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A urgente caminhada apressada vai continuar?

Durante quase uma semana, Lisboa foi palco da Jornada Mundial da Juventude que reuniu mais de milhão e quinhentos mil (1.500.000) católicos, principalmente jovens, de quase todos os países do mundo (a exceção foi as maldivas (qual será a razão?)), sob o lema “Maria, levantou-se e partiu apressadamente” (Lc 1, 39).

O Papa Francisco abordou esta passagem bíblica durante a vigília realizada no sábado dizendo que Maria quando soube da gravidez da sua prima Santa Isabel levantou-se e saiu apressadamente para ir ter com ela, mesmo estando também ela grávida, numa condição que requeria mais cuidados e precauções de saúde, mas foi por amor. O Santo Padre abordou esse amor com base na alegria. Os Papas são sempre pautados pela sua sapiência, sobretudo o Papa Francisco, mas neste discurso não foi totalmente explícito sobre o significado deste ato de amor e sobre a importância da alegria, pelo menos para os mais incautos. Foi um ato de amor pela alegria do convívio ou pela alegria do desejo de ajudar o outro? Ajudar, não no limite da desgraça, mas na soma e na evolução das qualidades.

Num mundo, onde muitas pessoas têm tantas e tão variadas coisas materiais e imateriais e estão rodeados de família e amigos, existe simultaneamente uma carência enorme de abraços e beijos. Abraçar e beijar não é em muitos casos dar amor, é somente suprimir carências de afeto. Amor é muito mais. É estar lá, já antes do outro estar carente. É estar lá, mesmo à distância para evitar que o outro se perca, que outro se desvie do melhor caminho. É estar lá, para com o outro nos elevarmos na consciência e na dignidade de ambos.

O Papa Francisco foi, durante a Jornada, assertivo em todas as suas ações, em todos os seus discursos, lidando de forma estoica com as condições físicas que os seus 86 anos de idade lhe impõem e deixando a impressão de um homem só ou pouco acompanhado e pouco interpretado pelas cúpulas eclesiásticas, incluindo a portuguesa (existisse um milhar de párocos de firmeza oratória semelhante em Portugal e não tínhamos tanta igreja e capela fechada ou dessacralizada como temos). No entanto, ouviu-se como de costume muito perdão, muita caridade, muita misericórdia, e tão pouca antecipação, tão pouca preparação, tão pouca antevisão, tão pouca prevenção, tão pouca precaução, pois é isso que é estar em vigília, étimo hoje tão ligado somente à meditação conjunta.

Não obstante, a Jornada Mundial da Juventude trouxe à sociedade as incoerências, as negações das desgraças, as confrontações sempre pavorosas para os conservadores atávicos com a necessidade urgente de uma caminhada apressada para as reformas eclesiásticas necessárias. E trouxe sobretudo esperança, esse elemento intangível inexplicável pela ciência que une todas as religiões. A esperança, melhor dizendo a fé numa humanidade e num mundo melhor. Ora, se os mais novos, que são o futuro têm fé, por que razão os mais antigos não sentirão a sua fé reforçada.

A Jornada teve uma escala humana de dimensão extraordinária, não fosse Portugal um país em que 90 % da população é católica, que foi fundado e cresceu enquanto reino e Estado numa égide de reino com religião e credo oficiais cristão e católico, respetivamente, e que no meado dos seus mais de 800 anos de existência, viveu três séculos de prática religiosa obrigatória e exclusivamente católica, (demonstrando o que de pior a Igreja Católica e o Catolicismo tem, ou seja, as fações ultra conservadoras que não toleram os que pensam e sentem de forma diferente). Tais circunstâncias levam a que o catolicismo quase seja um elemento identificador da nacionalidade portuguesa (enquanto identidade cultural), situação ainda a corroborar ou a refutar pelos historiadores, principalmente, os medievalistas.

O certo é que Lisboa foi uma cidade repleta de jovens sadios vindos de todas as latitudes e longitudes, mostrando a mundividência do catolicismo. Foi interessantíssimo perceber como as igrejas da cidade estavam praticamente todas abertas e cheias de crentes, quando muitas delas passam a maioria dos dias fechadas, mesmo aquando de domingos ou dias de comemoração católica.

A cidade tinha as limitações normais, antecipadas, anunciadas e ajustadas a um acontecimento desta natureza. O Santo Padre recebeu os “banhos” de multidão a que está acostumado receber por onde passa. De resto, esta Jornada Mundial da Juventude não se insere nas cinco jornadas com mais peregrinos ou participantes.

