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A torre de cartas ruiu. E agora?

A queda do governo e a perspetiva de eleições antecipadas levaram os partidos políticos a delinear uma estratégia a curto prazo para fazer face à instabilidade que se instalou e à confusão que se adivinha. No Partido Socialista (PS), os dois candidatos, o ministro da Administração Interna, José Luís Carneiro, e o antigo ministro das Infraestruturas, Pedro Nuno Santos , disputam a herança de uma maioria absoluta que, ao que tudo indica, não se repetirá. Na última sondagem realizada pela Aximage para a TVI e CNN Portugal, o PS cai para 26%, longe dos 41,68% que lhe asseguraram a maioria absoluta. Ainda que Carneiro reúna o apoio de figuras relevantes como Augusto Santos Silva, Fernando Medina e Ana Catarina Mendes, Pedro Nuno Santos é o nome mais consensual no aparelho do partido.

Durante a apresentação da candidatura a Secretário-Geral, Pedro Nuno Santos destacou três preocupações centrais: aumentar salários, combater a crise da habitação e valorizar o território. Além disso, afirmou que “o combate à corrupção constitui uma tarefa prioritária do Estado”. Sob o lema “Por todos, Para Todos”, José Luís Carneiro deixa claro que quer “dar continuidade às políticas do Governo liderado por António Costa”, apostando no “compromisso das contas certas”. No plano político, Carneiro surge, frequentemente, associado à possibilidade de um bloco central, enquanto o seu adversário defende a reedição de uma geringonça.

Eleições não são “favas contadas”

No espectro político de centro-direita em Portugal, o Partido Social Democrata (PSD) tem procurado estabelecer-se como uma alternativa equilibrada. No entanto, essa tentativa não tem tido o sucesso esperado. Anteontem, no 41º Congresso do partido, Montenegro dirigiu-se ao país num tom mais otimista, prometendo melhores condições de vida para todas as camadas da sociedade. Segundo o próprio, o país só será capaz de criar riqueza se aproveitar as “sinergias” dos setores público, privado e social. Certo de que o PSD vai ganhar as eleições, garantiu que vai ser “o primeiro ministro que Portugal precisa nos próximos anos”.

Apesar de o PSD já ter apresentado mais de 200 propostas de alteração ao Orçamento do Estado para 2024, há quem considere que o partido não está a fazer o suficiente. Marques Mendes, no seu espaço habitual de comentário, afirmou que o PSD “anda bastante deslumbrado com a ideia de que as eleições são favas contadas”. “É assim que o PSD vê um bocadinho as coisas”, reforçou.

Parece que “cortar o mal pela raiz” não será tão simples como Luís Montenegro previu no dia 9 de novembro, dois dias após a demissão do Primeiro-Ministro. Em entrevista à TSF, Rui Gomes da Silva, ex-ministro-adjunto de Pedro Santana Lopes, alertou que o PSD pode estar à beira de um “desastre eleitoral”.“Eu não quero ser conivente com o partido, com esta situação de pensar que é irreversível termos um líder candidato a primeiro-ministro que todos os dias nas sondagens não aparece como um projeto para Portugal”, afirmou Gomes da Silva.

Com uma diferença de apenas 8 pontos percentuais em relação ao PSD, o CHEGA decidiu moderar o seu discurso até ao dia das eleições. Em entrevista ao Semanário SOL, André Ventura admite a possibilidade de entendimento entre os dois partidos para alcançar a maioria parlamentar. Esta declaração surge apesar de Luís Montenegro ter afirmado anteriormente que só governará se vencer as eleições. “O que eu acredito é que a direita não será tão insensata que permita ao PS governar. Se a direita tiver maioria, quero acreditar que não estamos ainda nesse nível de insanidade”, disse Ventura. Montenegro está ciente que o factor CHEGA foi determinante na constituição da maioria absoluta do PS.

À margem da conferência “A nova economia”, organizada pela CNN, Montenegro afirmou: “Se o PSD não tiver maioria absoluta no Parlamento, o PSD tentará encontrar o reforço da sua posição de maneira a alcançar essa maioria, sendo certo que não se vai coligar nem com o PS, nem com o CHEGA”.

Enfrentando uma forte oposição interna e ocupando o quinto lugar na tabela, a Iniciativa Liberal (IL) decidiu adiar a sua Convenção Nacional, inicialmente prevista para o início de dezembro. O partido optou por concentrar-se nas eleições legislativas antecipadas com o objetivo de “retirar o PS da governação”. Em entrevista à SIC Notícias, o líder do partido, Rui Rocha, esclareceu que a “IL irá a eleições sozinha”.

“A Iniciativa Liberal não fará nenhum tipo de coligação pré-eleitoral”, afirmou. Rocha acredita que seria “contraproducente para o futuro do país” se a IL não concorresse às eleições com “candidatos, ideias e listas próprias”. Acusada de “nepotismo” e “falta de democracia interna”, a IL defende que não beneficiaria de uma coligação. Seis meses após um misterioso almoço que reuniu Rui Rocha e Luís Montenegro, os dois parecem estar de costas voltadas, nomeadamente em relação ao dossier da TAP e à proposta de uma descida mais acentuada do IRS.

Cerco sanitário contra a direita “reacionária”

À esquerda do Partido Socialista (PS), o Bloco de Esquerda (BE) e o Partido Comunista Português (PCP) unem-se nas críticas aos três maiores partidos, em especial ao PSD e ao CHEGA, acusando-os de servir os interesses dos “grupos económicos”. Segundo Paulo Raimundo, Secretário-Geral do PCP, “o PS não só não fez frente às forças reacionárias como, numa visão oportunista e perigosa, em nome de um dito combate retórico, deu-lhes e dá-lhes palco e ainda mais tempo de antena”.

A cerca de seis meses do aniversário do 25 de Abril, a campanha eleitoral do PCP promete ser marcada por um “contacto permanente e intenso com os trabalhadores e as populações”. À beira do precipício — com apenas 3% das intenções de voto — os comunistas estão focados em clarificar e reforçar as posições defendidas pelo partido, nomeadamente o aumento dos salários e pensões, o combate à crise da habitação, e a reestruturação do Serviço Nacional de Saúde (SNS).

Com o foco na ideia de que a direita, e não o PS — com quem poderão vir a coligar-se dependendo do resultado das eleições primárias — é o seu principal adversário, o BE afirma que o seu objetivo é “derrotar a direita”.“Se o Partido Socialista deixou o país num pântano, a direita só vai cavar mais fundo esse pântano”, concluiu Mariana Mortágua na última reunião da Mesa Nacional, realizada no dia 19 de novembro. “Já está à vista que, na nova situação política, a direita prometerá tudo o que nunca fez nem fará — desde um cordão sanitário face ao Chega (são aliados nos Açores) até ao reconhecimento do tempo de serviço dos professores (que o PSD propõe agora, após tê-lo chumbado em 2019 quando poderia de facto tê-lo imposto no parlamento)”, rematou o BE.

A crise política em Portugal, que culminou na renúncia abrupta e inesperada de António Costa devido a suspeitas de corrupção, mergulhou o país num mar de incerteza, tanto a nível nacional como internacional. A torre de cartas ruiu, e agora?

“Os dez pequenos índios e o padrinho”

Durante as décadas de 60 e 70, persistiu nos órgãos de comunicação social uma propensão quase neurótica com tudo o que dizia respeito à principal agência de informações americana, a Central Intelligence Agency, mais conhecida como CIA. Baptizado pelo New York Times como o “Síndrome de James Bond”, este fascínio era caracterizado pela vontade de revelar ao público informações confidenciais que estavam reservadas a um punhado de indivíduos. Num artigo publicado nesse jornal em 1966, um oficial de informações referiu que a reputação do seu trabalho e a dos seus colegas dependia da mentira. Foi com base nessa premissa que as acções da CIA ficaram para a história, não tanto pelo secretismo, mas pela falta de honestidade e transparência com que foram levadas a cabo.

Uma agulha no palheiro

Em 1949, o Congresso norte-americano aprovou uma lei que autorizava a CIA a contornar todos os procedimentos legais a que estava anteriormente sujeita. A agência de espionagem ganhou uma liberdade sem precedentes, tornando-se praticamente ingovernável. Um Estado dentro de um Estado. Entre os anos de 1962 e 1971, a secreta esteve presente em pelo menos 16 países, entre os quais, Portugal. “Em 1965, vários aviões foram transportados dos Estados Unidos para Portugal para serem utilizados contra os movimentos de libertação negra em Angola e Moçambique”, lê-se num artigo publicado pela revista Earth em 1972. Este empreendimento constituiu uma clara transgressão dos Actos de Neutralidade, uma série de leis destinadas a evitar o envolvimento da maior economia mundial em conflitos estrangeiros.

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Fonte: Getty Images 

No ano seguinte, a comunidade internacional ficou a saber que John Richard Hawke, um antigo piloto da RAF com apenas 28 anos, tinha pilotado sete bombardeiros B-26 para Portugal. O caso foi julgado no Tribunal Federal de Buffalo, tendo passado relativamente despercebido. Juntamente com Hawke, a bancada dos réus era composta por Henri Marin Montmarin, um conde francês ligado à resistência durante a Segunda Guerra Mundial, e outros três, que conseguiram escapar à justiça. Entre eles estava Gregory Board, o alegado cabecilha, encarregado de obter as licenças de exportação. Este último nunca compareceu em tribunal, tendo, alegadamente, fugido para a Jamaica. Todos os arguidos eram pilotos.

Numa altura em que a política oficial americana apoiava a igualdade entre os pares e a autodeterminação dos povos indígenas, o escândalo expôs uma ferida difícil de sanar. Solução? Mentir. Essa mentira espalhou-se como uma infecção. Questionado pelos delegados soviético e húngaro acerca da venda dos B-26 para Portugal, os representantes norte-americanos para as Nações Unidas, Arthur Goldberg e Eugenie M. Anderson alegaram que a venda tinha sido feita por privados, sem o conhecimento do seu governo. No entanto, consoante os documentos apresentados ao juiz John O. Henderson pelo à data advogado da CIA, Lawrence R. Houston, a venda das aeronaves era do conhecimento prévio dessa entidade, do Departamento de Estado e de outras 10 agências federais. Os relatórios datavam de 25 de Maio de 1965, quatro dias antes do primeiro voo rumo ao Aeródromo Militar de Tancos.

Martin Caidin, uma das testemunhas-chave no processo, afirmou em tribunal que a CIA estava envolvida. Conforme o antigo piloto, escritor e conselheiro de Estado, essa informação foi confirmada por Board, seu conhecido, e por outros dois coronéis da Força Aérea americana. “Com base na minha experiência como piloto, uma pessoa não pode pilotar aviões militares para fora dos EUA sem a cooperação de várias agências governamentais”, sublinhou.

