Turismo Lento, uma nova forma de viajar

Numa altura em que o turismo em Portugal supera os números registados antes da pandemia, com o ano de 2022 a chegar aos 37,8 mil milhões de euros e com Lisboa a registar no verão passado mais de 3,5 milhões de dormidas, o Slow Tourism tem ganho cada vez mais adeptos. Por oposição aos destinos turísticos de massas, esta abordagem surge como uma lufada de ar fresco no setor.

Ao contrário das viagens convencionais, em que o foco está em visitar o maior número possível de atrações num curto espaço de tempo, este tipo de turismo incentiva os viajantes a desacelerar, apreciarem cada momento e mergulhar na experiência local de forma mais profunda e significativa.

O conceito de Slow surgiu inicialmente com o movimento Slow Food, na década de 1980, em Itália. Carlo Petrini foi um dos principais rostos de um protesto contra a abertura de um McDonald’s em Roma.

A filosofia Slow

Valorizar a qualidade sobre a quantidade, promover a sustentabilidade e a preservação cultural e permitir uma ligação mais autêntica com as pessoas e os lugares visitados, são as bases deste movimento. 

Deve também existir “equilíbrio entre o rápido e o devagar” e apela a que sejam os “humanos que estejam no centro de intervenção”, começa por explicar Sofia Pereira, presidente da Slow Movement Portugal, uma associação que nasceu em 2009 e que tem como objetivo dar a conhecer esta forma de estar, e não apenas numa vertente. Começando pela nossa vida, passando pelo trabalho e também no turismo.

Apesar de uma das principais características do Slow Tourism ser a desaceleração do ritmo de viagem, “não pressupõe que tenhamos de viver tudo a passo de caracol ou de ir viver para a montanha”, acrescenta.  

“Queremos colocar as pessoas a pôr a mão na massa”

Esta é precisamente a proposta da Farm Experiences, uma plataforma de reservas e promoção de atividades de lazer, ligadas ao setor do turismo agrícola e gastronómico em Portugal. O fundador, Estêvão Anacleto, explica que tudo começou quando se apercebeu de uma “grande lacuna em termos de mercado”. 

Destaca que “muitos turistas queriam fazer coisas diferenciadoras e ligadas à natureza, à agricultura, fora daquele agroturismo a que estamos habituados. Nós queremos colocar as pessoas a meter a mão na massa”. Também Estêvão arregaçou as mangas e, juntamente com quatro agricultores, criou uma plataforma.

Para além das várias experiências à disposição, o intuito deste projeto é também o de “promover aquilo que é feito em Portugal a nível de sustentabilidade das quintas, em termos ambientais, mas também em termos sociais e económicos”. A título de exemplo, bem perto de Lisboa, é possível encontrar experiências com abelhas, passeios a cavalo numa vinha e até farm-to-table.

Por norma, cada uma tem a duração de três a quatro horas. “Queremos sempre que o produtor seja o anfitrião e que conduza a experiência. Além de um tour pela quinta, mostra como se faz, como se produz. Depois há uma experiência de colheita e, caso haja condições para tal, termina com uma degustação ou um almoço”.

A pandemia como ponto de partida

Foi em plena pandemia que nasceu a Slow Portugal. “Eu e a minha mulher vivíamos e trabalhávamos em Lisboa e essa foi uma altura de reflexão; fez-nos pensar no que queríamos para a nossa vida”, começa por recordar Luís Duarte, um dos fundadores. Esse sentimento ganhou ainda mais força quando foram pais. “Fez-nos repensar ainda mais as nossas prioridades”.

A carreira em hotelaria da companheira foi uma preciosa ajuda para a dupla perceber o que não queria para o seu negócio: “o turismo rápido, o hotel de cidade”, salienta. O objetivo era, sim, trazer as pessoas para a calma, para “algo que possam desfrutar na sua plenitude”. Mas o intuito principal passa por algo que parece ser tão simples… mas por vezes tão difícil: parar. “Queremos que pare, que fuja da cidade, da rotina”. O desejo é que este período longe da azáfama do dia a dia sirva para assentar ideias e limpar a mente.

Foi no Alentejo, para onde se mudaram, que estabeleceram os primeiros contactos em termos de parcerias. Confessos apaixonados por viajar, por vinhos e pela gastronomia, decidiram então criar três experiências distintas com base nestes pressupostos. A plataforma só foi lançada oficialmente quando atingiram o número mínimo de experiências que tinham delineado: 80. Atualmente são 92.

À Mesa com vagar” tratar-se de “sentar e desfrutar de um menu regional ou de degustação”. Inclui-se neste leque o que chama de “processo de A a Z”. Ou seja, acordar de manhã e ir apanhar aquilo que depois irá confecionar na cozinha e, posteriormente, degustar. Em Sintra poderá desfrutar de uma destas experiências premium.

Dormir com tempo” é uma alusão ao lento. “São todos alojamentos fora dos grandes centros, bem isolados”. A aldeia da Pedralva, no Algarve, que Luís destaca como “um dos produtos mais interessantes” do leque, foi construída e recuperada neste sentido do slow village.

Beber com calma” tem um duplo sentido que se traduz também em beber com moderação. “Maioritariamente, este tipo de experiência trata-se de provas de vinhos”. Para aqueles que não dispensam mais emoção, existe a possibilidade de “estar na vinha e pisar o vinho” ou então “fazer um passeio a cavalo numa vinha”. Na região de Lisboa e Vale do Tejo, é possível fazer um passeio rural num carro clássico que termina precisamente com uma visita a uma adega e respetiva degustação.

O cliente

Ainda que no horizonte da empresa – criada há cerca de seis anos – estivesse um projeto virado para os portugueses, rapidamente ficou evidente que os clientes nacionais seriam muito poucos. Na Farm Experiences, “95% dos clientes são estrangeiros”. Estêvão aponta como principal razão o facto de os portugueses terem “algum tipo de contacto com o campo” e, como tal, “não estão dispostos a pagar para trabalhar numa quinta”.

Em sentido inverso, a Slow Portugal opta – por agora – por ter apenas clientes portugueses. Apesar de perceber que é “mais acessível a bolsas estrangeiras”, Luís assume que querem primeiro estabelecer-se a nível nacional.

Com um repertório com mais de 100 experiências, Estêvão aponta que “as mais vendidas são aquelas com os temas mais sexy da agricultura”. Estamos, portanto, a falar de tudo o que envolve “vinhos, azeite e cortiça”. No entanto, sublinha que há muito mais por descobrir. Exemplo disso mesmo é a crescente procura de experiências com “pastores e queijo”, exemplifica.

O sucesso tem sido tal que já está a ser pensada “uma expansão Internacional”, com Espanha, Itália, França como países eleitos para uma “farm experience a nível europeu e, quem sabe, global”, assinala.

No caso da Slow Portugal, é nas épocas festivas, como o Natal ou no Dia da Mãe, que se verifica maior procura. “Oferecem-se muitas provas de vinho, porque é uma prenda fácil, diferente e que abrange um público vasto”. 

Latest articles

Related articles

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui