Foram aprovadas medidas nas plataformas digitais com a inclusão do regime de plataforma electrónica (TVDE) na presunção de laboralidade, a clarificação dos direitos dos trabalhadores das plataformas e intervenção da Autoridade das Condições do Trabalho nos créditos laborais, acabou a possibilidade de o trabalhador abdicar de direitos no final do seu contrato, o que acontecia por pressão da entidade empregadora, e contemplado o direito a pagamento de despesas em teletrabalho, medidas por iniciativa do Bloco de Esquerda.
A agenda para o trabalho digno representa “uma importante alteração à lei laboral, uma legislação que marca a legislatura”, Mara Lagriminha deputada do PS, admite ter “havido um amplo processo de discussão e de diálogo”.
“Este foi sempre um processo aberto em que se procurou envolver todos os partidos, mas também os parceiros sociais”.
O mesmo não entende Lina Lopes, deputada dos democratas sociais, “lamenta” que o Diploma sobre Trabalho Digno não tenha sido discutido em sede de Concertação Social, o que “contraria frontalmente tudo o que tem sido feito na área da Legislação Laboral”. Tal como aconteceu com o teletrabalho, o facto de a lei do Trabalho Digno contornar a Concertação Social e, ser aprovada com os votos de um único partido, o partido do Governo, gera “mau estar e desconfiança”. Chama este ato de “insensibilidade democrática e desrespeito pelas instituições”.
Toda a agenda do trabalho “foi ferida” pelo facto de não terem sido ouvidas todas as partes interessadas, admite Rita Matias, deputada do Chega. “É fundamental ouvir os trabalhadores, mas também as entidades empregadoras, só assim se consegue chegar a propostas que efetivamente sirvam ambas as partes de forma equilibrada”.
Mara Lagriminha elenca o contrato individual de trabalho e o contrato coletivo de trabalho, que devem fixar na celebração do acordo para prestação de teletrabalho o valor da compensação devida ao trabalhador pelas despesas adicionais. “Se não existir esse acordo entre as partes sobre um valor fixo, consideram-se despesas adicionais as correspondentes à aquisição de bens e ou serviços de que o trabalhador não dispunha antes, assim como as determinadas por comparação com as despesas homólogas do trabalhador no último mês de trabalho em regime presencial”. Esta compensação é considerada para efeitos fiscais, custo para o empregador e não rendimento do trabalhador, tornando-se numa garantia muito relevante para impedir que o trabalhador seja onerado por prestar trabalho neste regime.
O dirigente do PCP Alfredo Maia faz uma “avaliação negativa” deste processo. Considera que “a maioria PS apoiada pelo PSD” não quis revogar as normas gravosas do Código do Trabalho, como são os casos da caducidade dos contatos coletivos de trabalho e a chamada presunção da aceitação do despedimento, “mesmo que ilegal, mediante a aceitação do pagamento da indemnização, entre outras”. Por outro lado, justifica, o PS “rejeitou liminarmente as propostas do PCP” com vista à redução generalizada da jornada de trabalho para as 35 horas semanais e sete horas diárias, à restrição ao recurso ao trabalho por turnos e à laboração contínua. O PS “barrou a reposição das compensações pela prestação de trabalho suplementar ou pela cessação do contrato”, segundo o dirigente comunista. “Tão-pouco acompanhou” o PCP na proposta de reposição do princípio do tratamento mais favorável para o trabalhador.
Ainda assim foram dados passos dados “na direção certa, mas demasiado tímidos”, segundo o Livre. Conjugados com outros passos dados na direção errada, a Agenda do trabalho Digno ficou “aquém daquilo que podia ter sido”.
Inês Sousa Real, PAN, alinha com o Livre e diz que apesar de ter havido “alguns avanços importantes, ficou bastante aquém dos avanços que deviam ter sido operados”. A aprovação das faltas por luto gestacional foi, para a deputada do PAN, “um passo importante e uma vitória.”
Para o Bloco de Esquerda a opção do PS na discussão longa da chamada Agenda do Trabalho digno foi “de manutenção de muitas das normas gravosas que foram sendo implantadas ao Código do Trabalho, ao longo de vários anos”. O processo ficou “muito marcado pela resistência do Governo e do PS em mexer em aspectos fundamentais” como a conservação das regras sobre caducidade e sobre o princípio do tratamento mais favorável; a conservação da legislação existente sobre despedimentos coletivos e por extinção do posto de trabalho, que embarateceram os despedimentos e limitaram a capacidade de os trabalhadores os contestarem. A rejeição de medidas de proteção para trabalhadores por turnos; a rejeição da redução do período normal de trabalho para as 35 horas semanais.
Medidas parentais: aumento do direito ao teletrabalho a trabalhador com filho com deficiência, doença crónica ou doença oncológica
Independentemente da idade, que com ele viva em comunhão de mesa e habitação. Nestes casos, os pais têm direito a exercer a atividade em regime de teletrabalho, quando este seja compatível com a atividade desempenhada e o empregador disponha de recursos e meios para o efeito, uma alteração aprovada por unanimidade.
Isabel Pires, deputada do Bloco de Esquerda ao TejoMag, assume que esta medida não constava da proposta de lei inicialmente apresentada pelo PS. Aliás, “o PS foi o único partido a votar contra esta proposta apresentada pelo PSD e, na fase final do processo de especialidade, alterou o seu sentido de voto de contra para a favor.”
A lei do Teletrabalho diz que quem tem crianças até três anos pode ficar a trabalhar em casa. Este direito é extensível até aos oito anos da criança – exceto para funcionários de empresas até dez trabalhadores –, no caso das famílias monoparentais. Mas Lina Lopes recorda que o direito ao teletrabalho contempla mãe ou pai. A lei do teletrabalho aprovada em 2022 diz que qualquer trabalhador tem direito a realizar teletrabalho, caso exista acordo entre a entidade empregadora e o trabalhador.