Bode expiatório

Segundo o artigo cientifico Política Americana na África do Sul: Os desafios e a orientação, após 1962, os EUA “recusaram-se consistentemente a apoiar qualquer resolução que fosse além da linguagem declarativa e da tentativa de acção para alcançar a autodeterminação para o povo de Moçambique ou de outras colónias portuguesas”. Embora tenha financiado grupos como a FNLA de Roberto Holden, Washington tornou-se cada vez mais relutante em apoiar as resoluções da ONU que criticavam Portugal. Segundo o mesmo estudo, essa indefinição “permitiu a alguns afirmar que, na pior das hipóteses, os Estados Unidos apoiavam ambos os lados”. No fim, prevaleceu o apoio a Portugal e ao império.

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Legenda: Holden Roberto, líder histórico da Frente Nacional de Libertação de Angola (FNLA) entre 1962 e 2007, data da sua morte. Fonte: Blogue Livros Ultramar- Guerra Colonial

Durante três semanas e meia, a defesa encabeçada por Edwin Marger e Edward Brodsky alegou que Hawke e Montmarin eram meros bodes expiatórios, abandonados à sua sorte por uma organização com medo de desencadear outra polémica de proporções internacionais. Antes de os advogados darem o caso por encerrado, Marger referiu-se ao julgamento como “os 10 pequenos índios e o padrinho”. Os índios, disse, eram todas as pessoas envolvidas na operação, incluindo os arguidos, Board e os vários contabilistas e empresários. O padrinho representava o Governo, descrito por Marger como um “homenzinho que não era visto e que dava sempre um toque de sorte ao Sr. Hawke”. Essa sorte, que o acompanhou em todas as viagens, permitiu-lhe, bem como aos outros intervenientes, transportar sete bombardeiros B-26 para Portugal sem licença legal ou qualquer restrição.

Segundo o New York Times, a polícia secreta portuguesa que o recebeu em Tancos deu à operação o nome de código “Sparrow” (Papagaio), uma espécie de salvo-conduto caso fosse questionado. Uma transcrição da CIA de um artigo publicado no jornal comunista, Pravda, colocava a questão nos seguintes termos:

Numa manhã ensolarada, um avião C-46 estava prestes a descolar no aeroporto de Rochester, Nova Iorque. O seu piloto, John Hawke, já tinha aquecido os motores quando, de repente, um jeep Willys do serviço aduaneiro aproximou-se da aeronave. Ao abrir o porão, o inspector ficou surpreso, pois não esperava um carregamento tão valioso. O avião estava repleto de espingardas, metralhadoras e outros equipamentos militares. John Hawke e os seus companheiros não ficaram constrangidos por serem apanhados em flagrante. Hawke proferiu apenas duas palavras: “Sparrow” e “Monarch”, palavras que o inspector reconheceu de imediato. Pouco depois, o C-45 deslocou-se até à pista de descolagem. Contudo, em Miami, onde Hawke aterrou em segurança após algumas horas, apercebeu-se que estava sob vigilância. Como explicou mais tarde, não deu muita importância a isso, considerando que as autoridades aduaneiras locais e os agentes do FBI estavam a “exagerar”. Afinal, o que é que um agente ao serviço da CIA teria a temer?”

Fonte: “Operação Sparrow”, um artigo publicado no dia 15 de Maio de 1966 no jornal Pravda.

Em Maio de 1965, Hawke e Board deslocaram-se até Tucson, Arizona, onde se situavam as sedes de duas empresas envolvidas no comércio internacional de aeronaves: a Aero Associates, ligada a Board, e a Hamilton Aircraft, propriedade de Gordon B. Hamilton. Ao que a TejoMag apurou, a Aero Associates concordou em efectuar um pagamento de 450 mil dólares à Hamilton Aircraft, mediante uma carta de crédito no valor de 694 mil dólares, proveniente do banco United Overseas. Este montante dizia respeito à venda e manutenção de 20 B-26 para Portugal. Como já aqui foi referido, apenas sete desses aviões chegaram ao seu destino.

Esta operação estava longe de ser secreta. Hamilton chegou inclusive a receber várias visitas de agentes do FBI e representantes da Agência Federal de Aviação. Contudo, nenhuma destas organizações impediu Hawke de sair do país. Pouco antes da detenção dos dois arguidos, Hamilton questionou o adido aéreo português em Washington, se Portugal estava interessado em adquirir os restantes 13 aviões. A proposta partia do pressuposto que a “utilização das aeronaves seria limitada ao território português”. Portugal não aceitou.

Piloto sofre desastre

No dia 14 de Outubro de 1966, o júri do Tribunal Distrital Federal, composto por dez homens e duas mulheres, absolveu Hawke e Montmarin de todas as acusações. Segundo o presidente deste órgão, os arguidos foram “apenas um instrumento de Board”. O Departamento de Estado americano ficou desapontado com esta decisão. Ao jornal Times Herald, o antigo porta-voz Robert J. Mccloskey explicou que encontrou consolo no facto de o júri ter rejeitado “a alegação da defesa de que o governo dos Estados Unidos estava, de alguma forma, envolvido na transacção”.

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Fonte: Notícia sobre a morte de Hawke. Fonte: Il Piccolo (30/12/1991)

Nos anos 90, Hawke foi encontrado morto na sequência de um desastre de avião ao largo do Porto Levante, no Golfo de Veneza, em Itália. Segundo o relatório do incidente, “o piloto foi identificado com base na documentação recolhida e as autoridades italianas deram início a um inquérito”. “A investigação italiana concluiu que o acidente foi causado por uma combinação de factores, nomeadamente a não retracção do trem de aterragem principal direito, as condições meteorológicas e a escuridão. As possibilidades de colisão ou explosão foram categoricamente excluídas. No entanto, não se pode excluir a possibilidade de alguma forma de incapacidade do piloto”, lê-se no relatório. Essas hipóteses não foram bem recebidas pelo público e pela imprensa, que sempre suspeitaram de jogo sujo. Afinal, Hawke enfrentou o Estado e ganhou…

NOTA – Por decisão pessoal, o autor do texto não escreve segundo o novo Acordo Ortográfico.

Estado da Nação: António Costa acusa oposição de não fazer propostas

O debate arrancou com o Primeiro-Ministro a contextualizar o parlamento acerca das adversidades que esta legislatura enfrenta, como “o contexto de pós-pandemia”, o “impacto da invasão da Ucrânia pela Rússia”, a “crise energética”, a “rutura das cadeias de abastecimento”, as “subidas inopinadas das taxas de juro” e a “maior inflação dos últimos trinta anos”. “Perante esta realidade, com humildade, o governo optou pela responsabilidade face ao alarmismo e pela acção contra o fatalismo”, avançou António Costa, que acusou a oposição de fazer “discursos catastrofistas”. Quase um ano após ter ido a votos, diz que o país não “estagnou, não entrou em recessão” e nem “regressou à estagflação”. Antecipando os golpes da oposição, explicou que no primeiro trimestre, Portugal teve “o 3 maior crescimento da União Europeia” e que o “emprego está em máximos históricos”. E enfatizou: “a inflação tem vindo a descer”. “Portugal não foi o país que as oposições previam, que empenhadamente anunciavam que ia ser e que, sejamos claros, alguns anseiam desde 2015 que, finalmente, seja mesmo”, rematou. Estes resultados, explicou, “não são um acaso ou obra de uma mão invisível”, mas “fruto do trabalho dos portugueses, da iniciativa das empresas e das medidas de política do governo”. Ao contrário do que disse na semana passada, quando desvalorizou o tema da corrupção, Costa admite que “os problemas do país são reais e não meras figuras de retórica”.

Num tom apaziguador, o primeiro-ministro tentou agradar a gregos e a troianos, fazendo referência à “valorização da escola pública”, uma bandeira da esquerda, e às “condições de trabalho das forças de segurança”, um ponto sensível para a direita. Durante a sua primeira intervenção, bombardeou a oposição, acusando-a de inércia. “As oposições só têm uma prioridade: o combate ao governo e às soluções que apresenta. E por isso nada propõem e tudo criticam”, apontou. Por essas razões, concluiu que “os portugueses estão melhor” e o “país está a melhorar”. Nomeadamente na economia, que afirmou ser mais “qualificada”, “produtiva”, “competitiva”, “diversificada” e “aberta” que em 2015. Nesse ano, a economia portuguesa cresceu 1,5% do Produto Interno Bruto (PIB), menos seis pontos percentuais do que os previstos para este ano (1,8%). Numa altura em que as sondagens dão vantagem ao PSD, Costa falou para os eleitores e carregou em cima da bancada laranja. No seu discurso, reiterou que a maioria absoluta é essencial para a “estabilidade”, uma palavra valorizada tanto pelo primeiro-ministro como pelo próprio presidente da República. Esta maioria, estilhaçada pelo acumular de casos em forma de demissões, assemelha-se a um leão solitário, rodeado por hienas ou “abutres”, como lhes chamou Mariana Mortágua do Bloco de Esquerda [ver abaixo].

PSD diz que governo “têm a marca do empobrecimento”

Foi precisamente a sondagem feita pela Universidade Católica para a RTP, Antena 1 e PÚBLICO, que permitiu ao PSD ir para o debate com a confiança reforçada. De acordo com Joaquim Sarmento Matos – contestado pelo grupo parlamentar que preside – António Costa está em “negação”. Segundo o líder parlamentar, este governo “têm a marca do empobrecimento”. Na sua primeira intervenção, lembrou que o seu partido redigiu uma série de propostas relacionadas com a perda de compra dos pensionistas, com o crédito à habitação, com a actualização dos salários e com a redução dos impostos, mas que foram todas chumbadas pelo PS. Criticado na CNN por não se saber expressar de forma carismática, Sarmento Matos focou-se nos impostos, acusando os governos liderados por António Costa de subir a carga fiscal. “Em 2022, o seu governo cobrou mais 11 mil milhões de euros de impostos. A carga fiscal atingiu o recorde máximo de 36,4% do PIB. E este ano, até Maio, em apenas cinco meses, o aumento da cobrança de impostos já ultrapassou as previsões para o ano inteiro”, constatou. De acordo com Sarmento Matos, em oito anos de governação socialista, os serviços públicos como a “saúde, a habitação, a educação, os transportes, a segurança, a justiça e até a defesa” estão hoje em pior estado do que há quase uma década. O PSD, também a braços com a justiça por suspeitas de corrupção, lamentou a sucessão de “casos e casinhos” e disse que o que se passou na semana passada foi “uma inversão daquilo que devem ser os papéis entre a justiça e a política”. “Várias pessoas de vários quadrantes políticos já se colocaram na primeira linha desse combate. Falta uma pessoa, que é vossa excelência Sr. primeiro-ministro”, rematou.

A “maior casa de alterne da Europa”?

