Neste podcast Estado com Arte fui ao Mercado P´la Arte, um estacionamento transformado em galeria de arte, onde conversei com Teresa Canto Noronha, jornalista e artista autodidata.
Nesta galeria improvisada, cedida pelo empreendimento imobiliário Prata Riverside Village, os artistas podem trazer o que quiserem, têm um espaço cedido gratuitamente, são mais de 40 artistas no mesmo espaço com entrada livre.
Acontece todos os primeiros sábados de cada mês, participam pessoas que expõem há muitos anos e artistas que expõem pela primeira vez. Um ambiente muito variado de artistas que torna o Mercado P´la Arte apelativo para quem expõe: há uma relação direta com o público, podem partilhar ideias sobre as obras de arte.
A jornalista e artista plástica desta vez trouxe peças de 2017 a 2021, desenhos em papel com tinta-da-china, algumas já estiveram patentes numa exposição individual no palácio da Bolsa no Porto, que se chamava a falácia da perfeição. Uma abordagem à “ideia que temos sobre o que é a perfeição”.
Estes desenhos são ilusões de perfeição simétrica. Parecem simétricos, mas na verdade não são, estão cheios de erros propositados. “Como na vida?”, pergunto. É um pouco essa ideia: “vivemos obcecados com a perfeição, não existe e não é aquilo que nós pensamos que pode ser.”
Trouxe desenhos de estudo para uma exposição e uma fase de desenhos que veio depois “quase não tem cor, é uma fase de preto e branco, mais orgânica”.
“É muito interessante conhecer outros artistas e ter uma relação com o cliente, falar diretamente com quem vê o nosso trabalho. Perceber o que pensam e sentem.”
Beatriz Horta Correia e Susana Prudêncio, organizadoras do Mercado P’la Arte, na última edição./ MARTA ROQUE
Não cresceu no meio artístico, mas viveu num ambiente familiar ligado à literatura, talvez aí tenha recebido alguma influência através do avô materno que era pintor, vivia em Angola e que pouco conheceu.
Nunca achou que fosse uma área que pudesse explorar, até porque estudou engenharia e enveredou pelo jornalismo. “Não sabia que tinha isso em mim.”
Em 2001 foi viver para Bruxelas, onde esteve como correspondente da RTP, e teve o seu primeiro apartamento, “Queria pôr nas paredes o que eu quisesse”.
Procurou obras de arte para decorar as paredes, mas a dada altura começou a comprar tecidos e telas para criar instalações em casa. Os amigos iam ajudando a criar as suas obras de arte.
Via muita arte em Bruxelas e isso terá sido importante para soltar-se e enverdar pela criação artística.
Quando esteve 4 anos como correspondente da Sic, em Roma “produzia, mas não mostrava a ninguém, por vergonha.” Nunca chegou a expor os seus trabalhos, enquanto esteve a trabalhar fora.
É quando volta para Portugal que começa a fazer miniaturas de esculturas. Um dos seus trabalhos escultóricos explora a temática da comunicação, que embora seja a base do seu trabalho, tanto jornalístico como na arte, são comunicações completamente diferentes: o jornalismo comunica factos, realidades, denuncia, e a arte comunica emoções ideias, conceitos.
Assume que precisa também da arte “para se sentir mais completa”. A sua forma de expressão artística é “muito conceptual”. Nem sempre é fácil de compreender, o que dificulta a comunicação, mas por outro lado gosta que “as pessoas tenham de refletir um pouco mais”.
Valentim Quaresma, joalheiro, um dos organizadores do Mercado P’la Arte./ MARTA ROQUE.
“Gosto que as pessoas olhem para o meu trabalho, que pensem que o estão a perceber, e que depois percebam que a primeira impressão não é a óbvia. Há sempre qualquer coisa de conceptual por detrás do meu trabalho.”
“Como não sou de belas-artes, sou autodidata, se calhar não havia espaço para mim”, diz a jornalista e artista. Mas aos poucos tem dado a conhecer o seu trabalho. Está agora a trabalhar tapeçaria de bordar no ponto de arroiolos, porque, no seu entender, “existe um novo espaço” para a arte têxtil. São desenhos para tapeçaria como se fosse papel, só que em bordado.
O trabalho tem por base um estudo de desenhos de arquitetura sobre os anos 40, 50 e 60 do século XX, anos que considera “muito interessantes do ponto de vista arquitectónico, de design, e das artes”. Um trabalho em que está a recuperar técnicas antigas do bordado português, para tapeçaria de bordado. Mas admite que tem como matéria preferida a madeira, em que faz todo o trabalho de produção do material, utilizando as técnicas de marcenaria e de carpintaria. Também gosta de trabalhar materiais orgânicos e recicláveis como a lã.
Para o próximo ano está a pensar fazer uma exposição individual com os novos trabalhos de tapeçaria e alguns da sua coletânea.