a Equipa de Projeto para a JMJ não tem número de identificação fiscal próprio, as compras são feitas através da Secretaria-Geral da Presidência do Conselho de Ministros. Assim, no espaço de quatro meses, foram celebrados 15 contratos no total de 8,93 milhões de euros. 

O mais avultado diz respeito aos 5,9 milhões pagos à Pixel Light para “serviços de fornecimento, montagem e operacionalização de sistemas de áudio e vídeo, iluminação ambiente e respetivo abastecimento de energia” para o Parque Tejo-Trancão.

Em relação às instalações sanitárias, o custo final supera aquele que havia sido anunciado em março: 1,15 milhões. A verdade é que o governo adjudicou um contrato com a Avistacidade de 1,15 milhões de euros para a instalação de “141 blocos modulares” de casas de banho, para o Parque Tejo-Trancão, valor que tinha sido anunciado em concurso público um mês antes. 

Porém, dois dias antes, também em concurso público, foi assinado um contrato com a Vendap para a “aquisição de serviços de fornecimento de equipamentos sanitários autónomos e respetivas manutenções/limpezas” do Parque Tejo-Trancão no valor de 1,28 milhões. No total, são 2,43 milhões de euros investidos em instalações sanitárias.

Mais recentemente, em 29 de junho, foi adjudicado um contrato por ajuste direto para a “aquisição de serviços de gestão de plantas halófitas na margem do rio Trancão” no valor de 111,8 mil euros. Uma rápida pesquisa permite perceber que se trata de plantas cujas raízes estão em contacto com água salgada ou que vivem em solos com grandes quantidades de sal. 

Já nesta segunda-feira, 3 de julho, foi celebrado um contrato por ajuste direto de 22,4 mil euros com a empresa FCiências.ID  para “serviços de monitorização da ação de restauro da vegetação de sapal na frente ribeirinha”. 

 

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No parque Edurado VII encontra-se em construção um outro altar-palco, orçamentado em 450 mil euros, que irá ser suportado pela Diocese de Lisboa. /  MARTA RAÑA

 

Plano de Mobilidade 

A menos de um mês do arranque, ainda não é conhecido o plano de mobilidade e transportes, o que tem originado preocupação e críticas de várias fações políticas. A ministra Adjunta e dos Assuntos Parlamentares, Ana Catarina Mendes, assegurou que será conhecido nos próximos dias e anunciou um reforço de 11%. O que já é certo é que a elaboração deste plano custou 89 mil euros. O contrato, celebrado no final de 2022 e por ajuste direto com a VTM, prevê várias soluções consoante o número de peregrinos que, por agora, é ainda incerto. 

Diocese de Lisboa

Finalmente, a Igreja estima desembolsar um valor em torno dos 80 milhões, conforme avançou o bispo auxiliar de Lisboa, Américo Aguiar. Desses, 30 milhões estão destinados para os milhões de refeições que serão servidas aos peregrinos. Além disso, também o altar-palco – da autoria do arquiteto João Matos, que terá 40 metros de largura e 24 metros de altura, que já começou a ser instalado no Parque Eduardo VII – que tem um custo de 450 mil euros, ficou a cargo desta entidade. 

 

Qual é o retorno? 

No entanto, apesar dos custos envolvidos, a JMJ também traz um alargado leque de benefícios. Desde logo, promove o turismo religioso e cultural, gerando receitas para o setor de hotelaria, restauração e comércio local. Para além dos impactos financeiros, nomeadamente com o milhão de peregrinos que são esperados, um evento desta magnitude tem tudo para catapultar ainda mais a visibilidade do país, estimulando o turismo a longo prazo e promovendo a imagem de Portugal como um destino acolhedor.

Em Novembro, o coordenador nomeado pelo Governo para a JMJ, José Sá Fernandes, assumiu que o retorno deveria rondar os 350 milhões de euros, tendo como exemplo o caso de Madrid.

Um estudo da PwC, com o apoio técnico do Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG) estima que cada peregrino vai gastar, em média, por dia, entre 30 a 36 euros. Já no caso dos peregrinos não inscritos, o valor deverá ficar entre 67 a 81 euros. No final, são apontados ganhos entre 411 a 564 milhões, com um impacto na economia que poderá superar os mil milhões.

Para Carlos Moedas, prognósticos só no fim do jogo. No entanto, o autarca sublinha que se cada um destes peregrinos gastar 40 euros por dia em Portugal, ao longo de sete dias, “estamos a falar de 300 milhões de euros. Estamos a falar não de dezenas, mas sim de centenas de milhões”.     