Num artigo assinado por Pedro Pinto no Diário de Notícias, o presidente da bancada parlamentar do Chega comentou as polémicas que Costa teima em chutar para canto. Durante a tarde de quinta-feira, o Chega aproveitou a ocasião para descredibilizar o executivo socialista. E foi num tom sarcástico e provocatório, que usou da palavra para “felicitar” António Costa quanto à redacção do relatório preliminar da comissão de inquérito à TAP. Segundo um comunicado publicado no dia 5 deste mês, “o Chega vai propor uma alteração profunda” ao documento, para repor o que foi dito e “identificar responsáveis”. Naquela que foi a intervenção mais explosiva da tarde, André Ventura responsabilizou António Costa de querer desviar as atenções para assuntos mais periféricos, como a “transformação energética” e a “luta contra as alterações climáticas”. “A luta que nós temos de travar é contra este governo e contra a enorme degradação do espaço público nos últimos meses”, constatou. Ainda que munido de papéis, incluindo um gráfico com os salários dos trabalhadores na Europa, estudou mal a lição e incluiu Malta e Chipre na lista de países da ex-União Soviética que oferecem salários mais altos que Portugal. Ventura levou também a questão da imigração ilegal e afirmou que António Costa “quer fazer deste país a maior casa de alterne da Europa”. A sala ficou em choque e o deputado foi vaiado pelas restantes bancadas parlamentares, incrédulas com o uso dessa expressão.

“Degradação” dos serviços públicos

Depois da intervenção de AV, foi a vez de Rui Rocha, presidente da Iniciativa Liberal. Já passaram sete meses desde que António Costa chamou aos deputados liberais “queques que guincham”. Desde então, a relação da IL com o governo deteriorou-se. E isso sente-se. Na altura, Carla Castro condenou aquilo que considera terem sido “declarações infelizes” e aconselhou-o a preocupar-se com o “estado do país”. No debate da passada quinta-feira, o presidente do partido acusou o PM de falhar enquanto “presidente do sindicato dos portugueses” e “garante de estabilidade”. Bem como no “combate à corrupção”. E pediu uma menor carga fiscal: “aquilo que eu lhe peço é que deixe os portugueses trabalhar Sr. ministro. Deixe que os portugueses levem para casa a justa compensação pelo seu esforço e pelo seu trabalho!”. Costa respondeu a números com números, explicando que a taxa de desemprego desceu 6% desde 2015 e que, com a nova tabela de retenção, o impacto nos bolsos dos portugueses será menor. Em vez dos 63 euros referidos pela IL, o Estado passará a reter 11 euros em sede de IRS e outros 11 para a Segurança Social.

Comunistas e bloquistas criticam falta de condições laborais

Mais à esquerda, os comunistas apontaram o contraste “entre as estatísticas risonhas e as dificuldades da vida de todos os dias”. Para Paula Santos, líder da bancada parlamentar, a verdade é “intolerável”: “mais desigualdades, injustiças e exploração, ataque aos direitos laborais e sindicais, degradação dos serviços públicos, baixo nível de investimento público, fragilização do aparelho produtivo, novas privatizações”. “Esta é a realidade que o governo, por mais que tente, não consegue esconder”, assinalou. Vão longe os tempos da geringonça em que as conquistas do governo também eram as conquistas do PCP. Hoje, os comunistas condenam o executivo por “falta de vontade política” para “elevar as condições de vida e garantir os direitos”. Costa virou o feitiço contra o feiticeiro e usou uma obra de Lenine para refutar as acusações. Para garantir o “interesse geral do país”, o governo não pode dar um “passo maior do que a perna”, arriscando andar “dois passos atrás”, sublinhou. Quando chegou a vez de ouvir o Bloco de Esquerda, Mariana Mortágua chamou “coro” ao PS e “abutres” à direita, que espera, pacientemente, pelo último sopro do moribundo. Os bloquistas focaram-se na luta contra a “concentração da riqueza”, na “corrupção”, na precariedade e no fracasso do programa Mais Habitação, temas caros ao partido.

O “mundo cor-de-rosa do PS” e a oposição controlada

“Ao contrário daquilo que já foi dito aqui hoje, os portugueses não vivem no mundo cor-de-rosa do PS”, defendeu Inês Sousa Real. A deputada única destacou que o aumento do custo de vida não pode ser ignorado” e confrontou o executivo com o aumento das rendas e dos preços dos alimentos, alertando também para a necessidade de “cuidados para os animais de companhia”. Relativamente ao partido Livre, o deputado Rui Tavares lembrou que uma maioria absoluta não significa “governar sozinho” e acusou Costa de esquecer a existência da “oposição democrática”. Os projectos de lei apresentados pelo Livre e aprovados pelo PS, incluem o passe ferroviário e os apoios para a remodelação de portas e janelas das casas. “A única coisa que eu tenho a lamentar é que os outros partidos da oposição não tenham a mesma postura construtiva”, ironizou Costa.

NOTA – Por decisão pessoal, o autor do texto não escreve segundo o novo Acordo Ortográfico.

Galambagate “afecta tremendamente” a reputação do SIS

A Comissão de Inquérito à TAP já terminou, mas o caso Galamba ecoa na memória dos portugueses como um desastre político, envolto em incerteza. A recuperação inusitada [ou não] de um computador do Estado com informação classificada por parte do principal serviço de contra-espionagem, pôs em xeque um adjunto, uma chefe de gabinete, um ministro, um ex-ministro, um secretário de Estado, e o próprio chefe de Governo, que afirmou não ter sido informado de “qualquer acção”. Independentemente de quem solicitou o Serviço de Informações de Segurança (SIS), a questão está relacionada com o facto de poder tratar-se de um procedimento policial, sob jurisdição da Polícia Judiciária.

Conselho de Fiscalização nega ilegalidade

Embora esta acção tenha sido amplamente criticada, inclusive por juristas e constitucionalistas, o Conselho de Fiscalização do Sistema de Informações da República Portuguesa (CFSIRP), um “órgão responsável pela fiscalização da actividade dos serviços”, considerou “não existirem indícios de uma actuação ilegal do SIS”. Num comunicado datado do dia 21 de Junho deste ano, o CFSIRP justificou que na noite de 26 de Abril, “o Director do SIS concluiu que se impunha desenvolver diligências tendentes a prevenir o risco de comprometimento de documentos classificados do Estado e a salvaguardar a sua confidencialidade”. “Para o efeito, o SIS não usou meios que lhe estivessem vedados. O Dr. Frederico Pinheiro manteve uma conversa telefónica com um funcionário do SIS e disponibilizou-se para lhe entregar voluntariamente o computador, na via pública, como o próprio afirmou em declarações públicas, nos dias 28 e 29 de Abril”, esclarece o comunicado. Não obstante, Frederico Pinheiro afirmou ter sido coagido e ameaçado por um oficial de informações para devolver o equipamento.

Para Jorge Bacelar Gouveia, jurista e professor catedrático da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, a Lei-Quadro do Sistema de Informações da República Portuguesa (SIRP), o órgão que coordena o SIS e o SIED, é clara: os funcionários ou agentes, civis ou militares, dos serviços de informações não podem exercer poderes, praticar actos ou desenvolver actividades do âmbito, ou competência específica dos tribunais, ou das entidades com funções policiais”. “Contra factos não há argumentos, se bem que alguns achem que os factos mudam conforme os argumentos”, escreveu no Twitter.

“Acção do SIS carece de bom senso”

Em declarações à TejoMag, Alexandre Guerreiro, ex-espião, especialista em Direito Internacional e comentador televisivo, vai mais longe e afirma que “o caso Galamba afecta tremendamente a reputação dos serviços”. “Desde logo, por revelar de forma grosseira a instrumentalização dos serviços de informações em favor de interesses políticos, pelo recurso a métodos à margem da lei e de uma maneira informal e banal que deixa transparecer que o SIS é um órgão ao serviço de qualquer membro do Governo que o pretenda explorar”, sublinha. De acordo com Alexandre Guerreiro, “há até um aproveitamento do poder político na condução, pelos serviços de informações, de acções protegidas por confidencialidade para usar os serviços de informações sem qualquer travão pela direcção destes serviços ou pelo próprio membro do Governo que os tutela”. E enfatiza: “Não há nenhuma base legal que habilite o SIS a fazer a recolha de equipamentos com matéria classificada ou a conduzir diligências em nome de qualquer membro do Governo e solicitado por mera vontade desse. Importa recordar que quem exerce a tutela sobre o SIS é o Primeiro-Ministro e não qualquer outro membro do Governo. E que quando há suspeitas de quebras de segurança, a Polícia Judiciária é o órgão competente para conduzir investigações próprias e comunicar essas irregularidades ou ilícitos ao Ministério Público”, salientou.

Questionado pelo semanário NOVO se vão ser os serviços a “pagar”, Jorge Silva Carvalho (JSC) ex-director do Serviço de Informações Estratégicas de Defesa (SIED) entre 2008 e 2010, disse que “houve um erro e uma precipitação porque quiseram agradar e ser rápidos”. “Só se compreenderia caso houvesse alguma informação que justificasse essa urgência na actuação”, sublinhou. Em declarações à CNN, Jorge Silva Carvalho explicou que a imagem das secretas sai prejudicada. Quando questionado se a atuação do SIS foi legal, JSC afirmou que sim, mas que “não deveria ter actuado daquela forma”. Segundo o próprio, “a acção do SIS carece de bom senso” e “poderia ter corrido mal”. Ou neste caso, pior. “A intervenção do Serviço de Informações de Segurança numa matéria que é, no mínimo, controvertida e altamente especulativa em termos políticos, parece-me desajustada”, avançou. Contra todas as expectativas, o ministro João Galamba não renunciou, deixando o país à espera de um desfecho que poderá nem sequer chegar.

De acordo com JSC, “nós pertencemos àquele grupo de sistemas em que, havendo um problema na área dos serviços de informações, cai o director e não o membro do governo”. Neste caso, nem um, nem outro. No dia 9 deste mês, Luís Montenegro escreveu uma carta a António Costa, na qual pediu a demissão da secretária-geral do Sistema de Informações da República Portuguesa (SIRP). Costa respondeu que o Serviço de Informações de Segurança agiram adequadamente “face à actual avaliação do quadro de ameaças sobre infra-estruturas críticas e perante o alerta de quebra de segurança de documentos classificados no Ministério das Infra-estruturas”. “Sendo esta a minha avaliação, obviamente não irei demitir a Secretária-Geral do Sistema de Informações da República Portuguesa, Embaixadora Graça Mira Gomes”, reiterou.

Num artigo publicado no Diário de Notícias, Abílio Morgado, o anterior presidente do Conselho de Fiscalização do SIRP, disse que a direcção do SIS foi alvo de “sugestão externa” e que “acabou por errar objectivamente, expondo o SIS à suspeição pública de servilismo ao poder e de um padrão de actuação de má memória e suspeição pública”. Ao podcast Soberania, desse jornal e do Observatório de Segurança, Criminalidade Organizada e Terrorismo (OSCOT), Morgado confessou que “as luzinhas vermelhas acenderam todas”. “Percebi que tínhamos uma situação com enorme potencial disruptivo relativamente à confiabilidade do SIS. Não conhecia ainda pormenores, mas o SIS, em democracia, é um serviço que só pode existir, subsistir e actuar se o contrato de confiança que entre ele e todos os cidadãos portugueses existir não for quebrado”, afirmou.

Estas posições contrastam com a de Paulo Vizeu, secretário-geral do Sistema de Segurança Interna (SSI). Em entrevista à Rádio Renascença, afirmou que “não ajuda à imagem, porque não corresponde sequer à realidade”. De acordo com Vizeu, os directores do SIS e do SIRP “nunca irão fazer nenhum jogo partidário, nem nenhum jogo de interesses”. “Têm a preocupação permanente do interesse comum. Esses são os dados que eu tenho. São serviços essenciais ao Estado, à nossa segurança, e espero que possam ser tratados enquanto tal”, explicou.