Os católicos nacionais comuns de maior idade ligaram e praticaram pouco ou nada da mensagem de Cristo ou papal e aprontaram-se a querer ver em carne e osso, um humano fisiologicamente igual a todos nós, achando que a sua presença trazia benefícios medicinais e espirituais (estes últimos talvez), esquecendo que Cristo e Deus não estão no Papa, estão entre nós.

Os cidadãos menos crentes e residentes na Área Metropolitana de Lisboa foram, como de costume, mais egoístas que os verdadeiros agnósticos e ateus. E queixaram-se da falta de transportes coletivos, da dificuldade de acessos, isto quando alguns até tiveram direito a tolerância de ponto em dois dias da semana. Andam um pouco afastados de Cristo e de Deus e muito carentes (em alguns casos) mas têm fé em reencontrar o caminho da felicidade. Em suma, a cidade teve os problemas de mobilidade pouco ou nada diferentes do habitual. Claro que há problemas, claro que têm de ser resolvidos, mas não culpemos a Jornada Mundial da Juventude por problemas que não foram exponenciados por esta experiência.

A comunicação social televisiva (principalmente) foi pródiga no sensacionalismo e na incoerência moral (seja lá isso o que for). A mesma comunicação social que de forma sensacionalista defende as minorias, voltou a não vestir o fato do laicismo que o nosso país adquiriu a 5 de outubro de 1910 e nunca ou muito raramente o tirou do armário. O mesmo é dizer que não se preocupou com as minorias religiosas e passou a semana a divinizar o que já se proclama divino. Termos subjetivos e elogiosos como fantástico, belo, magnânimo e perfeito (que não é subjetivo, mas é muito mais elogioso do que acertadamente objetivo) foram uma constante. A contrapor este êxtase, mantiveram o sensacionalismo aproveitando cada pequeno incidente, alguns trágicos é certo, como um prenúncio do cataclismo. Desde uma peregrina de 62 anos que faleceu, a um jovem que ficou gravemente ferido ao mergulhar e banhar-se no rio Tejo, passando por uma jovem peregrina que foi atropelada com a fuga imediata do condutor ou a já corriqueira mostra das imagens caóticas nas estações do metro e das paragens de autocarro. Recordemos que a Jornada trouxe à cidade 1.500.000 pessoas. Existem países desenvolvidos que não têm esta população e onde todos os dias acontecem acidentes.

O retorno financeiro para os agentes comerciais da cidade foi na esmagadora maioria, uma quebra de receitas.

Mas voltemos às questões religiosas e ao lema da Jornada. Durante esta Jornada Mundial da Juventude houve de tudo. A Igreja Católica mostrou a muitos dos seus crentes, mesmo aos não facciosos, que o catolicismo é apenas mais um credo, mais uma forma de ver o mundo e a humanidade, e não a melhor forma de ver o mundo e que a prioridade não é a conversão, é a convivência com o diferente. Para tal integrou na Jornada um evento organizado pela Universidade de Lisboa que consistiu em plantar árvores no Jardim Botânico Tropical. Cada árvore foi plantada por um jovem de credo e religião diferentes. Nesta iniciativa estiveram jovens islâmicos, judeus e hindus, pelo menos, mostrando a multireligiosidade a que os lisboetas tantas vezes apregoam (talvez abusivamente) de multiculturalidade. A mensagem foi de paz, de fraternidade, de respeito, de convivência, mas também de ecologia, como desde há umas décadas se diz. Foi neste último capítulo que os jovens católicos, muitos deles provavelmente ativistas climáticos, reprovaram claramente ao deixar o Parque Tejo no fim da eucaristia dominical e última cerimónia com presença papal, substancialmente sujo e poluído com restos de lixo. Muito há ainda a fazer para os jovens perceberem o que é a responsabilidade e perceberem que ser adulto exige maturidade e que ser melhor é ser coerente. Eu bem sei que é difícil. Eu próprio também pertenço a essa geração que no caso ocidental são os filhos da geração baby boom, e também eu, fui mimado pelos meus avós a ponto de quando partia uma jarra, as minhas avós quase dizerem que a culpa era da jarra. Mas temos de ser algo mais do que meninos e meninas bonitas que temos direito a gritar, exigir e protestar. Temos de ser os agentes da mudança, como Jesus Cristo foi e alude os outros a serem. Como disse o Papa Francisco na despedida (talvez de forma um pouco perigosa no campo interpretativo), não estamos cá para ser servidos, estamos para servir (eu acrescentaria desde que dignamente e desde que sejamos respeitados).