Da resistência à revolução: a evolução do movimento LGBTQIAP+

28 de junho de 1969, Stonewall Inn, Estados Unidos. Este é o ponto de viragem na história da comunidade LGBTQIAP+. Durante a madrugada, gays, lésbicas, pessoas transgénero, travestis e drag queens entram em confronto com a polícia e dão início a uma rebelião que viria a estabelecer os alicerces do movimento pelos direitos LGBTQIAP+ nos Estados Unidos e em todo o mundo. O episódio, que ficou conhecido como Rebelião de Stonewall ou Stonewall Riot, e que é considerado o marco zero do movimento, durou seis dias e surgiu como resposta à violência gratuita e rotineira infligida pela polícia nos bares gay de Nova Iorque. 

Desde então, o Dia Internacional do Orgulho LGBT, celebrado anualmente a 28 de junho, é o símbolo da coragem e resistência daqueles que participaram na manifestação, mas é também altura para (re)lembrar que ainda existe um longo caminho a percorrer na luta contra a discriminação, a violência e a desigualdade.

Há 33 anos, a 17 de maio de 1990, a Organização Mundial de Saúde retirava a homossexualidade da Classificação Internacional de Doenças. Ser homossexual deixou de ser considerado transtorno mental. Desde 2005 que, neste mesmo dia, passou a comemorar-se o Dia Internacional Contra a Homofobia, Transfobia e Bifobia.

A realidade portuguesa

Em Portugal, a homossexualidade e a diversidade de género foram frequentemente reprimidas e marginalizadas. Durante o Estado Novo, regime ditatorial que vigorou de 1933 a 1974, a homossexualidade era ilegal e considerada uma ofensa à moral pública. Essa repressão criou um ambiente hostil para a comunidade LGBTQIAP+, resultando em discriminação, ostracismo e violência.

“Ao longo de uma história de ativismo já com várias décadas, muito dificilmente se poderia falar de um momento único, mas antes de um conjunto de marcos socioculturais, jurídicos e políticos que foram dando forma ao movimento, permitindo-lhe dar resposta a novos desafios. Neste sentido, a transição para a Democracia após a mais longa ditadura da Europa Ocidental foi o evento político de maior relevo para qualquer movimento social em Portugal e que permitiu que outros marcos fundamentais tivessem lugar no campo específico da ação coletiva LGBTQIAP+”, começa por explicar Ana Cristina Santos, investigadora principal em Estudos de Género no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra.

Mesmo com a queda deste regime, só em 1982 se dá a descriminalização da homossexualidade no nosso país. Assim, de acordo com o Código Penal, a homossexualidade “entre adultos, livremente exercida e em recato”, deixou de ser punível por lei. No entanto, só 13 anos depois, em 1995, é que se verifica uma real mudança. Este foi o ano em que que se celebrou a Rebelião de Stonewall pela primeira vez em Portugal, uma iniciativa levada a cabo pelo Grupo de Trabalho Homossexual, um coletivo associado ao Partido Socialista Revolucionário. Além disso, é também em 1995 que nasceu a ILGA-Portugal, a “maior e mais antiga associação que luta pela igualdade e contra a discriminação”, que se tornou uma voz ativa na defesa dos direitos desta comunidade.

No ano seguinte, é criado o primeiro site para a comunidade LGBTQIAP+ em Portugal, o portugalgay.pt. A socióloga destaca ainda o “primeiro Arraial Pride organizado em espaço aberto, a primeira edição do então Festival de Cinema Gay e Lésbico, a primeira Marcha do Orgulho e, já nos anos 2000, o Fórum Social Português que agregou muitos coletivos e permitiu criar pontes e sinergias como jamais sucedera até então”.

A morte de Gisberta

É já na segunda metade da década de 2000, mais precisamente em 22 de fevereiro de 2006, que acontece o assassinato de Gisberta, mulher trans e sem-abrigo. Foi torturada até à morte por um grupo de menores que acabou por ser condenado a penas entre os 11 e 13 meses por “maus-tratos”. Este é um momento que atua como catalisador do ativismo trans. Não era apenas uma mulher trans, mas também “alguém que tinha tudo contra si. Pessoa totalmente vulnerável, em situação de sem-abrigo, de nacionalidade brasileira, trabalhadora sexual”, aponta Sara Malcato, psicóloga da ILGA. 