No geral, esta acção foi considerada injustificada e prejudicial à reputação dos serviços. Há oito meses, o director do SIS deu uma palestra na Universidade Lusíada, na qual mencionou as “surpresas estratégicas e falhas dos serviços”. Segundo Adélio Neiva da Cruz, estas podem ser evitadas se a relação do SIS com o seu destinatário basear-se em “equilíbrio”. O relacionamento, disse, depende também “da confiança que a sociedade civil tem nos serviços e da credibilidade que lhes atribui na sua actuação em defesa da democracia e da segurança dos cidadãos”. Para Neiva da Cruz, os portugueses são influenciados “pelos fracassos que vêm a público, enquanto os êxitos permanecem entre paredes e sem divulgação”. Mais recentemente, foi ouvido à porta fechada na comissão de Assuntos Constitucionais, onde assumiu toda a responsabilidade pela actuação do SIS na recuperação do computador do ex-adjunto do ministro das infraestruturas. A TejoMag procurou saber, junto do SIS, do SIED, do SIRP, do Instituto Nacional de Defesa e de alguns serviços de informações aliados [ingleses, italianos e alemães] de que forma é que o caso manchou [ou não], a imagem dos serviços de informações a nível nacional e internacional, mas até à hora de fecho desta edição, não obteve resposta.

NOTA – Por decisão pessoal, o autor do texto não escreve segundo o novo Acordo Ortográfico.

ONG acusam lobistas de influenciar decisões políticas sobre o uso de glifosato

No ano passado, o PAN propôs um projecto de lei para avaliar o impacto da carga poluente das bacias hidrográficas de Espanha em Portugal. A proposta foi aprovada pela maioria dos partidos, excepto pelo PS, que votou contra, e pelo PCP, que se absteve. O partido pretendia implementar “uma estratégia de despoluição dos rios e demais cursos de água” que “assegure a aplicação de um índice de escassez e existência de rios vivos e caudais ecológicos sustentáveis em toda a sua extensão”. O documento destaca a falta de dados sobre a “degradação do meio hídrico nacional” e a toxicidade do glifosato, “o principal contaminante das águas nos rios Minho, Tejo, Douro e Guadiana”. Durante a discussão na generalidade, a deputada Inês Sousa Real alertou “que o que vem do outro lado da fronteira acaba por ser água sem controlo, contaminada com agro-tóxicos, como o glifosato, que mata peixes às centenas”. “Apesar do quadro preocupante que este relatório nos apresenta e de existirem dados da Agência Portuguesa do Ambiente (APA) que revelam uma persistente degradação do meio hídrico nacional, a verdade é que não existe uma avaliação do volume e do impacto da carga poluente das bacias hidrográficas de Espanha no território português”, aponta a deputada única do PAN.

Grupos de pressão

De acordo com Alexandra Azevedo, presidente da Quercus, “os interesses para que o glifosato se mantenha no mercado são bastantes e os decisores políticos acabam por procurar subterfúgios para negar essas evidências”. Para Pedro Horta, membro do Grupo de Trabalho de Agricultura Floresta e Biodiversidade da Associação ZERO, “o nível de pressão de alguns lobbies é manifesto no que tem sido a discussão do Regulamento para o Uso Sustentável (SUR) de pesticidas, sobretudo a COPA-COGECA e o grupo de interesse associado aos oligopólios de fabrico de agro químicos, a CropLife”. O especialista em política pública na área de agricultura acrescenta que “a redução da dependência de pesticidas é um custo directo para os produtores destas substâncias e indirecto para os grandes beneficiários do sistema agro-alimentar dominante, pois implica transformações nas grandes unidades de produção, possivelmente dando vantagem a produções em menor escala”. “Uma das estratégias mais utilizadas é fomentar o medo, desta vez associando a guerra na Ucrânia com escassez de alimentos ou aumento do custo para os consumidores. No entanto, não está em causa o abastecimento alimentar na União Europeia, e o aumento do preço dos alimentos tem também uma história por contar em termos de práticas inflacionárias, nomeadamente das multinacionais ligadas à produção de fertilizantes”, esclarece. Segundo Alexandra Azevedo, as opiniões e pareceres contraditórios que foram sendo publicados ao longo dos anos, dão azo a um malabarismo político que visa “caucionar a sua [do glifosato] continua utilização”.

A Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP) desvaloriza. De acordo com Luís Mira, secretário-geral da CAP, o glifosato é uma “ferramenta de trabalho essencial para os agricultores” e “deve ser utilizado no respeito integral pelas normas estipuladas para o efeito por parte das empresas e das entidades oficiais, obedecendo a princípios de natureza científica e não a considerações meramente ideológicas”. E frisa: “a utilização de produtos fitofarmacêuticos autorizados obedece a princípios muito precisos e objetivos que, de acordo com as regras em vigor na União Europeia, não oferece risco para os utilizadores, consumidores e meio ambiente. Neste enquadramento, e tendo em conta que a utilização de herbicidas é necessária para que os agricultores possam produzir alimentos em quantidade e a preços acessíveis, torna-se essencial evitar fundamentalismos ideológicos que coloquem em causa a produção agrícola e que releguem a ciência para segundo plano, face a motivos de agenda política e ideológica”. À TejoMag, Luís Mira diz que “a proibição de substâncias activas que se tem verificado nos últimos anos no espaço comunitário, acaba por criar uma situação de concorrência desleal entre operadores a nível mundial, com clara desvantagem para os produtores europeus”. “A questão não será o uso ou não do glifosato e a sua eventual substituição, mas sim podermos continuar a produzir alimentos em qualidade, quantidade e acessíveis ao consumidor europeu”, sublinha.

Esta posição vai de encontro à descrita pela Quercus, que aponta o dedo aos agricultores com uma mentalidade mais conservadora. Em declarações à TejoMag, a presidente da Quercus explica que “a resistência têm muito haver, desde logo, com os próprios agricultores que se sentem reféns deste modelo que os empurra”. “Em tudo na vida, é importante termos a coragem de sair da roda que nos mantém num determinado estilo de vida. Isto aplica-se a praticamente tudo”, indica. A Plataforma Transgénicos Fora vai mais longe, afirmando que “a industrialização da agricultura está a criar mais problemas do que soluções”. “Em vez de adoptar o modo de produção biológica, como a Comissão Europeia (CE) propõe na estratégia «Do Prado ao Prato», a agro-indústria prefere apostar na biotecnologia, criando organismos sintéticos desenhados para serem imunes aos pesticidas”, alerta. No documentário “Demain”, publicado em 2015, Olivier De Schutter, Relator Especial da ONU sobre pobreza extrema e direitos humanos, reiterou que se continua a “apoiar os agricultores mais competitivos que praticam uma agricultura nociva, mas que satisfazem as expectativas a curto prazo dos políticos e das pessoas”. A TejoMag contactou as organizações COPA-COGECA e Crop-Life, bem como o Ministério do Ambiente e o Ministério da Agricultura, mas até à hora do fecho desta edição, não obteve resposta.

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RAFAEL BAPTISTA

Prenda envenenada

O documento enviado à Assembleia da República pela deputada Inês Sousa Real baseou-se num relatório publicado pelo grupo Ecologistas en Acción, uma confederação de mais de 300 grupos ambientalistas sediada em Espanha. O relatório destaca que “as análises de contaminantes químicos realizadas por órgãos oficiais em 2019 mostram que todas as bacias hidrográficas apresentam contaminação com substâncias tóxicas em águas superficiais (rios reservatórios e lagos) e subterrâneas”, onde se inclui o glifosato.

Tanto em Espanha como em Portugal, a falta de avaliação governamental do volume e impacto da carga poluente é preocupante. O relatório supramencionado reforça que o glifosato foi o pesticida detectado com mais frequência no rio Tejo, presente em 277 das 391 amostras analisadas. Em Portugal, o seu uso é generalizado na agricultura e também nos serviços de autarquias. Embora seja proibido o uso de herbicidas e pesticidas em espaço público, a revista Science of the Total Environment revelou que Portugal apresentou os níveis mais elevados de glifosato entre os países europeus. Esse produto foi detectado em 53% dos solos analisados, 46 vezes mais do que na Polónia (7%). De acordo com a Quercus, até ao final de 2022, 72 autarquias assinaram o Manifesto “Autarquias sem Glifosato/Herbicidas”, uma campanha que visa abandonar o uso dessas substâncias e sensibilizar as autarquias e a população em geral para os impactos dos herbicidas e possíveis alternativas, através de encontros e debates públicos. Contudo, no ano passado, a Direcção Nacional da Quercus retirou do mapa, com base numa denúncia, a Câmara Municipal de Mafra e a Junta de Freguesia de Ferrel, concelho de Peniche.

“Provavelmente carcinogénico”

Já se escreveu muito sobre os riscos do glifosato, descrito pela Organização das Nações Unidas como “provavelmente carcinogénico”. De acordo com Pedro Horta, “caso as intenções do Governo Português se mantiverem, acrescem os planos de incremento do regadio ao longo da bacia do Tejo, em mais de uma centena de milhar de hectares, para o novo programa de regadios, com uma intensificação nos cursos de água”. “Na maioria das formulações, os pesticidas à base de glifosato são bastante tóxicos para os organismos aquáticos. Caso se venha a provar inequívoca a relação entre esta substância activa e danos para a saúde humana em baixas concentrações, estamos aqui perante uma situação muito grave”, alerta. Segundo este representante da ZERO, “os instrumentos de gestão territorial que abrangem o rio Tejo e os seus afluentes devem ser devidamente monitorizados, garantindo o seu cumprimento, principalmente no que diz respeito ao uso e ocupação dos solos e actividades / acções condicionadas”. “A aplicação da Directiva Quadro de Água também deve ser prioritária, garantindo que não existem massas de água com estado inferior a bom, algo que abrange o país vizinho”, explica.

Aliás, em 2015, a Agência Internacional para a Investigação sobre o Cancro da Organização Mundial de Saúde (IARC-OMS) afirmou que “os dados de todos os estudos combinados mostram uma relação significativa entre o linfoma não Hodgkin e a exposição ao glifosato”. Coincidentemente, a Liga Portuguesa Contra o Cancro dá conta que “em Portugal, todos os anos, cerca de 1700 pessoas são informadas que têm linfoma não Hodgkin (LNH)”. Segundo Alexandra Azevedo, a evidência científica aponta para o “aumento da intolerância ao glúten, do autismo, do Alzheimer e das doenças do foro degenerativo e reprodutivo, como o aborto e a infertilidade”. E a nível nacional? “Não há muitos estudos. O que acontece é que quando estas substâncias são autorizadas, os estudos são feitos pelas empresas e não são escrutinados publicamente”. Isto para dizer que em termos de ciência, há ocultação de resultados”, sublinha.