Também na zona de Belém, mais concretamente no Parque Vasco da Gama estava o Parque do Perdão com inúmeros confessionários construídos por reclusos que merecem como todos os outros ser perdoados pelos pecados cometidos. Foi nesta zona que um conjunto de jovens ao fazerem o apelo a esta situação, foram interpelados e ofendidos por outros jovens católicos que acham que os criminosos não têm direito a perdão, nem ajuda. Antes, devem agonizar na sua mágoa e ficar perdidos na sua incompreensão. Tal ato, veio mostrar que ainda se formam católicos, sobretudo portugueses, no princípio de que existem pessoas de primeira e pessoas de segunda classes e só os de primeira classe merecem perdão. São jovens que vivem na anacronia dos tempos, pois até já o direito civil estabeleceu o fim das classes (sociais) na Europa com as revoluções liberais no final do século XVIII e no início do século XIX.

Outra das incoerências da fé deu-se ainda antes da Jornada Mundial da Juventude ter chegado a Lisboa. Uma semana antes da Jornada, a Católica Lisbon Business and Economics e a Católica Porto Business School, divulgavam nas suas redes sociais digitais a apresentação de uma formação que dá pelo nome de Programa Executivo de Gestão do Luxo. Ora, o Papa Francisco, logo no seu segundo dia da presença em Lisboa visitou e deu uma palestra na Universidade Católica em Lisboa e no terceiro dia visitou o bairro da Serafina para ver as condições de pobreza em que alguns lisboetas ainda vivem. Como se pode combater a pobreza, gerindo o luxo? E deve ser uma instituição de ensino universitário gerida pelos católicos a ensinar como se gere esse excedente ostentativo, a que chamamos luxo?

Por falar em luxo, lembro-me logo do pecado mortal da luxúria. Eu bem sei que as palavras não são sinónimas, embora estranhamente luxúria partilhe a origem do étimo latino com luxo e não com a sinónima lascívia. Melhor dizendo, não podiam faltar os assuntos sexuais, tão temerosos, tão imundos e tão promíscuos que devem ficar fechados no íntimo de cada um e só devem ser colocados em prática aquando da necessidade de procriação humana, ignorando tais estímulos enquanto necessidade biológica, como esses terríveis cientistas por esse mundo fora mostram e explicam. Alguém sabe ao certo o que Jesus Cristo disse, pensou ou agiu sobre a atividade sexual? Nem sequer sabemos, como certos teólogos como Santo Agostinho, que até aos 33 anos teve uma vida sexual provavelmente muito mais ativa e variada que muitos de nós, reescreveram partes do evangelho para a doutrina ser o que é. O que sabemos é que houve uma missa realizada para a comunidade LGBT que foi invadida e interrompida por um grupo de jovens católicos fanáticos. O que sabemos é que um grupo de transsexuais e transgéneros foi ofendido por um grupo de participantes na Jornada Mundial da Juventude. O que sabemos é que a Igreja Católica Portuguesa continua a ter muita dificuldade em assumir o escândalo da pedofilia, tirando honrosas exceções como o bispo emérito das Forças Armadas e segurança D. Januário Torgal Mendes Ferreira. O que sabemos é que o Papa Francisco já percebeu que a Igreja Católica e os católicos têm de se levantar (como o espetáculo da vigília de sábado incitou nos céus de Lisboa) e caminhar apressadamente, ainda que não ansiosamente, como diz, e reformar toda esta mentalidade arcaica (não confundir com tradicionalismo) que ainda nos rodeia.

E eu, se me permitem, acho que a esperança está no Papa, nas pessoas, mas não no clero português com todo o respeito pelos seus representantes. E eu tenho a certeza de que sou católico e que quero continuar a ser católico, não para ler as mnemónicas orações libertadoras espiritualmente para muitos, e a viva-voz citadas coletivamente, não só, mas principalmente aos domingos de manhã (com todo o respeito pelos meus concrentes); mas principalmente para colocar em prática (na dimensão humilde que possuo) a mensagem que Jesus Cristo deixou há dois milénios atrás.

“Nós éramos culpados pela nossa deficiência”, disse João, uma das vozes na manifestação contra a JMJ

Uma hora depois do começo da via-sacra, esta sexta-feira, no Parque Eduardo VII, uma centena de jovens concentrou-se em semicírculo no espaço em frente à Capela de Nossa Senhora da Saúde. Do outro lado da rua, no centro da Praça Martim Moniz, no grande palco, eram projetadas imagens do Papa Francisco. Ali vagueavam diversos peregrinos atraídos pelas várias tendas do Parque Cristonautas, um evento que aliou a tecnologia e a fé.