Ana Cristina Santos destaca que este episódio “constituiu a maior tragédia que, de uma forma pública e muito mediática, afetou a comunidade LGBTQIAP+, com particular relevo para as pessoas trans (incluindo aqui as pessoas que se identificam como transsexuais e/ou transgénero)”.

saramalcato Da resistência à revolução: a evolução do movimento LGBTQIAP+

A morte de Gisberta não foi em vão. Gerou-se uma onda de indignação e revolta tanto a nível nacional como a nível internacional. “Trouxe para o centro da reflexão a vulnerabilidade das vivências trans, com elevado grau de precariedade laboral, pobreza e transfobia”, sublinha a investigadora. “Revoltou as pessoas, nomeadamente as pessoas LGBTQIAP+, que se reviram naquilo e perceberam que ‘a próxima posso ser eu e não vou ter proteção social ou legal’”, enfatiza a psicóloga.

Além disso, “teve consequências sociais e jurídicas de relevo, como o aparecimento de coletivos e associações trans, a realização da Primeira Marcha do Orgulho do Porto e o agravamento das penas de crimes por ódio sexual”, destaca Ana Cristina Santos que, porém, lamenta não se ter ido mais além. “Esse momento de consternação acabou por se diluir, sem se ter traduzido noutras medidas a médio e longo prazo que permitissem maior qualidade de vida às pessoas trans”.

Os avanços históricos em Portugal

Em 2010, Portugal fez história ao tornar-se um dos primeiros países do mundo a aprovar o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo. Três anos depois, em 2013, outro importante marco: a lei da coadoção, que permitiu que casais homossexuais coadotassem filhos adotivos ou biológicos dos parceiros.

Já em 2015, foi aprovada a adoção por casais homossexuais, que garantiu que casais LGBTQIAP+ tivessem os mesmos direitos e oportunidades de formar famílias que casais heterossexuais. Finalmente, a mais recente vitória aconteceu em 2021: a eliminação da discriminação na doação de sangue, medida que colocou um ponto final a uma política discriminatória que impedia que homens gays e bissexuais fizessem doações de sangue.

O papel da Escola

Apesar dos inegáveis avanços, continuam a existir desafios no caminho da igualdade LGBTQIAP+ em Portugal. Prova disso mesmo é a saída do país do top-10 no ranking da ILGA Europa sobre os direitos desta comunidade, que tem em conta parâmetros como as leis do país e a segurança. “Revela que estamos estagnados. Não é que estejamos a criar leis punitivas, só que há países que, de facto, têm leis mais inovadoras e que já têm conseguido alcançar metas que Portugal ainda não alcançou, nomeadamente no que toca à saúde das pessoas LGBTQIAP+, principalmente as pessoas trans”, explica Sara Malcato.

A discriminação, a violência e o estigma ainda se fazem (e muito) sentir. O ativismo e a mobilização são fundamentais para enfrentar esses desafios, garantindo que os direitos desta comunidade são protegidos em todas as esferas da sociedade. E a Escola tem um papel fundamental para que as pessoas LGBTQIAP+ sejam verdadeiramente incluídas na sociedade. 

“Sem a Escola nunca vai existir verdadeira inclusão”, aponta. No entanto, apesar de existir uma lei da educação para sexualidade desde 2009, a verdade é “que o que há – quando é – é falar de prevenção de gravidezes não desejadas e DST’s”, lamenta. 

“O problema não são as crianças, são os adultos”, considera. “Há um medo muito grande de alguns adultos – que não tiveram educação sexual nas escolas – de acharem que se falam sobre sexo, os adolescentes vão começar a fazer sexo desenfreado. Aquilo que a investigação nos tem demonstrado é exatamente o oposto. Quanto mais informação temos, melhores escolhas fazemos”, esclarece. Nesse sentido, realça a importância de continuar a “adotar legislação que criminalize práticas como a homofobia, a transfobia, biofobia”, foca. “Não temos uma lei clara que criminaliza a homofobia, só temos contra o discurso de ódio”, assinala.

O fim das ‘terapias’ de conversão

Ana Cristina Santos começa por destacar o caráter de urgência no que toca à “proibição definitiva das chamadas ‘terapias’ de conversão”, uma reivindicação que deverá ser “finalmente obtida a breve trecho”, espera.

Acrescenta que “falta ainda garantir um conjunto de medidas de caráter interseccional, ou seja, medidas dirigidas a pessoas LGBTQIAP+ racializadas, migrantes, presidiárias, com deficiência ou doença crónica e/ou no envelhecimento. Não podemos continuar a projetar um modelo de tipo one size fits all: é preciso reconhecer e acolher as especificidades, procurando ajustar e enquadrar numa lógica de respeito pela dignidade e promoção dos direitos humanos”.