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RAFAEL BAPTISTA

Alternativas sustentáveis

Mas também existem aqueles que optam por práticas agro-ecológicas como a comunidade na Herdade do Freixo do Meio, que adoptou a agricultura sintrópica, um sistema baseado na diversidade de espécies vegetais, no aproveitamento do espaço em altura, na continuação das espécies de forma temporal e espacial e no enriquecimento do solo pela introdução de resíduos vegetais. Quando questionado sobre as medidas necessárias para reduzir a exposição e os impactos do glifosato no meio ambiente e na saúde humana em Portugal, Pedro Horta enfatiza “que é necessário implementar o que vem definido na Directiva Uso Sustentável (SUD) de pesticidas, já presente na Lei nacional, ou seja, condições para a adopção efectiva dos princípios da Protecção Integrada, deixando de haver uma aplicação sistemática de pesticidas, relegando a luta química para o seu lugar devido: apenas em último recurso – algo que é reconhecido pela avaliação do primeiro Plano de Acção Nacional para o Uso Sustentável de Produtos Fitofarmacêuticos (PANUSPF)”. Em termos gerais, “a ZERO considera que o uso de quaisquer pesticidas, independentemente da substância activa que contêm, deve ser regrado”. “Isto significa que a luta química deve apenas ser utilizada em último recurso, esgotadas as restantes alternativas, mediante uma ponderação dos danos e incorporação de medidas correctivas. No entanto, na prática, continuamos a observar um uso sistemático de pesticidas, resultado de sistemas agrícolas muito baseados em monoculturas e com escassas estruturas ecológicas”, constata. Para Alexandra Azevedo, a solução passa pela “comunicação e sensibilização da população”, promovendo “uma concepção mais natural dos espaços verdes”.

A Liga para a Protecção da Natureza (Lpn) tem uma visão menos optimista. De acordo com Rita Martins, bióloga sénior desta organização, “não há ainda boas alternativas à utilização deste pesticida para certos usos, incluindo o controlo de algumas espécies invasoras (acções muitas vezes integradas em projectos de conservação da natureza). Embora defendam a “eliminação progressiva da utilização dos pesticidas sintéticos”, a Lpn diz que “precisamos de ser realistas e aceitar que é necessário algum tempo para dominar as soluções técnicas que permitam um nível de produção em linha com as exigências globais”. Mas salienta: “não defendemos a interdição do seu uso a curto prazo, desde que cumpridas as normas legais e de segurança, considerando importante investir no desenvolvimento de alternativas”. No que se refere à redução do uso de pesticidas e à promoção de práticas agrícolas mais sustentáveis, Rita Martins dá conta da participação da Lpn no projecto “Boas práticas agrícolas para a biodiversidade no contexto das alterações climáticas”, uma iniciativa que tem como objetivo “promover a adopção de boas práticas agrícolas que incrementam a biodiversidade nas explorações agrícolas adaptadas às diferentes realidades agrícolas nacionais, como sendo um contributo importante para a adaptação e mitigação aos efeitos das alterações climáticas”.

Regulação do uso de glifosato em Portugal

Na mais recente lista de pesticidas a pesquisar em água de consumo humano, a Direção-Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV) afirma que “embora o herbicida glifosato não preencha a totalidade de critérios estabelecidos para a selecção de pesticidas a pesquisar em águas destinadas a consumo humano, nomeadamente no que diz respeito ao seu destino e comportamento no solo e ao seu potencial de mobilidade, recomenda-se a sua pesquisa, incluindo, também a pesquisa do seu metabolito AMPA, pelo menos uma vez por ano, em águas destinadas a consumo humano, com colheitas na água bruta provenientes de captações de água superficial, efectuadas no âmbito da monitorização operacional da entidade gestora”. O documento publicado em 2021 esclarece que “a este pesticida em particular não é aplicável a isenção de pesquisa face à sua utilização generalizada em áreas agrícolas, zonas urbanas, zonas de lazer e vias de comunicação”.

A Comissão Europeia sobre Plantas, Animais, Alimentos para Consumo Humano e Animal (SCOPAFF) aprovou o uso desta substância até 15 de Dezembro de 2023, embora a sua renovação esteja em processo de avaliação científica pela Agência Europeia de Segurança Alimentar (EFSA) e pela Agência Europeia dos Produtos Químicos (ECHA). Resta esperar.

NOTA – Por decisão pessoal, o autor do texto não escreve segundo o novo Acordo Ortográfico.

PSD quer equiparar drogas sintéticas às drogas clássicas

No projecto de lei submetido à aprovação da Assembleia da República, os sociais-democratas afirmam que é preciso actualizar a designação da entidade responsável por discernir entre consumo e tráfico. Em vez do Conselho Superior de Medicina Legal, um órgão consultivo extinto em 2000, o PSD propõe que o diploma que revê a legislação de combate às drogas substitua este organismo pelo Instituto Nacional de Medicina Legal e Ciências Forenses (INMLCF), a autoridade competente para tal.

Longe da vista, longe do coração

Segundo o documento, esta actualização do regime jurídico visa delinear “os limites quantitativos máximos para cada dose média individual diária das catorze substâncias de consumo mais frequente em 1996: heroína, metadona, morfina, ópio, cocaína, canábis (folhas e sumidades florias ou frutificadas, resina e óleo), fenciclidina, lisergida, MDMA, anfetamina e tetraidrocanabinol”. Para o INMLCF, a actualização deve ser feita com base em dados sobre a composição das drogas, como são consumidas e com que frequência, além de informações sobre os danos à saúde que elas podem causar. “Apenas desta forma a lista de substâncias reflectirá as tendências actuais baseadas nos diversos indicadores de consumos de drogas, orientando as entidades envolvidas para os procedimentos analíticos com carácter pericial, necessários à verificação dos limites quantitativos máximos previstos na tabela”, lê-se no parecer da INMLCF.

O diploma que o PSD pretende alterar já sofreu, até à presente data, trinta alterações “quer no seu articulado, quer nas respectivas tabelas, devido, essencialmente, ao constante aparecimento de novas substâncias e ao consequente cumprimento das obrigações decorrentes da assinatura da Convenção das Nações Unidas sobre o tráfico ilícito e consumo de estupefacientes e de substâncias psicotrópicas”. Ou seja, a legislação portuguesa não acompanhou os avanços científicos e continua a aplicar uma disposição jurídica desactualizada.

Cumpre destacar que desde Novembro de 2001, a posse e o consumo de drogas não são considerados crimes em Portugal. De acordo com o Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências (SICAD), “o consumo foi descriminalizado, mas não despenalizado”. Isso significa que o acto continua a ser um acto punível por lei, mas deixou de ser um “comportamento alvo de processo-crime”, tratado nos tribunais. “Esta mudança na legislação portuguesa, vulgarmente chamada lei da descriminalização do consumo, alterou a forma como se olha para um consumidor de drogas, deixando de lado o preconceito que o comparava a um criminoso, passando a considerá-lo como uma pessoa que necessita de ajuda e apoio especializado”, refere a SICAD. No entanto, o disposto não se aplica às drogas sintéticas, mais conhecidas como novas substâncias psicoactivas (NSP). “A portaria suprarreferida mantém-se inalterável desde a sua publicação, não se ajustando às novas realidades, o que cria inclusivamente uma desigualdade injustificada e discriminatória entre os consumidores das ditas drogas «clássicas» e os consumidores de drogas sintéticas, pois enquanto aqueles se encontram protegidos enquanto consumidores, estes não, precisamente porque no mapa dos quantitativos máximos para cada dose média individual diária não consta nenhuma das NSP, mas apenas substâncias que correspondem às ditas drogas “clássicas”, escreve o grupo parlamentar do PSD. A TejoMag contactou as organizações SICAD, CAT e CRESCER com o intuito de obter esclarecimentos adicionais, porém, não foi possível obter uma resposta.

Madeira é mais afectada

Em conversa com o jornal PÚBLICO, a deputada Sara Madruga da Costa, do PSD, eleita pela Madeira, diz que esta iniciativa serve “para proteger os consumidores e apertar a malha aos traficantes”. E é na Madeira que a situação é especialmente preocupante. Consoante o documento apresentado pelo PSD, “o consumo das NSP tem sido objecto de uma luta incessante por parte dos Governos Regionais da Madeira e dos Açores, tendo sido aprovada pela Região Autónoma da Madeira (RAM) em 2012 legislação do foro contraordenacional sobre as mesmas”.

Segundo a Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira (ALRAM), as NSP “são frequentemente referidas em Portugal como «drogas legais» “. Isto ocorre porque estas drogas não estão inscritas nas tabelas anexas à lei de combate ao tráfico de droga. Para todos os efeitos, não são consideradas substâncias proibidas. De uma forma geral, “possuem características comuns às drogas abrangidas pela lei vigente e são constituídas por compostos obtidos por síntese química ou por partes, ou extractos de plantas, ou de fungos, destinando-se a provocar uma resposta psicoactiva, estimulante, sedativa ou alucinogénica”.

De acordo com um decreto legislativo regional, o objectivo era implementar “um regime de ilícito de mera ordenação social para assegurar a protecção dos cidadãos” e para reduzir a oferta dessas “drogas legais”. “O regime ora criado representa uma medida de carácter administrativo, com o objectivo de proibir a disponibilização de novas drogas não integradas nas tabelas previstas no referido Decreto-lei n.º15/93 de 22 de Janeiro de 1993, mas que constam das listas de novas substâncias psicoactivas publicadas anualmente pelo Observatório Europeu da Droga e da Toxicodependência (OEDT)”, lê-se.

Este ano, a ALRAM apresentou à Assembleia da República uma proposta com o objectivo de “incutir uma maior celeridade na criminalização e inclusão de novas substâncias psicoactivas (NSP) na Lei do Combate à Droga (impondo um prazo de seis meses para a sua inclusão após identificação”. Tanto a iniciativa do PSD, como a da ALRAM foram admitidas pela Comissão dos Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias (CACDLG) em Fevereiro deste ano. Quanto ao projecto de lei do PSD, a CACDLG assegura que “a presente iniciativa legislativa cumpre os requisitos constitucionais, legais e regimentais para ser apreciada em plenário na Assembleia da República”. Apesar deste parecer, o Partido Socialista ainda não sabe se vai aprovar. Questionada pela TejoMag, a deputada Isabel Moreira, responsável por estas matérias, adiou uma posição oficial. A TejoMag contactou todos os grupos parlamentares, mas até à hora de fecho desta edição, não recebeu qualquer resposta. Ao que tudo indica, é expectável que o Partido Comunista Português (PCP) acompanhe a iniciativa. Em 2000, o Partido Comunista Português (PCP) foi mais longe e propôs “a exclusão absoluta de penas de prisão por consumo de drogas”. Segundo foi possível apurar, a proposta de lei foi recusada com os votos contra do PS (embora alguns deputados tenham votado favoravelmente), do PSD e do CDS.