De microfone em riste, remetidos à sombra dessas atividades integradas na programação oficial Jornadas Mundiais da Juventude, os manifestantes da concentração Sem Papas na Língua partilhavam em tom de revolta as suas inquietações e testemunhos pessoais. Histórias sobre a transsexualidade, o racismo, a violência policial e o machismo uniram os presentes que aparentavam ter entre os 18 e 30 anos. Os cartazes que também refletiam essas mensagens: ‘o amor é mais forte que a tradição’, ‘tratem Portugal como se tivesse cá o Papa o ano todo’ e ‘4815 + 40: Quantos mais precisam que sejam abusados?’.

A vida em instituições católicas

Um jovem com paralisia cerebral, de 26 anos, João Peres, misturado entre a multidão desde o início da concentração, com um cartaz em punho, resolveu ir ao microfone. O que o inquietou ultrapassa os temas ali debatidos, por ser um assunto a que a poucos lembra: as pessoas com deficiência que se encontram em instituições de cariz católico.

Tinha 12 anos quando percebeu, mais por motivos “emocionais” do que “racionais”, que a Santa Casa da Misericórdia, instituição que o acolhia durante o dia enquanto a sua mãe estava a trabalhar, lhe denegria a autoestima, usando-o para criar uma imagem de uma igreja que “aparece ao lado dos pobres e oprimidos”. A sua mãe católica, por tradição, compreendeu e respeitou a vontade do filho em querer sair.

João frequentou a Santa Casa desde os seis meses de idade. Lembra-se de ir todos os domingos à missa, de ficar enfadado, de achar que nada daquilo fazia sentido. E principalmente “de ser o boneco, o deficiente que eles queriam que estivesse lá”. “A Igreja dá-me como uma pessoa doente, pecadora. Havia uma imposição de uma maneira de viver. Da religião, da reza, da culpa. Como se nós fossemos pecadores por sermos assim. Fossemos menos pessoas, menos iguais aos outros. Havia uma ideia de que nós éramos culpados pela nossa deficiência. E essa visão está muito enraizada na forma como a sociedade olha para as pessoas com deficiência”.

Atualmente, com um mestrado em física e empregado, João vive a vida com plena autonomia porque a sua deficiência o permite. O que considera uma “sorte”. Colegas que têm deficiências mais limitativas a nível motor, que estão em cadeiras de rodas, que são cegos, mudos “são menosprezadas e tidas como um trofeu de bondade para a Igreja”. Colocados em instituições católicas contra a sua vontade, são presos a camas, é-lhes retirada a liberdade e o direito a dizer não, conta.

Aos olhos de um protestante

Aos que lá se encontravam a pregar contra a Igreja Católica, chegavam outros, curiosos, que acabavam por permanecer até aos discursos acabarem. Duarte, de 24 anos, um dos organizadores das atividades do Parque dos Cristonautas, superou a perplexidade a que se detinham os participantes das Jornadas que observavam o acontecimento da Praça Martim Moniz e atravessou a rua. “Venho na expectativa de ouvir”, disse. “Eu sinto que estas pessoas sofreram e continuam a sofrer de uma forma que é genuína e com a qual eu tenho compaixão”.

Duarte não faz parte da comunidade católica. Apesar da sua participação nas Jornadas Mundiais da Juventude e da sua participação na organização do evento na Praça, identifica-se como cristão protestante que frequenta a Igreja Evangélica Baptista de Oeiras. Criado como católico em Portugal, encontrou a fé na Dinamarca quando foi acolhido como estudante de intercâmbio numa comunidade protestante. “Lá o Evangelho tornou-se real para mim”. São esses escritos que unem tanto católicos como protestantes na irmandade da fé. No entanto, há diferenças taxadoras. Uma delas é o modo com que os fiéis protestantes e os católicos percecionariam aquela manifestação.

Um dos pilares pelo qual Duarte se rege é “nenhum de nós é bom o suficiente para merecer o amor de Deus”. E esse é um sentimento que ali é prevalente, diz. Um católico ao afirmar que o amor de Deus chega a todos sem contrapartida coloca em desigualdade aqueles manifestantes, pois “o que a igreja diz oficialmente e aquilo que os fiéis fazem é diferente”, explica. “Aqui nas jornadas vê-se isso. Pessoas com comportamentos estúpidos para com a comunidade LGBT, mas também tens quem ouça e sofra com eles”.

Cruz queimada e peregrinos provocadores

Antes do pôr do sol, um rapaz vestido com um hábito iniciou uma recitação teatral de passagens da bíblia alertando para a violência perpetuada pela Igreja ao longo dos séculos. À luz de um flare vermelho, falou da colonização e da perseguição às “bruxas” feita pela Inquisição. Dentro do semicírculo, perto da bancada, via-se uma bandeira LGBT com um símbolo anarquista e algumas referências ao marxismo. Os organizadores do protesto não quiseram ser identificados e recusaram-se a prestar declarações, criando um ambiente hostil aos jornalistas.