Ana+Cristina+Santos Da resistência à revolução: a evolução do movimento LGBTQIAP+

Além disso, defende que para além das mudanças na legislação, é necessário criar ou reforçar mecanismos que assegurem a aplicação das mesmas. “Há um forte défice de medidas de acompanhamento e monitorização que garantam a efetiva aplicação de leis aprovadas”, enfatiza.

Sara Malcato recorda ainda que individualmente  há também um papel a desempenhar. “Cada um de nós é parte da sociedade”, explica. “Quando ouvirmos uma piada que tem o intuito de humilhar um grupo de pessoas não nos rirmos ou quando virmos um comportamento que não é o mais adequado, devemos intervir”, frisa.

Uma nova ameaça

Após um período marcado por importantes conquistas tanto a nível social, como a nível jurídico na proteção das pessoas LGBTQIAP+ contra discriminação, desigualdade e violência, a verdade é que os “movimentos populistas anti-género e de extrema-direita que procuram desacreditar e reverter os avanços obtidos, fazendo incidir a sua crítica mais feroz no trabalho de proteção a crianças e jovens LGBTQIAP+ e/ou de género diverso” têm ganho força um pouco por toda a Europa e Portugal não é exceção, sublinha Ana Cristina Santos.

“Disso mesmo damos conta no projeto Infância Arco-Íris que desenvolvemos no Centro de Estudos Sociais (CES-UC) com financiamento da Comissão Europeia e em parceria com outras universidades e entidades a nível europeu”, adianta.

No entanto, não são só estas faixas etárias mais jovens que são afetadas. “Também nos projetos REMEMBER e TRACE – ambos sobre envelhecimento e diversidade sexual e de género – percebemos junto das pessoas entrevistadas que o crescimento da extrema-direita constitui o maior medo que pessoas LGBTQIAP+ acima dos 60 anos enfrentam quando pensam no seu futuro. Este é um dado particularmente triste quando percebemos que estas são as mesmas pessoas que, durante a sua infância e juventude, viveram no armário justamente como consequência de uma ditadura que perseguia e punia a homossexualidade com penas até dois anos de prisão. Assistir ao ressurgimento deste medo na reta final das suas vidas é perturbador”, conclui a investigadora.

Drogas sintéticas: a nova face de um problema antigo

Com o objetivo de promover avanços na ciência, mais concretamente na área da saúde, especialistas conceituados iniciaram testes que consistiam na modificação da estrutura molecular de certas substâncias. Destes resultaram compostos com propriedades distintas, nascendo assim o conceito de drogas sintéticas.

A TejoMag esteve à conversa com a médica psiquiatra Maria Moreno, que começa por explicar que se trata de  “substâncias químicas produzidas em laboratórios clandestinos e em países onde não existe controlo regulatório adequado”. Têm “efeitos psicoativos, ou seja, afetam a função do sistema nervoso central, alterando a perceção, o humor, a consciência e o comportamento das pessoas que as consomem” e, por norma, “são projetadas para imitar ou potencializar os efeitos das substâncias controladas, como anfetaminas, opiáceos ou canabinóides, ou para criar novos efeitos”.

Alerta que, apesar de serem vendidas como alternativas legais às drogas mais comuns, a verdade é que, em muitos casos, “são mais potentes e mais perigosas do que as drogas originais”. A falta de regulamentação a nível de segurança e controlo de qualidade, que fica evidente com o uso de “uma ampla variedade de produtos químicos para produzir essas drogas muitas vezes sem considerar a segurança ou a pureza dos produtos químicos”, pode ter efeitos adversos trágicos, podendo mesmo levar à morte.

Fáceis de esconder e de transportar, quer pelas pequenas quantidades que facilmente geram centenas ou mesmo milhares de doses, quer pelo surgimento de novas maneiras de consumo, nomeadamente em forma de spray nasal, como também em líquido para cigarros eletrónicos, estes estupefacientes são uma ameaça cada vez mais real à saúde pública. 

De acordo com o Relatório Europeu sobre Drogas 2022, todas as semanas surge uma nova NSP na Europa, situação que inspira cada vez maior preocupação. Em 2021, foram identificadas 52 novas drogas, aumentando para 880 o número total de NSP monitorizadas pelo Sistema de Alerta Rápido da União Europeia. 

O consumo em Portugal

Em Portugal, o consumo disparou nos últimos anos a partir do momento em que passou a ser possível comprar pela Internet. Os internamentos em psiquiatria por uso destas drogas duplicaram na Madeira e a situação tem vindo a escalar nos Açores. 