Em Espanha, por exemplo, as tabelas anexas ao decreto real que regula e fiscaliza essas substâncias são actualizadas regularmente, incorporando aquelas sujeitas a medidas de controlo internacional. Trocado por miúdos, o nosso vizinho adoptou uma postura de controlo e regulamentação das drogas sintéticas, visando prevenir o tráfico e o consumo ilícito. O mesmo se passa na República da Irlanda, onde a lista das substâncias controladas está prevista no Misuse of Drugs Act de 1997. Com uma excepção: a revisão das substâncias a serem incluídas nessa lista é feita pelo governo, não havendo uma obrigação específica de revisão periódica. Em Itália e em França, essa tarefa está a cargo do Ministério da Saúde e tem o mesmo propósito. Em suma, estes quatro países assumiram a posição de controlar e regulamentar as drogas sintéticas, seja por meio da actualização de listas, classificação de substâncias ou acções de prevenção e intervenção.

“Apesar de todos estes esforços, esta luta está longe de chegar ao fim e envolve esforços a vários níveis, dada a percepção pública e os elementos que dão conta de um aumento da comercialização das referidas substâncias, e do consequente aumento do seu consumo e inerentes admissões hospitalares e internamentos psiquiátricos”, conclui o PSD.

NOTA – Por decisão pessoal, o autor do texto não escreve segundo o novo Acordo Ortográfico.

Portugal cai dois lugares no ranking de liberdade de imprensa. Extremismo mantêm-se uma ameaça

O mais recente levantamento dos Repórteres sem Fronteiras não traz boas notícias para Portugal. Apesar de se manter no Top 10 dos países com maior liberdade de imprensa, o país caiu duas posições na tabela e está agora em 9º lugar no ranking que avalia a
liberdade do jornalismo, num total de 180 países e territórios.

Segundo o relatório, apesar de já ter estado em 9º lugar em 2021, a liberdade de imprensa em Portugal é “satisfatória” (em 2022 era “muito boa”) e o país lidera agora o grupo de países com a mesma classificação. Os jornalistas continuam a usufruir de liberdade e proteção pela lei no exercício de funções mas os salários dos profissionais do setor continuam numa trajetória de desvalorização. Porém, à semelhança do último levantamento em 2022, o trabalho dos repórteres corre o risco de ameaça por grupos extremistas.

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Segundo o último relatório dos Repórteres sem Fronteiras, Portugal caiu duas posições no ranking mundial que avalia a qualidade do jornalismo.

“Em geral, o Governo e os partidos políticos respeitam o trabalho dos media. No entanto, enquanto cobriam as suas atividades durante as eleições presidenciais de janeiro de 2021, os jornalistas foram ameaçados e insultados por apoiantes do partido de extrema-direita Chega, bem como pelo seu diretor de campanha”, pode ler-se na ficha de Portugal, que conta ainda com referências a episódios ocorridos em 2021.

Além do cenário político, o ranking avalia outros indicadores como o contexto económico e sociocultural, o enquadramento legal e a segurança. São depois avaliados com recurso a variadas plataformas ou inquéritos até se chegar ao relatório com as conclusões e classificações finais.

Na 21ª edição do ranking mundial referente à Liberdade de Imprensa, a Noruega continua a ser o país com o jornalismo mais livre, a par dos demais escandinavos (Suécia caiu de 3º para 4º e a Dinamarca desceu de 2º para 3º lugar na tabela). A Irlanda registou um salto e ocupa agora o 2º lugar. Os Países Baixos subiram 22 posições e estão em 6º lugar.

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O site dos Repórteres sem Fronteiras disponibiliza um mapa interativo com informação específica sobre cada país.

Na Europa, alguns países registaram quedas significativas no ranking referente ao tema. Exemplo para a Alemanha (16º para 21º), Espanha (32º para 36º) e Reino Unido (24º para 26º). Todos receberam avaliação “satisfatória”. A Coreia do Norte continua a ocupar o último lugar da tabela e a China é agora o segundo país/território do mundo com menor liberdade de imprensa (ocupava o 175º lugar). Os Repórteres sem Fronteiras traçam um cenário “muito sério” em 31 países, “difícil” em outros 42 e “problemático” em 55 nações. Pelo contrário, 52 países ocupam agora uma posição “satisfatória”. Em resumo, apenas 3 em cada 10 países do mundo têm uma Liberdade de Imprensa considerada boa ou satisfatória.

Quanto à Ucrânia, subiu quase 30 posições e ocupa agora o 79º lugar, dentro do grupo de países com jornalismo satisfatório. A Rússia mantém-se no vermelho, na 164º posição do ranking mundial.

PSD e PAN defendem imóveis devolutos do Estado para habitação

PSD alerta que “é na propriedade pública, em primeiro lugar, que o direito à habitação, se deve realizar”. O PAN apela ao “dever de disponibilizar” património público.

Sónia Ramos, deputada do PSD, adianta ao TejoMag que “são os imóveis devolutos do Estado os primeiros que devem ser afetos e disponibilizados para habitação”, ao contrário da proposta do governo, que prevê o arrendamento pelo Estado de casas privadas devolutas.

Recorda a intenção do vice-presidente dos sociais-democratas, António Leitão Amaro, na apresentação do Pacote “Habitação” do PSD, de que “é na propriedade pública que em primeiro lugar a função social, e a realização do direito à habitação, se deve realizar”. Considera “imoral a tentativa de trocar as prioridades do Estado, atirando a batata quente, e castigar outros pelo trabalho que não faz”.

“Após quase 8 anos de governo socialista, o PS acorda para o problema da habitação, com um pesadelo.”

A deputada do PAN, Inês Sousa Real, aponta críticas relativamente a esta medida. “O que deveria estar a ser disponibilizado é o património público do Estado e não, como está o governo a fazer, o recurso à propriedade de privados”. O PAN já deu entrada de uma iniciativa que visa precisamente obter um levantamento do património público, “com vista a terem uma ideia exata da disponibilidade” de edificado apto para habitação.

No entender da deputada do Partido das Pessoas e Animais “não faz sentido que haja uma espécie de incentivo e corrida a nova construção, que pela artificialização do solo, tem elevados impactos ambientais, ao invés de estarmos a apostar numa política robusta de incentivo e apoio à reabilitação do edificado.”

António Costa adiantou novas medidas para a habitação, em conferência de imprensa a 30 de março em Setúbal, alegou que a suspensão das novas licenças de alojamento local só afeta as zonas com maior densidade populacional. As licenças atuais vigoram até 2030 e caberá aos municípios elaborar a sua “carta municipal da habitação”, onde deverá estabelecer qual o equilíbrio que pretende entre habitações, alojamento estudantil e alojamento local, entre outras atividades.

Suspensão de licenças de Alojamento Local

Sobre a suspensão das licenças do alojamento local Sónia Ramos diz que “traduz, antes de mais, uma quebra de confiança no mercado imobiliário e de arrendamento, um dos principais pilares da economia familiar em zonas turísticas que fica afetada pelo desastre que o pacote representa, ao nível do alojamento local”. O governo, diz a deputada, “esquece” que muitos pequenos investidores compraram casas, recuperaram, e nessa medida “são as cidades e a economia local que também beneficiaram”. Afirma que com o pacote apresentado, o governo “desfere um golpe mortal” nas diversas atividades que florescem com o turismo.

“O governo quis, propositadamente, onerar os municípios com o arrendamento coercivo, e sacudir a água do capote, coisa que, aliás, António Costa e o PS fazem muito bem.”

Uma proposta que foi sinalizada, não só por toda a oposição, mas pelo próprio Presidente da República, que chegou a referir que o “pacote é inoperacional” e, está “ferido de morte”, revelando que vai enviar o diploma para apreciação do Tribunal Constitucional, se se mantiver.

O grupo parlamentar do PSD, em 14 de fevereiro, antes do pacote do governo, apresentou um programa de habitação constituído por 10 iniciativas, discutidas no Parlamento num debate a 15 de março, que incluiu, “um subsídio amplo de apoio ao arrendamento, garantias do Estado para ajudar à compra pelos mais jovens e desagravamento fiscal generalizado” no setor.

O PS viabilizou, na generalidade, todos os diplomas do PSD sobre habitação, através da abstenção, permitindo que a discussão de todas as iniciativas prossiga na especialidade, em sede de comissão parlamentar. Para a deputada mantém-se a possibilidade de melhorar as propostas do governo.

Por outro lado, o PAN alinha com esta posição crítica e diz que “não faz sentido que o governo aplique esta medida sem olhar às diferentes especificidades do território”. “Uma coisa são as quotas de contenção para zonas de maior pressão, coisa diferente é o impacto desta medida no interior do país ou em regiões como o Algarve em que o AL tem importância até pela sazonalidade do turismo”.

Para além da possibilidade de aumentar o desemprego, parece, no entender do PAN, “ter de facto, numa primeira análise, ficado omissa ou pelo menos não ter resultado claro o que prevê” o governo numa tal circunstância.

“Em casos em que de alguma forma se colocou alterações de circunstâncias mais ou menos similares, o PAN tem defendido a necessidade de ficarem previstas medidas de apoio à reconversão da atividade de todos quantos possam vir a ser afetados pela medida.”

Quanto à descentralização para os municípios de competências da Administração Central deveria estar a ser operada de uma “forma mais pensada, estruturada e coerente”, adianta Inês Sousa Real. Em todo o caso, nesta matéria “há fatores que nos preocupam que se prendem com a sustentabilidade socioeconómica e até ambiental (nos casos em que se coloque o tema da carga turística) que assim passa a estar, ao que parece, sujeito à subjetividade de cada município”.

No que respeita ao licenciamento do AL, “a proximidade do poder local e a possibilidade de uma maior avaliação da pressão exercida em determinadas freguesias”, parece ser em teoria para o PAN um critério “mais razoável, devendo ser sujeito a uma maior participação quer das assembleias municipais, quer de freguesia no poder decisório, do que uma norma transversal aplicada por parte do governo, que não olha à realidade de cada região do país.”

Os executivos camarários de Lisboa e Porto, trabalhadores e empresários do setor do Alojamento Local manifestaram-se no dia 30 de março, em Lisboa e no Porto, contra as medidas da Habitação do governo. “Os Presidentes das Câmaras não foram ouvidos. Eu penso que isto seja grave. As medidas de habitação deveriam ter sido consensualizadas e trabalhadas com os Presidentes das Câmaras”, disse o autarca de Lisboa, Carlos Moedas. Segundo noticia o Expresso, a assembleia Municipal do Porto aprovou ontem, por maioria, a suspensão de novos registos de alojamento local na cidade, por mais seis meses, com críticas às medidas anunciadas pelo Governo para esta atividade e para a habitação.

“Radicalismo ideológico” nas críticas ao governo

O gabinete parlamentar do Livre diz não existir expropriação privada no caso das casas devolutas a serem postas no mercado de arrendamento. “Esse é um argumento ideológico que pretende acicatar guerras culturais. A tentativa de sacralizar um direito que nunca foi absoluto, ignorando que as medidas apresentadas nunca o põem sequer em causa, é pura demagogia”. A única intervenção do Estado neste pacote de medidas é no rendimento e, ainda assim, os direitos dos proprietários “estão mais que assegurados, já que não há uma perda real de rendimentos quando falamos destas medidas aplicadas a casas vazias”.