Ao cair da noite chegaram mais peregrinos ao Parque dos Cristonautas, que progressivamente foram enchendo toda a Praça. No largo em frente às Escadinhas da Saúde, as vestes pretas dos manifestantes acentuavam o propósito do que estava para vir. Ao som de música ‘techno’, os jovens acenderam uma pequena lareira ao centro do semicírculo e começaram a queimar uma cruz. O cenário fazia lembrar uma caça às bruxas.

Tanto pela música como pelo aparato em si, os vários jovens das JMJ foram se aproximando, tal como se sucedeu durante o dia. Em curtas abordagens de toca e foge, os manifestantes anti Jornadas receberam algumas provocações. Um rapaz com cerveja na mão e bandeira de Espanha às costas aproximou-se, apontou o dedo num movimento impulsivo e gritou: “hijos de puta”. Os companheiros, prevendo o pior, agarraram no amigo e dirigiram-no ao outro lado da rua.

Quando os ânimos pareciam calmos, um rapaz pertencente à comunidade LGBT, mais afastado da concentração, é, alegadamente, atirado ao chão por um peregrino. Segundo os presentes, o agressor fugiu sem dar hipótese a identificação. Questionados acerca do incidente, nenhum dos lesados quis prestar esclarecimentos. Tanto quanto foi possível apurar, ninguém viu o que se passou senão os próprios.

Papa esteve no Parque do Perdão a ouvir jovens em confissão

Papa esteve no Parque do Perdão a ouvir jovens em confissão

Muitos fiéis jovens acorreram bem cedo para Belém, ao Parque do Perdão junto do Mosteiro dos Jerónimos, para serem ouvidos em Confissão, um dos sacramentos da Igreja Católica, a que o Papa Francisco deu mais notoriedade ao fazer-se fotografar enquanto ele próprio se confessava, demonstrando que até aos Papas é necessária a absolvição.

Hoje, em Belém, como tem sido hábito em todas as JMJ, o Papa Francisco recebeu alguns jovens nos pequenos confessionários montados por presidiários dos estabelecimentos prisionais de Coimbra, de Paços de Ferreira e do Porto.

As imagens, divulgadas pela organização, demonstram o Papa Francisco a encaminhar-se para um dos confessionários onde recebeu 3 jovens em confissão, sob o olhar atento da sua segurança pessoal.

Jovens na JMJ. Os testemunhos dos que vieram ao Parque Eduardo VII ver o Papa Francisco

Jovens na JMJ. Os testemunhos dos que vieram ao Parque Eduardo VII ver o Papa Francisco

O Padre Osvaldo veio da Venezuela encontrar-se com os jovens e, sobretudo, ouvir as palavras do Papa Francisco e diz que espera de levar das JMJ o desejo de “como Maria, levantar-se e partir, ao encontro dos outros. A fraternidade nunca é em demasia”. Loit veio dos Estados Unidos como um católico desde o nascimento mas que vem para as JMJ para “ver o Papa Francisco, para ver como o catolicismo cresce noutros lugares do mundo e para visitar Lisboa que é um sitio muito bonito e muito acolhedor”.

Belmira Tavares, cabo verdiana, fez uma grande viagem na expectativa de “levar de Lisboa um coração mais aberto para trazer mais alegria para os outros”. Carlos veio de Córdova, no sul de Espanha, para a sua primeira JMJ e espera que ele e outros jovens que o acompanham “levem o amor de Deus para os seus lares” mas pede ao Papa Francisco que “reze muitíssimo pelos jovens”. Sheila veio das Filipinas não só como peregrina mas como voluntária e, apesar de ser a sua terceira JMJ, espera “encontrar Deus de novo e trazê-Lo de volta para o seu País juntamente com desejos de paz e união”. Inês veio da Guatemala e a sua alegria é contagiante; quer que o catolicismo “se expanda cada vez mais” e diz levar de Lisboa “muitas boas memórias”.

Ao longo dos próximos dias vamos estar nas JMJ a recolher mais testemunhos dos participantes jovens com quem nos vamos cruzando.

Papa Francisco alerta aos jovens para os perigos das redes sociais

Papa Francisco alerta aos jovens para os perigos das redes sociais

O primeiro banho de multidão aconteceu hoje no Parque Eduardo VII, temporariamente baptizado “Colina do Encontro”, onde Francisco encontrou uma multidão de jovens de várias nacionalidades gritando “está é a Juventude do Papa”.