Assim, Sara Madruga da Costa, deputada do PSD, deu entrada, no passado mês de maio, na Assembleia da República, com um projeto de lei que pretende equiparar as drogas sintéticas às clássicas e assim permitir a posse de pequenas quantidades para consumo. O objetivo, de acordo com o jornal PÚBLICO, é proteger aqueles que precisam de tratamento.

Um inquérito online levado a cabo pelo Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências (SICAD) revela que os estupefacientes mais consumidos no nosso país, em 2021, eram da família das anfetaminas, como a metanfetamina, a LSD e a MDMA (comumente conhecida como ecstasy ou molly). Porém, esta lista é extensa e está em constante evolução, fruto de todos os dias surgirem novas substâncias, destaca Maria Moreno.

Os dados dão ainda conta de que a maioria dos consumidores em Portugal são jovens do sexo masculino entre os 18 e os 24 anos, que frequentam ou já concluíram o ensino superior e que consomem em contexto de diversão e quase sempre acompanhados. 

“Parece que estás dentro do teu próprio filme”

Foi precisamente neste contexto que José [nome fictício], de 23 anos, teve o primeiro contacto com uma destas substâncias. “Estava numa festa, havia um amigo com isso e quis experimentar”, recorda. A droga escolhida foi ketamina, também conhecida como K ou Special K. Foi criada em 1965 para fins anestésicos, nomeadamente veterinários. 

“Deixa-te super relaxado, sentes o corpo mais leve que o habitual, tudo de mal que se está a passar na tua vida passa enquanto estás sob efeito. Parece que estás numa pequena bolha; tens noção do que está à tua volta, mas parece que estás dentro do teu próprio filme. O efeito prolongou-se durante alguns dias, mas revela que “passado um tempo, há sempre um momento menos bom”, que descreve como ”uma pequena depressão”. “Não entras num buraco negro de tristeza, nem te queres matar, ficas só um bocadinho em baixo”. Também experimentou speed, que o deixou “mais ativo”. 

Relato semelhante faz-nos António [nome fictício], um ano mais velho. “Começou num grupo de amigos que quiseram experimentar e usufruir da experiência de MDMA”, assume. Também conhecida por ecstasy, foi descoberta em 1914 pela farmacêutica Merck, como medicamento para diminuir o apetite, mas nunca chegou a ser comercializada. “Não era algo regular, só esporádico”, prossegue, acrescentando que cada toma equivalia a um comprimido que “custava 10 euros”. No caso de “MDMA 0.5/1 grama” já passava para o dobro: 20 euros. 

As (nefastas) consequências

Para além de poder resultar em dependência, com consequências nefastas em vários quadrantes da vida pessoal e profissional, “os danos psicológicos e físicos podem variar dependendo de vários fatores como o tipo de droga (o seu modo de ação no cérebro, os seus efeitos físicos e psicológicos, o potencial de dependência e a legalidade), a quantidade consumida, a frequência de uso e suscetibilidade de quem a consome (os fatores genéticos e os fatores de stress ambiental têm um papel central)”, frisa a psiquiatra.

“No geral, podem causar alterações significativas no sistema nervoso central e estão associadas a sintomas psiquiátricos graves, incluindo a euforia, aumento de energia, insónia, delírios e alucinações. Além disso, pode resultar em danos no fígado, coração e pulmões”, ressalva, alertando ainda para substâncias extremamente potentes como o fentanil que “podem causar depressão respiratória e morte, mesmo em doses muito pequenas”.

Embora tenha conseguido travar o consumo sem recorrer a qualquer tratamento, a verdade é que António não deixou de sofrer as consequências. “Senti ressaca com MD. Depois de ter chegado à cama comecei a ter suores frios, o corpo super quente, muito nervoso e ansioso com algo que não existia, no fundo. Muito agitado, muitas voltas na cama”, recorda, garantindo que nunca mais voltou a usar, nem tenciona fazê-lo.

José não sentiu ressaca, apenas ficou como quando bebe “um bocado”. Nunca sentiu dependência. Explica que “provavelmente teria de usar mais vezes para ter”. Tal como António, não pretende continuar a usar: “não quero porque é droga”.

No entanto, nem todos podem dizer o mesmo. Quando existe adição, é necessária uma abordagem multidisciplinar. O primeiro passo diz respeito “à avaliação por um médico psiquiatra para perceber se existe abuso ou dependência, se o consumo é primário (de modo recreativo com os amigos, por exemplo) ou secundário (se surge para colmatar um sintoma psiquiátrico não tratado, uma insónia por exemplo), perceber que fatores de risco existem (há familiares com dependência desta ou outras substâncias? A pessoa vive isolada ou tem apoio?), entre outros que vão determinar a melhor abordagem”, destaca Maria Moreno.