Apesar do alargamento do direito ao teletrabalho a trabalhadores com filhos com deficiência, doença crónica ou oncológica, fica por implementar a medida para mães que estejam em casa a cuidar dos filhos em idade escolar.
As alterações aprovadas consagram, para os casos de progenitores com filhos com deficiência, doença crónica ou doença oncológica, um regime específico de teletrabalho que não pode ser confundido com a situação geral das crianças na fase da primeira infância.
Para estas, salvo os períodos respeitantes às licenças parentais, o PCP defende a “garantia efectiva dos direitos fundamentais das crianças e dos progenitores”. O PCP quer o direito à frequência gratuita de creches e jardins de infância; para o pai e mãe defende o direito ao trabalho, ao trabalho digno, com horários adequados à articulação entre o trabalho e a vida pessoal e familiar, condição essencial para o desenvolvimento harmonioso e saudável das crianças e das famílias, assim como à plena realização, nomeadamente das mulheres.
Ao criar um regime promotor do teletrabalho das “mães que estejam em casa a cuidar dos filhos na primeira infância”, significaria “perpetuar e mesmo agravar a discriminação da mulher, intensificando a sua exploração com o acumular injusto de tarefas que infelizmente ainda se têm como intrínsecas à condição de mãe, mãe-cuidadora, dona-de-casa e trabalhadora por conta de outrem”. Não é este modelo que defendem.
Inês Sousa Real entende que o teletrabalho “deveria ser uma opção”, e não apenas até aos 3 anos de idade.
O Livre diz mais: de acordo com a lei, o teletrabalho “não pode ser recusado” a quem tenha crianças com idade até aos 3 anos e no caso de uma família monoparental este direito é alargado até aos 8 anos da(s) criança(s).
Quando há duas figuras parentais e ambas com funções que possam ser desempenhadas à distância, o período em teletrabalho pode ser repartido.
Em matéria de teletrabalho e família, espera-se a isenção fiscal dos gastos com teletrabalho.
Sobre as despesas do teletrabalho o Governo ficou de emitir uma portaria onde define os montantes de isenção da tributação da compensação para os gastos em teletrabalho.
À partida estarão incluídas despesas com a com energia, água, telecomunicações ou aquisição de equipamentos, mas deve ser visto caso a caso, pois cada emprego tem as suas próprias especificidades. Rita Matias do Chega aguarda para “ver qual será a prática relativamente a esta matéria e o que decidirão os tribunais”.
Os Cuidadores Informais com direito a trabalhar em tempo parcial
As alterações propostas preveem que os Cuidadores Informais passem a ter uma licença de cinco dias e o direito a 15 dias de faltas justificadas. Além disso, os cuidadores informais passam a ter direito a teletrabalho, horário flexível ou tempo parcial e passam a estar abrangidos pela proteção “contra o despedimento e discriminação de que tantas vezes são alvo pela sua circunstância”, esclarece a deputada socialista.
A maioria dos Cuidadores Informais são mulheres, maioritariamente familiares da pessoa de quem cuidam (nomeadamente esposas, filhas ou noras), com idades compreendidas entre os 45 e os 55 anos. Para idades superiores compreendidas entre 65 anos ou mais, as cuidadoras são as esposas ou companheiras, e todas elas residem com a pessoa de quem cuidam. Lina Lopes alerta para a situação de os cuidadores apresentarem baixas médicas para poderem cuidar, na maioria dos casos, afastando-se do seu trabalho”.
A deputada social-democrata acredita que ainda se poderia fazer mais “se fosse permitido ao cuidador trabalhar em teletrabalho”, caso fosse acordado entre a entidade empregadora e o trabalhador. Esta medida foi proposta pelo PSD e chumbada pela maioria. Uma medida ainda longe da realidade do mercado de trabalho.
Para o PCP este direito pode contribuir para “não penalizar tanto” os cuidadores informais, mas Alfredo Maia alerta para o “necessário desenvolvimento de ações de políticas públicas de informação dos cuidadores sobre estes direitos e, sobretudo, de promoção das garantias de que não serão prejudicados nos empregos se recorrerem a esta medida”.
O Estatuto do Cuidador Informal (Lei n.º 100/2019, de 6 de setembro), entrou em vigor no dia 6 de setembro de 2019 quando o Governo tinha 4 meses, o Bloco de Esquerda critica a demora “para identificar as medidas laborais necessárias à compatibilização entre a manutenção do emprego e a prestação de cuidados informais, desde a data passaram-se quase 4 anos”, lembra Isabel Pires do BE.
As alterações propostas ao Código do Trabalho nesta matéria “são relevantes”, mas a licença de 5 dias fica “muito aquém da expectativa criada” com o Estatuto dos Cuidadores Informais, bem como “não foram consagradas medidas que salvaguardam a carreira contributiva dos cuidadores informais”.
Estas medidas têm uma “condição prévia” para a sua aplicação que é “o reconhecimento do Estatuto do Cuidador Informal que continua a estar dependente de um conjunto de requisitos limitativos”, como é o caso do reconhecimento da dependência, que tem várias restrições injustificadas, ou do critério da morada fiscal e do laço biológico.
O Chega considera que o direito ao descanso também “tem de ser” assegurado.
Dos 8.122 cuidadores informais reconhecidos pelo Estado, até 31 de março do ano passado, de acordo com os dados do Governo, apenas 181 tiveram direito a descanso.
Mais de 150 medidas e alterações à lei do trabalho seguem para sede de especialidade.