Já no palco, Francisco assistiu a diversos momentos musicais e performances artísticas que culminaram com um desfile de bandeiras das nacionalidades dos peregrinos das JMJ.

Num discurso curto o Papa alertou, como tem feito em diversos momentos do seu Pontificado, para os perigos das redes sociais, das “ilusões do mundo virtual”, dos algoritmos e dos “lobos que se escondem por detrás dos sorrisos de falsa bondade”. Francisco, o Papa das periferias, exortou os jovens, que são “alérgicos a falsidades e a palavras vazias”, a criar espaço para todos na Igreja.

O seu discurso terminou com o apelo do Papa a que todos os jovens se conectem com Cristo e que desfrutem das JMJ.

Jornada Mundial da Juventude já tem app para telemóvel

A app, que está disponível tanto para Android como para iOS, tem como objetivo fornecer toda a informação necessária relativa ao evento e ajudar os participantes em termos de orientação e logística.

Além de estar disponível nos cinco idiomas oficiais da Jornada Mundial da Juventude: português, inglês, francês, espanhol e italiano, a maioria dos conteúdos estará disponível offline, tornando-a uma ferramenta útil para os peregrinos.

Entre as funcionalidades, destaca-se a possibilidade de ativar notificações para lembretes e avisos de última hora, bem como o acesso a contactos úteis e de emergência. A aplicação também disponibiliza a programação dos seis dias de JMJ, incluindo uma agenda para os Eventos Centrais, Festival da Juventude, Cidade da Alegria e Encontros Rise Up.

Todas as funcionalidades da app

Através do mapa interativo da app, os utilizadores podem localizar com facilidade os diferentes eventos, recintos e informações sobre a restauração. Além disso, é possível encontrar os restaurantes aderentes à rede de restauração, bem como a localização de bebedouros, casas de banho na cidade, postos de saúde, postos policiais e outros serviços.

A secção “Up2Pray” é dedicada aos conteúdos espirituais da jornada, incluindo as leituras e cânticos de todos os Eventos Centrais, bem como o Hino e a Oração oficial da JMJ.

Outra funcionalidade interessante é o “Calculador da Pegada de Carbono”, que mede o carbono consumido por cada peregrino. Esta ferramenta identifica o impacto na deslocação até Lisboa e apela ao utilizador para adotar comportamentos mais sustentáveis no dia a dia para mitigar as consequências iniciais.

Após o registo na aplicação, os peregrinos, voluntários, clero ou media terão acesso ao perfil de utilizador e poderão consultar informações como o pacote de alimentação escolhido (incluindo o voucher digital), o setor em que estão alocados no Campo da Graça no Parque Tejo, o local do Encontro Rise Up em que irão participar, o calculador da pegada de carbono, o contacto do líder do grupo (se aplicável) e a credencial digital.

A aplicação “Lisboa 2023” pode ser descarregada na Play Store para Android e na App Store para iPhone.

O preço da Fé: os milhões gastos na Jornada Mundial da Juventude

 A Jornada Mundial da Juventude (JMJ) teve início em 1984, durante o pontificado do Papa João Paulo II. A ideia surgiu como uma resposta ao desejo do Sumo Pontífice de estabelecer um encontro regular com os jovens, onde se pudessem reunir num ambiente de oração, reflexão e partilha da fé. Desde então, a JMJ tornou-se num dos maiores eventos religiosos do mundo, contando com a participação de milhões de jovens de vários países. Acontece a cada dois ou três anos e realiza-se num país à escolha do Papa, sendo que, este ano, terá lugar em Lisboa entre 1 e 6 de agosto. 

Com a expectativa de contar com mais de um milhão de pessoas, naquele que é descrito como um dos maiores eventos alguma vez realizados em Portugal, a organização de uma JMJ envolve despesas consideráveis.

Custos

Estão a ser feitos investimentos significativos na construção, reabilitação, adaptação ou melhoria de infraestruturas, nomeadamente de palcos, e áreas de culto. No que toca à logística, o investimento é feito no plano de mobilidade, na segurança, nos serviços de emergência, na comunicação, na acomodação e na alimentação. Já os recursos humanos pressupõem a contratação de uma grande equipa de profissionais necessários para garantir o bom funcionamento do evento, como polícias, meios de socorro, entre outros. Finalmente, somam-se os custos associados à promoção e divulgação de um evento desta magnitude. Destacam-se as despesas com marketing, publicidade e divulgação para atrair participantes quer a nível nacional, como internacional.