Consideram que outro argumento “mais ligado ao radicalismo ideológico que aos factos” é a suspensão de novas licenças que não é para todo o país, as licenças existentes vão manter-se no mínimo até 2030 e consequentemente, acreditam, os postos de trabalho “mantém-se também”. “Não existindo aumento de desemprego a avaliação que fazemos é que em Portugal existe o direito à habitação e que neste momento em algumas zonas do país, os nossos concidadãos que auferem salários médios não conseguem arrendar ou pagar prestações das suas casas, nos locais onde fazem as suas vidas. Isto é um problema real e temos de tomar medidas para o abordar e resolver.”

Defendem a ideia de que são os eleitos camarários que têm o conhecimento mais concreto e real para poderem decidir sobre que “progresso querem para as suas terras”.

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Carlos Moedas a entregar chaves de casas, com a vereadora da Habitação Filipa Roseta. / ANA SOFIA SERRA, CML

Reforço em programas de habitação pública municipal

No âmbito dos programas de apoio à habitação, a CML acaba de abrir o 18º concurso de renda acessível para 64 habitações nas Avenidas Novas, uma medida pensada também para a classe média, que tem de pagar rendas de casas elevadas para o seu orçamento e que precisa de apoios temporariamente.

Para fazer face às dificuldades habitacionais em Lisboa, a CML, entre outubro de 2021 e março de 2023, realizou um total de 1021 atribuições de habitação enquadradas nos programas de renda apoiada (dirigidos aos detentores de rendimentos inferiores ao salário mínimo nacional) e de renda acessível (dirigidos aos detentores de rendimentos superiores ao salário mínimo nacional), segundo dados do Gabinete de Comunicação da CML.

Em 2022 foi levada a cabo uma afetação de 200 habitações ao Programa de Arrendamento Apoiado para atender a graves carências socioeconómicas no município, com uma lista de espera de cerca de 6500 candidaturas. Estas 200 casas de tipologias variadas, nomeadamente T3 e T4, abrangem um conjunto diversificado de famílias com carências socioeconómicas e habitacionais que até agora não tinham conseguido aceder a uma habitação municipal.

Ainda no ano passado foi ainda lançado um programa de renda acessível específico para aqueles que não conseguem aceder aos programas municipais, com atribuição de 38 habitações.  Entre fevereiro e março de 2023 decorreu a segunda edição deste programa específico, tendo sido atribuídas 52 habitações.

Face aos elevados pedidos de habitação, a CML relançou o Subsídio Municipal ao Arrendamento Acessível, tendo atribuído 563 subsídios em 2022. De 29 de dezembro de 2022 a 28 de fevereiro de 2023, decorreu uma nova edição do programa, tendo sido submetidas 801 candidaturas que estão agora em fase de análise.

Desde o início do atual mandato autárquico, foram assinados com a GEBALIS dois Contratos Programa: um no valor de 2 milhões de euros e outro no valor de 40 milhões de euros para a intervenção em bairros municipais e reabilitação de frações, num total de 830, tendo sido já reabilitadas 477 que têm vindo a ser integradas nos programas habitacionais do município.

Foram ainda lançados três concursos para a conceção de 31 habitações municipais na Rua da Verónica (São Vicente), 105 habitações no Bairro do Armador (Marvila) e 40 habitações na Rua conde de Nova Goa (Campolide). Foi lançado e concluído o concurso de conceção de 18 habitações a construir em regime cooperativo na Rua António do Couto (Lumiar).

Em 2023 estão em construção fogos de realojamento no Bairro Padre Cruz (Carnide) e no Bairro da Boavista (Benfica).

Durante o mês de abril prevê-se que seja colocada a primeira pedra de construção de 152 habitações destinadas ao Programa de Renda Acessível na Rua Sanches Coelho, em Entrecampos.

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Carlos Moedas a entregar chaves de casas, com a vereadora da Habitação Filipa Roseta. / ANA SOFIA SERRA, CML

Moedas acelera em casas na autarquia

O presidente da Câmara Municipal de Lisboa anunciou um pacote de 85 milhões de euros para investir nos bairros municipais, um investimento que considera “único na história da cidade”, adianta a agência Lusa.

Carlos Moedas numa intervenção na conferência que assinalou os 30 anos do PER, iniciativa da Câmara de Lisboa, salientou que estas verbas contam com o apoio do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), numa iniciativa confirmada pela ministra da Habitação, Marina Gonçalves, e pelo Instituto da Habitação e Reabilitação Urbana (IHRU).

O autarca de Lisboa reforçou que a Câmara Municipal de Lisboa tem atualmente “1.000 habitações em construção”, além de outras 1.000 que foram construídas ou reabilitadas ao longo do último ano e que representaram um investimento de 40 milhões de euros na renovação dos bairros municipais.

“Estamos realmente a pôr o pé no acelerador”, disse, justificando o investimento anunciado com o “flagelo” de ver habitações vazias nos bairros municipais da cidade e a falta de construção na anterior década.

Comenta que houve “décadas em que não construímos habitação pública”, entre 2010 e 2020 houve pouca construção, apenas 17 habitações por ano.

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Manifestantes invocam direito à habitação nas ruas de Lisboa. / MARTA ALMEIDA

Direito a habitação leva milhares à rua

Milhares de manifestantes foram para a rua, a 1 de abril, em várias cidades do país para lutar contra as políticas de habitação que estão a afetar os jovens e famílias carenciadas. Uma iniciativa do Bloco de Esquerda que conta com a associação Habitat para mobilizar familias que vivem em condições de dificuldade económica.

Por todo o país milhares de pessoas responderam ao apelo das associações que subscrevem o manifesto que reivindica “uma casa digna para todas as pessoas”. “Queremos casas para viver” e “Casa é um direito” foram alguns dos slogans exibidos durante a tarde, com adesão de vários partidos na manifestação.

Depois de ter corrido pacificamente a Polícia de Segurança Pública interveio, em Lisboa, sobre manifestantes que protestavam contra a crise da habitação em confrontos por volta das 19h35 na Praça Martim Moniz.

As disputas começaram depois de agentes da PSP intercetarem duas jovens que estariam a causar danos em estabelecimentos comerciais, pintando as respetivas montras. Às 20h20 a situação já tinha acalmado, avança a RTP.

Sobre os distúrbios no final em Lisboa o Bloco não comenta, mas o Livre revelou ao TejoMag que “lamenta qualquer tipo de violência numa manifestação justa”. “Enquanto estivemos presentes a manifestação foi pacífica, não assistimos aos incidentes pelo que não os podemos comentar.”

Além da capital, alguns milhares de pessoas marcharam no Porto, Viseu, Aveiro, Coimbra e Braga para pedir o direito a viver “com dignidade”.

Medidas na lei laboral beneficiam parentalidade, mas ainda “aquém” das expectativas da oposição

Foram aprovadas medidas nas plataformas digitais com a inclusão do regime de plataforma electrónica (TVDE) na presunção de laboralidade, a clarificação dos direitos dos trabalhadores das plataformas e intervenção da Autoridade das Condições do Trabalho nos créditos laborais, acabou a possibilidade de o trabalhador abdicar de direitos no final do seu contrato, o que acontecia por pressão da entidade empregadora, e contemplado o direito a pagamento de despesas em teletrabalho, medidas por iniciativa do Bloco de Esquerda.

A agenda para o trabalho digno representa “uma importante alteração à lei laboral, uma legislação que marca a legislatura”, Mara Lagriminha deputada do PS, admite ter “havido um amplo processo de discussão e de diálogo”.

“Este foi sempre um processo aberto em que se procurou envolver todos os partidos, mas também os parceiros sociais”.

O mesmo não entende Lina Lopes, deputada dos democratas sociais,lamenta” que o Diploma sobre Trabalho Digno não tenha sido discutido em sede de Concertação Social, o que “contraria frontalmente tudo o que tem sido feito na área da Legislação Laboral”. Tal como aconteceu com o teletrabalho, o facto de a lei do Trabalho Digno contornar a Concertação Social e, ser aprovada com os votos de um único partido, o partido do Governo, gera “mau estar e desconfiança”. Chama este ato de “insensibilidade democrática e desrespeito pelas instituições”.

Toda a agenda do trabalho “foi ferida” pelo facto de não terem sido ouvidas todas as partes interessadas, admite Rita Matias, deputada do Chega.  “É fundamental ouvir os trabalhadores, mas também as entidades empregadoras, só assim se consegue chegar a propostas que efetivamente sirvam ambas as partes de forma equilibrada”.

Mara Lagriminha elenca o contrato individual de trabalho e o contrato coletivo de trabalho, que devem fixar na celebração do acordo para prestação de teletrabalho o valor da compensação devida ao trabalhador pelas despesas adicionais.Se não existir esse acordo entre as partes sobre um valor fixo, consideram-se despesas adicionais as correspondentes à aquisição de bens e ou serviços de que o trabalhador não dispunha antes, assim como as determinadas por comparação com as despesas homólogas do trabalhador no último mês de trabalho em regime presencial”. Esta compensação é considerada para efeitos fiscais, custo para o empregador e não rendimento do trabalhador, tornando-se numa garantia muito relevante para impedir que o trabalhador seja onerado por prestar trabalho neste regime.

O dirigente do PCP Alfredo Maia faz uma “avaliação negativa” deste processo. Considera que “a maioria PS apoiada pelo PSD” não quis revogar as normas gravosas do Código do Trabalho, como são os casos da caducidade dos contatos coletivos de trabalho e a chamada presunção da aceitação do despedimento, “mesmo que ilegal, mediante a aceitação do pagamento da indemnização, entre outras”. Por outro lado, justifica, o PS “rejeitou liminarmente as propostas do PCP” com vista à redução generalizada da jornada de trabalho para as 35 horas semanais e sete horas diárias, à restrição ao recurso ao trabalho por turnos e à laboração contínua. O PS “barrou a reposição das compensações pela prestação de trabalho suplementar ou pela cessação do contrato”, segundo o dirigente comunista. “Tão-pouco acompanhou” o PCP na proposta de reposição do princípio do tratamento mais favorável para o trabalhador.

Ainda assim foram dados passos dados “na direção certa, mas demasiado tímidos”, segundo o Livre. Conjugados com outros passos dados na direção errada, a Agenda do trabalho Digno ficou “aquém daquilo que podia ter sido”.

Inês Sousa Real, PAN, alinha com o Livre e diz que apesar de ter havido “alguns avanços importantes, ficou bastante aquém dos avanços que deviam ter sido operados”. A aprovação das faltas por luto gestacional foi, para a deputada do PAN, “um passo importante e uma vitória.”

Para o Bloco de Esquerda a opção do PS na discussão longa da chamada Agenda do Trabalho digno foi “de manutenção de muitas das normas gravosas que foram sendo implantadas ao Código do Trabalho, ao longo de vários anos”. O processo ficou “muito marcado pela resistência do Governo e do PS em mexer em aspectos fundamentais” como a conservação das regras sobre caducidade e sobre o princípio do tratamento mais favorável; a conservação da legislação existente sobre despedimentos coletivos e por extinção do posto de trabalho, que embarateceram os despedimentos e limitaram a capacidade de os trabalhadores os contestarem. A rejeição de medidas de proteção para trabalhadores por turnos; a rejeição da redução do período normal de trabalho para as 35 horas semanais.