O custo total está previsto rondar os 160 milhões euros, metade dos quais dizem respeito a dinheiros públicos. Se este valor já era conhecido, a verdade é que com o aproximar do evento, começam a ser descortinados, com mais ou menos pormenor, a alocação destes milhões.

Lisboa

A Câmara Municipal de Lisboa orçamentou em 35 milhões o valor que tem previsto gastar no evento, tendo detalhado que 21,5 milhões foram destinados para a área do parque urbano do Tejo-Trancão e os restantes 13,5 milhões serão investidos noutros locais da cidade, como o Parque Eduardo VII e o Terreiro do Paço.

É precisamente a cargo da autarquia liderada por Carlos Moedas que está a obra mais cara: a reabilitação do antigo Aterro Sanitário de Beirolas que será o recinto principal da Jornada Mundial da Juventude. Custou 7 milhões e foi adjudicada à empresa Oliveiras, S.A – Engenharia e Construção em concurso público. 

Segue-se o polémico altar-palco, agora com um custo de 2,98 milhões. Porém, este valor foi significativamente revisto em baixa (4,2 milhões) após muitas críticas, inclusive de Marcelo Rebelo de Sousa. A obra foi adjudicada pela SRU – Sociedade de Reabilitação Urbana à Mota-Engil, a empresa que o autarca de Lisboa garante que “fazia mais barato”.

Além disso, o município gastou 6,6 milhões para reforçar os recursos do Regimento de Sapadores Bombeiros, da Proteção Civil e da Polícia Municipal. Exemplo disso mesmo são os dois contratos de ajuste direto celebrados com a CERTOMA e que ascendem a 1,57 milhões. O primeiro, de 1,15 milhões, prende-se com a “aquisição de seis viaturas do tipo varredoura da marca RAVO Iseries”, qualquer coisa como 191 mil euros por viatura. O segundo, de 427 mil euros, diz respeito a uma “viatura de saneamento modelo TGS 18.4304X2 BL CH Euro 6”.

Soma-se, ainda, um contrato de 1,5 milhões com a MEO para a instalação de pontos multimédia e aluguer de equipamentos técnicos no Parque Eduardo VII. É ainda possível constatar um contrato de 39 mil euros com a Naipe D’Agosto para a “aquisição de serviços de soluções de comunicação e promoção – outdoors – para informação alusiva à Jornada Mundial da Juventude”.

Carlos Moedas reitera que “até 25 milhões de euros ficarão na nossa cidade”, explicando que muitas das infraestruturas terão uso para além deste evento. Feitas as contas, assinala um “investimento líquido no evento de 10 milhões de euros”.

 

jmjmartaalmeida2023_3 O preço da Fé: os milhões gastos na Jornada Mundial da Juventude

O polémico altar-palco foi adjudicado por ajuste direto à Mota-Engil, no valor de 2,98 milhões de euros. / MARTA RAÑA

 

Chorudo contrato de assessoria com treinador de futebol

O antigo jornalista da TVI, João Maia Abreu, foi contratado em dezembro de 2022 para coordenar as atividades de comunicação e relação com a imprensa. O contrato, de nove meses, ascende aos 37,5 mil euros, o que se traduz num salário mensal superior a quatro mil euros. Também Tiago Abreu, ex-assessor do CDS-PP na Câmara Municipal de Lisboa, assinou um contratoio na mesma altura e com a mesma duração. Neste caso, assumiu funções como membro da Unidade de Missão do Município de Lisboa. O salário fixa-se nos 2,7 mil euros mensais, totalizando 24,7 mil euros. 

O maior contrato de assessoria foi celebrado com um treinador de futebol. Francisco Guimarães foi designado em agosto de 2021 como assessor da vereadora Laurinda Alves. Menos de um ano depois, em julho de 2022, renunciou ao cargo. Auferia 3,8 mil euros por mês. Se cumprisse os dois anos, teria amealhado mais de 91 mil euros.

Loures

A Câmara Municipal de Loures, sob a liderança de Ricardo Leão, prevê desembolsar dez milhões. O encargo mais significativo, no valor de 4,2 milhões de euros, destina-se aos trabalhos de preparação dos terrenos na zona ribeirinha da Bobadela e foi atribuído à empresa Alves Ribeiro

A autarquia celebrou também um contrato de quase 29 mil euros com a Vista Alegre para a aquisição de 94 peças de cerâmica da escultura “Visitação”, do autor José Pedro. Contas feitas, cada peça, que se crê ser para oferta, representa um custo superior a 308 euros.

Governo

Já o Executivo, após uma previsão que apontava para os 36,5 milhões de euros, decidiu rever em baixa e fixar o orçamento nos 30 milhões. 

Uma vez que a Equipa de Projeto para a JMJ não tem número de identificação fiscal próprio, as compras são feitas através da Secretaria-Geral da Presidência do Conselho de Ministros. Assim, no espaço de quatro meses, foram celebrados 15 contratos no total de 8,93 milhões de euros. 

O mais avultado diz respeito aos 5,9 milhões pagos à Pixel Light para “serviços de fornecimento, montagem e operacionalização de sistemas de áudio e vídeo, iluminação ambiente e respetivo abastecimento de energia” para o Parque Tejo-Trancão.

Em relação às instalações sanitárias, o custo final supera aquele que havia sido anunciado em março: 1,15 milhões. A verdade é que o governo adjudicou um contrato com a Avistacidade de 1,15 milhões de euros para a instalação de “141 blocos modulares” de casas de banho, para o Parque Tejo-Trancão, valor que tinha sido anunciado em concurso público um mês antes. 

Porém, dois dias antes, também em concurso público, foi assinado um contrato com a Vendap para a “aquisição de serviços de fornecimento de equipamentos sanitários autónomos e respetivas manutenções/limpezas” do Parque Tejo-Trancão no valor de 1,28 milhões. No total, são 2,43 milhões de euros investidos em instalações sanitárias.

Mais recentemente, em 29 de junho, foi adjudicado um contrato por ajuste direto para a “aquisição de serviços de gestão de plantas halófitas na margem do rio Trancão” no valor de 111,8 mil euros. Uma rápida pesquisa permite perceber que se trata de plantas cujas raízes estão em contacto com água salgada ou que vivem em solos com grandes quantidades de sal. 

Já nesta segunda-feira, 3 de julho, foi celebrado um contrato por ajuste direto de 22,4 mil euros com a empresa FCiências.ID  para “serviços de monitorização da ação de restauro da vegetação de sapal na frente ribeirinha”. 

 

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No parque Edurado VII encontra-se em construção um outro altar-palco, orçamentado em 450 mil euros, que irá ser suportado pela Diocese de Lisboa. /  MARTA RAÑA

 

Plano de Mobilidade 

A menos de um mês do arranque, ainda não é conhecido o plano de mobilidade e transportes, o que tem originado preocupação e críticas de várias fações políticas. A ministra Adjunta e dos Assuntos Parlamentares, Ana Catarina Mendes, assegurou que será conhecido nos próximos dias e anunciou um reforço de 11%. O que já é certo é que a elaboração deste plano custou 89 mil euros. O contrato, celebrado no final de 2022 e por ajuste direto com a VTM, prevê várias soluções consoante o número de peregrinos que, por agora, é ainda incerto. 

Diocese de Lisboa

Finalmente, a Igreja estima desembolsar um valor em torno dos 80 milhões, conforme avançou o bispo auxiliar de Lisboa, Américo Aguiar. Desses, 30 milhões estão destinados para os milhões de refeições que serão servidas aos peregrinos. Além disso, também o altar-palco – da autoria do arquiteto João Matos, que terá 40 metros de largura e 24 metros de altura, que já começou a ser instalado no Parque Eduardo VII – que tem um custo de 450 mil euros, ficou a cargo desta entidade. 

 

Qual é o retorno? 

No entanto, apesar dos custos envolvidos, a JMJ também traz um alargado leque de benefícios. Desde logo, promove o turismo religioso e cultural, gerando receitas para o setor de hotelaria, restauração e comércio local. Para além dos impactos financeiros, nomeadamente com o milhão de peregrinos que são esperados, um evento desta magnitude tem tudo para catapultar ainda mais a visibilidade do país, estimulando o turismo a longo prazo e promovendo a imagem de Portugal como um destino acolhedor.

Em Novembro, o coordenador nomeado pelo Governo para a JMJ, José Sá Fernandes, assumiu que o retorno deveria rondar os 350 milhões de euros, tendo como exemplo o caso de Madrid.

Um estudo da PwC, com o apoio técnico do Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG) estima que cada peregrino vai gastar, em média, por dia, entre 30 a 36 euros. Já no caso dos peregrinos não inscritos, o valor deverá ficar entre 67 a 81 euros. No final, são apontados ganhos entre 411 a 564 milhões, com um impacto na economia que poderá superar os mil milhões.

Para Carlos Moedas, prognósticos só no fim do jogo. No entanto, o autarca sublinha que se cada um destes peregrinos gastar 40 euros por dia em Portugal, ao longo de sete dias, “estamos a falar de 300 milhões de euros. Estamos a falar não de dezenas, mas sim de centenas de milhões”.