Medidas parentais: aumento do direito ao teletrabalho a trabalhador com filho com deficiência, doença crónica ou doença oncológica

Independentemente da idade, que com ele viva em comunhão de mesa e habitação. Nestes casos, os pais têm direito a exercer a atividade em regime de teletrabalho, quando este seja compatível com a atividade desempenhada e o empregador disponha de recursos e meios para o efeito, uma alteração aprovada por unanimidade.

Isabel Pires, deputada do Bloco de Esquerda ao TejoMag, assume que esta medida não constava da proposta de lei inicialmente apresentada pelo PS. Aliás, “o PS foi o único partido a votar contra esta proposta apresentada pelo PSD e, na fase final do processo de especialidade, alterou o seu sentido de voto de contra para a favor.”

A lei do Teletrabalho diz que quem tem crianças até três anos pode ficar a trabalhar em casa. Este direito é extensível até aos oito anos da criança – exceto para funcionários de empresas até dez trabalhadores –, no caso das famílias monoparentais. Mas Lina Lopes recorda que o direito ao teletrabalho contempla mãe ou pai. A lei do teletrabalho aprovada em 2022 diz que qualquer trabalhador tem direito a realizar teletrabalho, caso exista acordo entre a entidade empregadora e o trabalhador.

Apesar do alargamento do direito ao teletrabalho a trabalhadores com filhos com deficiência, doença crónica ou oncológica, fica por implementar a medida para mães que estejam em casa a cuidar dos filhos em idade escolar.

As alterações aprovadas consagram, para os casos de progenitores com filhos com deficiência, doença crónica ou doença oncológica, um regime específico de teletrabalho que não pode ser confundido com a situação geral das crianças na fase da primeira infância.

Para estas, salvo os períodos respeitantes às licenças parentais, o PCP defende a “garantia efectiva dos direitos fundamentais das crianças e dos progenitores”. O PCP quer o direito à frequência gratuita de creches e jardins de infância; para o pai e mãe defende o direito ao trabalho, ao trabalho digno, com horários adequados à articulação entre o trabalho e a vida pessoal e familiar, condição essencial para o desenvolvimento harmonioso e saudável das crianças e das famílias, assim como à plena realização, nomeadamente das mulheres.

Ao criar um regime promotor do teletrabalho das “mães que estejam em casa a cuidar dos filhos na primeira infância”, significaria “perpetuar e mesmo agravar a discriminação da mulher, intensificando a sua exploração com o acumular injusto de tarefas que infelizmente ainda se têm como intrínsecas à condição de mãe, mãe-cuidadora, dona-de-casa e trabalhadora por conta de outrem”. Não é este modelo que defendem.

Inês Sousa Real entende que o teletrabalho “deveria ser uma opção”, e não apenas até aos 3 anos de idade.

O Livre diz mais: de acordo com a lei, o teletrabalho “não pode ser recusado” a quem tenha crianças com idade até aos 3 anos e no caso de uma família monoparental este direito é alargado até aos 8 anos da(s) criança(s).

Quando há duas figuras parentais e ambas com funções que possam ser desempenhadas à distância, o período em teletrabalho pode ser repartido.

Em matéria de teletrabalho e família, espera-se a isenção fiscal dos gastos com teletrabalho.

Sobre as despesas do teletrabalho o Governo ficou de emitir uma portaria onde define os montantes de isenção da tributação da compensação para os gastos em teletrabalho.

À partida estarão incluídas despesas com a com energia, água, telecomunicações ou aquisição de equipamentos, mas deve ser visto caso a caso, pois cada emprego tem as suas próprias especificidades. Rita Matias do Chega aguarda para “ver qual será a prática relativamente a esta matéria e o que decidirão os tribunais”.

Os Cuidadores Informais com direito a trabalhar em tempo parcial

As alterações propostas preveem que os Cuidadores Informais passem a ter uma licença de cinco dias e o direito a 15 dias de faltas justificadas.  Além disso, os cuidadores informais passam a ter direito a teletrabalho, horário flexível ou tempo parcial e passam a estar abrangidos pela proteção “contra o despedimento e discriminação de que tantas vezes são alvo pela sua circunstância”, esclarece a deputada socialista.

A maioria dos Cuidadores Informais são mulheres, maioritariamente familiares da pessoa de quem cuidam (nomeadamente esposas, filhas ou noras), com idades compreendidas entre os 45 e os 55 anos. Para idades superiores compreendidas entre 65 anos ou mais, as cuidadoras são as esposas ou companheiras, e todas elas residem com a pessoa de quem cuidam. Lina Lopes alerta para a situação de os cuidadores apresentarem baixas médicas para poderem cuidar, na maioria dos casos, afastando-se do seu trabalho”.

A deputada social-democrata acredita que ainda se poderia fazer mais “se fosse permitido ao cuidador trabalhar em teletrabalho”, caso fosse acordado entre a entidade empregadora e o trabalhador. Esta medida foi proposta pelo PSD e chumbada pela maioria. Uma medida ainda longe da realidade do mercado de trabalho.

Para o PCP este direito pode contribuir para “não penalizar tanto” os cuidadores informais, mas Alfredo Maia alerta para o “necessário desenvolvimento de ações de políticas públicas de informação dos cuidadores sobre estes direitos e, sobretudo, de promoção das garantias de que não serão prejudicados nos empregos se recorrerem a esta medida”.

O Estatuto do Cuidador Informal (Lei n.º 100/2019, de 6 de setembro), entrou em vigor no dia 6 de setembro de 2019 quando o Governo tinha 4 meses, o Bloco de Esquerda critica a demora “para identificar as medidas laborais necessárias à compatibilização entre a manutenção do emprego e a prestação de cuidados informais, desde a data passaram-se quase 4 anos”, lembra Isabel Pires do BE.

As alterações propostas ao Código do Trabalho nesta matéria “são relevantes”, mas a licença de 5 dias fica “muito aquém da expectativa criada” com o Estatuto dos Cuidadores Informais, bem como “não foram consagradas medidas que salvaguardam a carreira contributiva dos cuidadores informais”.

Estas medidas têm uma “condição prévia” para a sua aplicação que é “o reconhecimento do Estatuto do Cuidador Informal que continua a estar dependente de um conjunto de requisitos limitativos”, como é o caso do reconhecimento da dependência, que tem várias restrições injustificadas, ou do critério da morada fiscal e do laço biológico.

O Chega considera que o direito ao descanso também “tem de ser” assegurado.

Dos 8.122 cuidadores informais reconhecidos pelo Estado, até 31 de março do ano passado, de acordo com os dados do Governo, apenas 181 tiveram direito a descanso.

Mais de 150 medidas e alterações à lei do trabalho seguem para sede de especialidade.

Governo dá prioridade a irmãos na mesma creche, mas filhos de trabalhadores ficam de fora

Amanhã, dia 24 de março vai ser discutida no parlamento a proposta do PSD que contempla quer a questão de albergar irmãos na mesma instituição escolar e, por outro lado a prioridade dada aos filhos dos trabalhadores das IPSS.

Com a portaria da “Creche Feliz” não foi contemplada a priorização dos filhos dos trabalhadores na mesma instituição em relação às outras familias, ” o que gera uma discriminização de filhos dos trabalhadores na mesma instituição”, em modelo de creche, comenta Sofia Durão, representante do grupo de 235 pais da INFANCOOP, Instituição  Particular de Solidariedade Social das Caldas da Rainha. Nas valências que têm pré-escolar ou de ATl já vigora a prioridade dos trabalhadores dos regulamentos internos, uma vez que a portaria “Creche Feliz” não abrange estas respostas escolares, e o Estado só comparticipa parte do valor, sendo o resto pago pelos pais.

Os pais da IPSS aguardam esta iniciativa parlamentar do PSD para perceber se “existe margem de atendimento do governo” desta recomendação parlamentar.

No mês de março, no espaço de mês e meio, o grupo de que reivindicou estas medidas junto do gabinete da Ministra da Segurança Social, viu ser atendido um dos pedidos: a alteração do critério de prioridade dos irmãos na mesma creche. Uma medida que não tinha sido contemplada na portaria em setembro do ano passado.

Os pais da IPSS foram recebidos em audiência, em fevereiro, pela comissão do grupo parlamentar de trabalho de solidariedade social e inclusão, num tempo breve conseguiram a revisão da tutela na portaria das creches gratuitas, quanto à introdução do critério prioritário de irmãos na mesma instituição, mas ainda aguardam pela nova alteração relativamente aos trabalhadores das IPSS e “não desistem” de lutar até conseguirem ser ouvidos pelo Ministério da Segurança Social.

Sofia Durão,  adianta ao TejoMag terem reunido ainda, recentemente, com a assessoria da Presidência da Républica que “acolheu com sensibilidade” este problema social. À assessoria do P.R. falaram da necessidade dos trabalhadores das IPPSS fazerem parte do 1º critério da lista de prioridades, que “ainda tem celeumas”.  O formulário com toda a informação será enviado pela Presidência da República ao gabinete do Primeiro-Ministro, que dará uma resposta a esta matéria.

O grupo de pais também comunicou a situação à Confederação Nacional das IPSS, mas reconhecem “não existir facilidade de encontrar unanimidade” tal como aconteceu com a questão dos irmãos.

A medida “Creche Feliz” apresenta vários problemas que impedem centenas de crianças de serem elegíveis a uma creche gratuita possam usufruir desse direito.

Anunciada como medida de gratuitidade das creches foi alargada este ano às creches privadas aderentes à Bolsa de Creches Gratuitas, nas mesmas condições contratuais. No entanto, o Governo publicou num primeiro despacho (14837-E/2022) que determinava que as famílias só têm direito a uma vaga gratuita numa creche privada da Bolsa Aderente, se não houver uma única vaga nas creches da rede solidária do concelho inteiro onde residem ou onde exerçam a sua atividade laboral, independentemente da distância, mesmo que essa vaga represente ser a 10 ou mais kms de casa ou do trabalho,  o que não permite o acesso mais próximo a uma vaga gratuita numa creche privada, que tenha aderido à Bolsa de Creches Gratuitas.

Por outro lado, a prioridade dos irmãos ainda não estava assegurada em todas as vertentes em que se revelava necessária.

“Um problema que não tinha sentido nenhum”, segundo o grupo de pais da INFANCOOP, em janeiro enviaram uma carta à Ministra da tutela, Ana Mendes Godinho, a denunciar a situação, alegando que a portaria publicada em setembro vai contra a conciliação da vida familiar e trabalho “contra tudo aquilo que é advogado pela tutela da segurança social” e “proteção da família para fortalecer a natalidade”.

A representante dos pais que reivindicam correções no despacho governamental diz que o grupo tinha “a convicção que os critérios seriam alterados, o problema era o timing”, comenta. As inscrições nas creches são feitas a partir de maio, e é necessário resolver esta questão de “pormenor”, como disse a Ministra em março no parlamento.

A petição on-line vai em mais de 1830 assinaturas e vai continuar até à discussão da resolução no parlamento, no dia 24 de março, porque um ponto foi resolvido, mas a parte dos trabalhadores ficou por resolver.